• Levantamento do Tesouro constata que o desequilíbrio financeiro nos estados é maior que o real, porque estava maquiado por técnicas da contabilidade criativa
Não é desconhecido que o desprezo militante pela responsabilidade fiscal, iniciado no segundo mandato de Lula e consolidado nos governos da presidente Dilma, intoxicou também estados e municípios. Seria mesmo inevitável que isso ocorresse, mas ainda não havia informações precisas da dimensão do descontrole financeiro em toda a Federação.
Os déficits no governo central — Tesouro, Previdência e Banco Central — são mais expostos, bem como foram logo identificados por analistas independentes os artifícios usados, com o aval da presidente Dilma, pelo secretário do Tesouro Arno Augustin e o ministro da Fazenda Guido Mantega, para mascarar os rombos com técnicas da contabilidade criativa. E a prática da maquiagem contábil também se espalhou pela Federação.
Foi preciso que a presidente Dilma sofresse impeachment — por crimes fiscais, nada surpreendente —, para mudar o governo e o Tesouro poder fazer um levantamento do descontrole fiscal em todos os entes federativos, trabalho divulgado na quinta-feira.
O desastre é mesmo de grandes proporções. Com a maquiagem estatística, gastos com pessoal — aposentados, pensionistas e terceirizados — foram subtraídos desta conta de despesas em vários estados, e isso permitiu que muitos deles se enquadrassem apenas formalmente dentro da margem permitida pela Lei de Responsabilidade Fiscal (até 60% da receita corrente líquida) para esse tipo de gastos.
Mas a realidade é bem outra. Oito unidades da Federação aparecem com esta conta acima dos 60% da receita — DF, Goiás, Minas, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Com a aplicação da contabilidade criativa, apenas dois ultrapassavam o limite.
Manipulado, o índice do Rio de Janeiro é de 41,7%, quando, pelo conceito correto, está em 62,8%. Outro exemplo: no Rio Grande do Sul, os 58,1% da participação dos gastos com pessoal sobre a receita líquida corrente saltam para 70,62%.
É frágil o argumento de que tribunais de contas de estados sancionam esta prática. Pode ser, mas não atende a uma interpretação séria da LRF. Lei burlada de forma consciente no governo Dilma, prática que, como se observa, contaminou a Federação. Por sinal, o Tesouro, no tempo de Arno Augustin, deu aval a que estados se endividassem sem condições técnicas para isso.
Um dos autores da lei de responsabilidade, o economista José Roberto Afonso, constata que a contabilidade pública “virou uma bagunça”. Faz sentido, porque, se na visão “desenvolvimentista” de Dilma e companhia é um erro o controle rígido de gastos, não se deve também ter cuidado com a fidedignidade dos dados, para efeito de gestão fiscal. Há, então, outra frente de trabalho, além do ajuste fiscal em si: reconstituir o sistema de acompanhamento fiscal, e não apenas da União.
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