- O Estado de S. Paulo
O presidente Michel Temer carregou na mala para Nova York duas palavrinhas mágicas para o seu discurso de hoje na abertura da Assembleia-Geral da ONU, na sua agenda bilateral com presidentes e primeiros-ministros e nos seus encontros com, principalmente, setores privados. São elas: normalidade e segurança. Pena que Temer não se encontrará com Barack Obama.
Com a versão do “golpe” desmilinguindo-se – foram vinte os gatos pingados gritando palavras de ordem na chegada de Temer à cidade –, não seria ele que a resgataria e poria em pauta na sua segunda e mais importante viagem internacional. A ordem é deixar “golpe” para lá, sair da defesa e partir, não para o ataque, mas para o convencimento de que o Brasil está no rumo certo.
Temer pretende dizer ao mundo que o País está voltando à maior normalidade, com as instituições funcionando, a relação do governo com o Congresso fluindo e uma grande expectativa nacional de que o pior já passou e todos os esforços são para voltar a crescer, criando condições para a indústria, os empregos, a inclusão.
Pretende dizer também, particularmente aos investidores, que a normalidade institucional vem junto com a restauração da segurança jurídica, do pragmatismo econômico, da abertura aos investimentos. Acabou a era do Estado inchado, do preconceito contra o capital e das canetadas como a que botou o setor elétrico de pernas para o ar. Como acabou a era das alianças internacionais erradas e começa uma outra em que estão na mesa os interesses nacionais – de um lado (o brasileiro) e do outro (o interlocutor).
O discurso de Temer, que fala em tese, foi precedido e está sendo detalhado por compromissos práticos assumidos pelos seis ministros que integram sua comitiva. José Serra, por exemplo, abriu os trabalhos reunindo-se com os chanceleres dos parceiros originais do Mercosul: Argentina, Paraguai e Uruguai. Sem a Venezuela e seu viés, digamos, heterodoxo, o grupo acertou e divulgou que é hora – aliás, já passou da hora – de fechar o acordo com a União Europeia.
Moreira Franco, da infraestrutura, levou o cardápio de obras, concessões e licitações. Fernando Bezerra Filho, as oportunidades no setor de minas e energia. Zequinha Sarney, o discurso de que o Brasil está calibrando bem a proteção ao meio ambiente e a garantia de desenvolvimento. Alexandre de Moraes, da Justiça, respaldou o discurso de ontem sobre refugiados, e Henrique Meirelles, da Fazenda, é o grande troféu do binômio “normalidade e segurança”.
Em comum, todos fazem duas sinalizações para investidores. Uma é que o novo governo tem força para aprovar no Congresso pelo menos três mudanças essenciais para desobstruir o desenvolvimento: o teto de gastos (ajuste fiscal), a reforma da Previdência (sustentabilidade do sistema) e a flexibilização das leis trabalhistas (combate ao desemprego). O outro compromisso, que pode ser explícito ou velado, é de que o governo não tentará, de nenhuma forma, obstruir a Lava Jato.
A ida de Temer à China foi um treino, aproveitando o G-20 e para trazer uma foto com os maiores líderes do planeta.
Esta segunda viagem, ao ainda “centro do mundo”, já é para valer. Temer discursou na reunião sobre refugiados – um dos maiores problemas deste século, que também aumenta no Brasil –, e vai à ONU não apenas falar “para fora” (a presidentes e primeiros-ministros), mas também “para dentro” (a sociedade brasileira). Na verdade, os presidentes brasileiros abrem a assembleia-geral por tradição, mas a repercussão dos seus discursos acaba sendo muito maior no Brasil do que nos outros governos e na imprensa internacional. Temer sabe. Assim como sabe que a demanda por “normalidade” e “segurança” em contratos e investimentos é tão grande cá como lá.
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