- Valor Econômico
Aliados do PSL radicalizam por vitória no 1º turno
No canto superior esquerdo da convocatória da mobilização da categoria para segunda-feira, lê-se "O senhor abençoa os caminhoneiros". O último parágrafo do texto trata das consequências do movimento e anuncia os riscos de não se adotarem as providências necessárias "afim [sic] de evitar esse caos que ronda nossa pátria".
As digitais do bolsonarismo estão todas lá. Permaneceram intactas porque os empresários que as fomentaram na paralisação de maio não foram punidos e o governo abriu os cofres para os oportunistas de plantão. Atenderam-se a interesses localizados e mantiveram-se latentes as insatisfações generalizadas associadas à única categoria que, de fato, demonstrou ter poder de parar o país.
A convocatória não reverberou, mas seu aparecimento, concomitante ao início do horário eleitoral gratuito, é revelador do movimento que se insurge para tomar o lugar do lulismo como o eixo desta disputa.
Só o caos favoreceria a eleição de um candidato que sobrepõe a força à razão. Na tarde de domingo, um motociclista que esperava na fila sua vez de ser abastecido, na Região Metropolitana do Recife, tirou, aos berros, um adesivo de Jair Bolsonaro para colar no bagageiro.
Em seu reinado nas redes sociais, o capitão respondeu com irreverente desacato à serenidade com o qual o latifundiário do horário eleitoral, Geraldo Alckmin, abriu seu programa. "É mimimi, vamos mudar esse país, pô, não tem que ficar educadinho, cheio de dedos, dizendo que vai buscar a governabilidade, tô colocando o meu na reta por vocês ou vocês acham que não estou ameaçado o tempo todo?", reagiu um zombeteiro Jair Bolsonaro num video caseiro ao lado da mulher.
Apresentar-se como o contraponto ao pavio curto de Bolsonaro foi o que restou ao ex-governador paulista depois que seu partido foi solapado pela Lava-Jato e pelas políticas de aferição de resultados, criadas pelo próprio PSDB.
Incapaz de responder por que o Estado comandado por seu partido há 24 anos, anda para trás na educação, culpou a metodologia do ministério comandado pelo DEM, um de seus principais aliados. O enrosco dá fôlego ao discurso de Bolsonaro sobre a governabilidade paralisante de seu maior adversário.
Na blindagem de seu eleitorado, o candidato do PSL escuda-se ainda contra Ciro Gomes e Marina Silva que partiram para cima aumentando ainda mais os decibéis da disputa. O primeiro veio com o volume habitual e a ex-sonhática candidata do Rede estreou na TV irreconhecível na ofensividade: "Alguma vez já lhe disseram que você era fraca?"
Bolsonaro reage com o mesmo apelo daquele que pontificou, até aqui, no outro polo. O bombardeio da propaganda eleitoral levou-o para o cordão dos perseguidos liderado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A reação vitimizada do capitão consolida a resiliência de seu eleitorado.
Já a reação dos comandados do ex-presidente, inacreditavelmente surpreendidos pela decisão do TSE, abre o flanco para que os adversários vejam no passaporte do PT aquele a ser roubado para a chegada ao segundo turno.
Ocupados em salvar a bancada, aferrados que estão à onipresença de Lula, os petistas estreitam o tempo de compatibilização entre um discurso voltado para as classes C e D e a figura de um rapaz com pinta de rico de quem mal sabem o nome.
Numa disputa em que a dupla de finalistas, a um mês da eleição, ainda está indefinida, a única certeza parece ser a de que a decisão do voto se dará sob um clima de radicalização. Nesse caldeirão, não é apenas o bolsonarismo de raiz que ferve.
Um grupo de generais quatro estrelas reunidos na tarde da terça-feira em Porto Alegre revelaram temores de que Bolsonaro não ganhe no primeiro turno, pela certeza de que perderá se disputa for para o todos contra um.
A resistência, na cúpula do Exército, ao seu nome hoje é residual. Restringe-se a nomes como o do comandante Eduardo Villas Bôas, que enfrenta uma doença terminal, e o general Sérgio Etchegoyen, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, em baixa na força pelas operações do Rio e de Roraima, cujo fracasso lhe é creditado.
Nem o liberalismo exacerbado da assessoria econômica do candidato do PSL os assusta. A soberania hoje é uma carabina enferrujada. Mais importam a violência, a corrupção e o protagonismo que vislumbram ter em seu eventual governo. Temem ir para o limbo com um revés de Bolsonaro, mas fazem planos como o do general Heleno Pereira, ex-comandante da operação brasileira no Haiti, para a Defesa.
Têm ciência de quem é o capitão, mas se julgam mais capazes de controlar os riscos que carrega do que a desmoralização que representaria sua derrota para as Forças Armadas, exacerbada ainda pela chapa puro sangue completada pelo general Hamilton Mourão de vice.
Ao longo dos mais de quatro anos da operação, as sucessivas condecorações dos magistrados da Lava-Jato pelas Forças Armadas sugeriram uma identidade de propósitos. A campanha eleitoral explicitou-a.
Bolsonaro fez do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), principal paladino das 10 medidas contra a corrupção, o principal articulador político de sua candidatura. Não foi apenas pela dileta amizade com o general Mourão que Carlos Eduardo Thompson Flores, o desembargador da 4ª região que aplaudiu decisões contra Lula antes que chegassem à sua instância, foi condecorado sucessivas vezes pelo Exército.
O Ministério Público paulista resolveu desovar nesta reta final da campanha ação de improbidade contra Alckmin e o Tribunal de Justiça de São Paulo tornou Fernando Haddad réu pelo mesmo crime. Contraponto à fábrica de habeas corpus do ministro Gilmar Mendes, as decisões são uma demonstração de que as afinidades entre o Paraná, quinta comarca de São Paulo até o fim do século passado, e sua antiga província ainda persistem.
Pela coincidência de propósitos, os aliados dão, ainda, inestimável colaboração para um clima favorável a Bolsonaro. O candidato do PSL não dispõe de tempo da propaganda oficial ou fundo eleitoral mas parte para a reta final da disputa devidamente munido de uma coligação com a farda e a toga.
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