terça-feira, 20 de setembro de 2016

Prática gera interpretações divergentes entre juristas

• Se for classificado como crime, caixa dois só puniria adeptos em casos futuros

Leonardo Cazes - O Globo

O chamado caixa dois — recursos não declarados nas campanhas políticas — não é um crime específico previsto na legislação, mas uma infração eleitoral, afirmam juristas ouvidos pelo GLOBO. Contudo, a prática pode terminar em condenação em ações penais por corrupção, como ocorreu no caso do mensalão. Daniel Falcão, professor da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), explica que, pela Lei Eleitoral, o caixa dois pode gerar punições como a perda do mandato ou a inelegibilidade. Essa situação mudaria caso o projeto de lei que criminaliza a prática fosse aprovado no Congresso.


— Com a criminalização do caixa dois, quem incorrer em prática deste tipo poderá sofrer ação penal, com sanções do tipo reclusão. Hoje, caixa dois é uma irregularidade, mas que não pode terminar em prisão. Só há punições na seara eleitoral, do candidato ou do tesoureiro — diz Falcão.

Professora da FGV Direito Rio, Silvana Batini afirma que atualmente o caixa dois pode ser enquadrado como crime de falsidade ideológica, no artigo 350 do Código Eleitoral: “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. A pena prevista é de até cinco anos de prisão. Contudo, juízes têm diferentes interpretações sobre a questão.

— O caixa dois está inserido numa norma genérica. E não temos um histórico de punição desse crime. Sempre houve essa discussão da necessidade de tipificar o caixa dois, porque mesmo o crime de falsidade ideológica só pega quem assina a prestação de contas. É muito difícil alcançar o doador que contribui de forma obscura e clandestina para a campanha. A tipificação traria mais clareza — afirma Silvana.

Caso pode chegar ao STF
De qualquer forma, mesmo que o caixa dois seja criminalizado, a nova lei só valeria para crimes cometidos após a aprovação da lei. Candidatos adeptos da prática nestas eleições, por exemplo, seriam julgados pela legislação em vigor atualmente, explica Vânia Aieta, professora de Direito Eleitoral da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

— A punição retroativa é impossível. Quem fez caixa dois antes da nova legislação ser aprovada será julgado pela legislação atual, que concede a punição — diz Vânia, que discorda que haja impunidade. — É uma falsa impressão achar que no universo eleitoral o caixa dois não é passível de punição. Há uma série de reprimendas específicas para a infração.

Falcão afirma que, o que pode ocorrer, é o Congresso aproveitar a discussão sobre a criminalização do caixa dois e aprovar uma anistia para irregularidades cometidas anteriormente.

— É possível anistiar quem cometeu caixa dois no passado. Isso já aconteceu com as multas eleitorais, que já foram anistiadas por projeto de lei. Se isso for aprovado, o Supremo Tribunal Federal pode ser chamado a se manifestar.

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