- Valor Econômico
Chefe de gabinete do general Braga Netto, interventor na segurança do Rio, o general Mauro Sinott, fez, na manhã de ontem, uma visita ao 14º Batalhão da Polícia Militar em Bangu, zona norte do Rio, responsável pela região da Vila Kennedy, comunidade da zona norte do Rio escolhida como área modelo da intervenção. Quando o comandante do BPM, coronel Marcus Vinícius Amaral, deu ordem para a tropa, já perfilada, bater continência ao general, segundo na hierarquia militar da operação, uma parte dos policiais não obedeceu. O comandante só foi acatado depois de gritar "todo mundo" e, em seguida, "descansar".
Menos de 12 horas depois da insubordinação policial, relatada pelos repórteres Carina Bacelar, Luã Marinatto e Renan Rodrigues, em "O Globo", a vereadora Marielle Franco (Psol), seria executada ao deixar evento no centro do Rio em que discutira o aumento da violência contra mulheres negras. Um dia antes, fizera protesto, em rede social, contra a atuação de outro BPM, o de Acari, subúrbio da zona norte do Rio, recordista em letalidade no Estado, com 450 mortes nos últimos cinco anos. Os assassinos de Marielle e do motorista Anderson Pedro Gomes não se preocuparam em disfarçar o crime como latrocínio. Agiram explicitamente como quem quer mandar um recado. E não apenas para os defensores de direitos humanos, mas para o comando militar da intervenção.
Depois de fracassar no intuito de obter um mandado coletivo de busca e apreensão que causou grande apreensão nas comunidades, o general Braga Netto passou a se equilibrar entre ações armadas de repressão ao tráfico, desbloqueio de comunidades tomadas pelo crime e o combate à corrupção policial. Buscou sintonia com o juiz Marcelo Bretas. A aproximação exagerou na disposição de fisgar os recursos da Lava-Jato para a operação, mas avançou com a prisão do diretor-geral de polícia especializada do Rio e o ex-secretário de administração penitenciária, acusados pelo desvio de R$ 73 milhões num esquema de superfaturamento de pão para presos.
O comando do general enfrenta, no entanto, forte reação. Policiais têm-se rebelado contra ações que minam sua sociedade com o crime, a começar de medidas simples e baratas como a disposição do comando militar da intervenção de mexer na sua escala de trabalho para aumentar o efetivo à disposição das operações. Parte da tropa trabalha 24 horas e folga nas 72 horas seguintes, período em que fica sujeita ao aliciamento pelo tráfico e pela milícia.
A morte de Marielle e Anderson obriga o general Braga Netto a ir além. Da mesma maneira que o desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, na Rocinha, em 2013, por policiais militares, na Rocinha, foi o começo do fim das Unidades de Polícia Pacificadora, as UPPs, a morte de Marielle desafia a intervenção. A ausência de uma apuração rigorosa do crime e dos acontecimentos em Acari denunciados pela vereadora do Psol, evidenciará que o conluio histórico entre policiais e crime organizado continua a dar as cartas, resiste ao fim da impunidade e ameaça desmoralizar a mais ambiciosa operação doméstica das Forças Armadas.
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