Por Raphael Di Cunto – Valor Econômico
BRASÍLIA - A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (15) parecer do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) pela admissibilidade da proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência. O texto teve o apoio de 31 deputados e 20 votos pela rejeição. Seis deputados de partidos da base votaram contra.
A proposta seguirá agora para uma comissão especial, que analisará o conteúdo e poderá fazer emendas para mudar o projeto, prioridade máxima do governo Michel Temer. Por acordo com parte da base e da oposição, contudo, o governo desistiu de instalar a comissão este ano e deixará esta etapa para fevereiro, depois da eleição da presidência da Câmara.
Com dificuldade de obter quórum devido ao horário, o governo atuou para convocar deputados da base a aparecerem para votar e substituir aqueles que não estavam presentes.
Essa manobra causou polêmica e foi contestada pelo líder do Rede, deputado Alessandro Molon (RJ). “Gostaríamos de ver os ofícios de substituição porque a Secretaria Geral da Mesa está fechada”, afirmou. “Esse tipo de expediente é irregular. Essa votação será nula porque será feita por membros substituídos irregularmente”, acusou.
O deputado Arthur Lira (PP-AL) contestou, dizendo que a indicação dos integrantes da comissão é prerrogativa dos líderes, que podem trocar os representantes do partido a qualquer tempo. “Não posso dizer que é correto, não posso dizer que é o normal, mas também não posso dizer que é normal falta de quebra de acordo político”, afirmou.
Nas contas do governo, caso a oposição votasse, seria atingido o quórum mínimo de 34 deputados, mas com maioria favorável ao parecer. Mas os oposicionistas disseram que o acordo era apenas não obstruir, sem necessidade de registrarem seus votos – o que não daria o número de deputados exigido para proclamar o resultado da votação.
Presidente da CCJ, Osmar Serraglio (PMDB-PR) disse que as trocas ocorreram no sistema da Câmara. “Recebemos de forma regular. Se alguma irregularidade possa acontecer, isso deve ser resolvido na SGM”, afirmou. Quatro integrantes entraram na comissão: Nelson Marquezelli (PTB-SP), Alexandre Baldy (PTN-GO), Paulo Azi (DEM-BA) e Márcio Marinho (PRB-BA).
Em protesto contra as mudanças nos integrantes, o deputado Pastor Eurico (PHS-PE) acusou o governo de manobrar e disse que o PHS passaria a votar contra a admissibilidade. Também orientaram pela rejeição PT, PDT, PcdoB, PHS, Psol, Rede e o PTB – este último, contudo, votou desunido.
Baldy assinou a própria nomeação, já após a meia-noite, embora seja vice-líder do PTN – as trocas só podem ocorrer por indicação dos líderes. A oposição vai contestar a votação, mas, de olho nessa possibilidade, o governo orientou o deputado do PTN a não registrar seu voto.
Os debates tomaram nove horas. Começaram às 15h, com a oposição e parte da base – PSB e SD – fazendo obstrução com requerimentos para tentar evitar que o parecer fosse votado ainda na quarta-feira. O governo, então, cedeu ao acordo para que a comissão especial só fosse instalada em fevereiro, com a promessa de que os partidos marcariam suas posições, mas sem atrapalhar a votação.
Às 20h, contudo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), decidiu iniciar o plenário para votar um conjunto de projetos. Mas Maia deixou a Casa para uma reunião externa e, após aprovação de uma medida provisória (MP) para acabar com os mandatos da diretoria-executiva da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), não houve acordo para continuidade dos trabalhos e a sessão foi encerrada.
A CCJ voltou por volta das 23h, mas não sem críticas dos deputados. “Se paralisou a CCJ, que fazia uma discussão importantíssima, para votar uma medida inócua. Absolutamente irrelevante, apenas para que a PEC seja votada de madrugada”, protestou o deputado Esperidião Amin (PP-SC). “Não vou votar nada depois da meia noite”, afirmou.
Líder do governo, André Moura (PSC-SE) disse que o placar apertado, de menos da metade da comissão, ocorreu porque muitos da base estavam fora da Câmara, em confraternizações de fim de ano ou por já terem voltado aos Estados. “O importante é que aprovamos na CCJ em duas sessões. A última reforma ficou na comissão por mais de um ano”, ressaltou.
Discussão
Embora a análise da CCJ fosse apenas se a PEC não atenta contra preceitos fundamentais da Constituição, sem uma avaliação do conteúdo do projeto, parlamentares da própria base criticaram o texto, dando mostras da dificuldade que será avançar a tramitação. Sete deputados da base apresentaram votos em separado, defendendo a rejeição da proposta totalmente ou em parte.
O deputado Marcos Rogério (DEM-RO) argumentou que a PEC é inconstitucional por, na avaliação dele, violar princípios como a proteção da família e o direito adquirido, além de não garantir o tratamento isonômico de carreiras parecidas, como as da segurança pública, e promover retrocessos em conquistas sociais estabelecidas com a Constituição de 1988.
“Essa proposta não foi elaborada por um constitucionalista. Quando muito, por economista. Doutor Michel Temer, o professor de direito constitucional que conheci pelos livros da universidade, certamente não leu, não participou da elaboração desta proposta. Caso contrário, estaria negando a lógica de seus próprios ensinamentos de Direito Constitucional”, afirmou.
O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) disse que não leu os livros do presidente Michel Temer, mas que conviveu com ele por anos na Câmara e lembrou que o pemedebista conquistou destaque após virar relator da reforma da Previdência no governo FHC. “Até então, Michel não existia. Ele passa a existir na reforma da Previdência, em que ajudou a suprimir direitos dos trabalhadores”, afirmou.
Cotado para relatar a PEC na comissão especial, Arthur Maia (PPS-BA) defendeu que a Câmara analise, junto com as propostas do governo, ampliar a base de cobrança da Previdência. Ele citou como isenções a serem analisadas as desonerações promovidas no governo Dilma, Super Simples e de entidades filantrópicas como universidades que cobram mensalidades tão altas como as instituições privadas.
Maia criticou, principalmente, a isenção a clubes de futebol. “Estive no Ministério da Fazenda e recebi a incrível informação que nenhum dos clubes de futebol do Brasil pagam a Previdência Social. Recolhem os 8% do trabalhador, mas são isentos de recolher seus 20%”, disse. “É muito difícil exigir o sacrifício do trabalhador, fazer regras que endurecem a Previdência, e não fazer essa discussão”, ponderou.
No parecer, Moreira afirmou que há incongruências no texto da PEC, como data que as mudanças entrarão em vigor, que podem “prejudicar seriamente a compreensão” do projeto. Disse, porém, que esses erros poderão ser corrigidos pela comissão especial e que a proposta preserva os direitos adquiridos, estando, portanto, dentro dos critérios de admissibilidade.
Líder do PSD, Rogério Rosso (DF) destacou que o partido votaria favorável à admissibilidade da PEC, mas que defenderá “profundas mudanças” no projeto durante a discussão na comissão especial.
Comissão especial
O deputado Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade e da Força Sindical, disse que o adiamento na instalação da comissão especial permitirá que os partidos leiam com mais atenção a PEC e preparem as emendas. Se ocorresse agora, o prazo de emendas acabaria no meio da próxima semana, quando o Congresso já estará esvaziado pelo recesso e seria mais difícil coletar os apoios para emendas.
O centrão, grupo de Paulinho formado por PP, PR, PSD, PTB, PRB, SD e PSC, pressionava para que a instalação ocorresse só em fevereiro. Isso possibilitará que o novo presidente da Câmara negocie mudanças na presidência e relatoria da comissão — o atua, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que quer disputar a reeleição, indicou Sérgio Zveiter (PMDB-RJ para a presidência e Arthur Maia para a relatoria.
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