Com pouco dinheiro, muita despesa e um déficit previsto de R$ 139 bilhões nas contas primárias (sem juros), o governo ainda vai renunciar a R$ 306,40 bilhões de tributos, no próximo ano, para sustentar benefícios fiscais. Esses benefícios irão em grande parte para os cofres e bolsos de quem menos precisa de favores oficiais. Pouco ou nenhum benefício resultará para o crescimento econômico, a modernização do País e a criação de empregos. Esse desperdício tem ocorrido há muito tempo, é um fato rotineiro da administração pública brasileira e seu custo vem aumentando ano a ano. Em 2019 a renúncia fiscal deverá consumir R$ 23 bilhões a mais que a soma estimada para 2018, como mostrou reportagem do Estado. A sangria total corresponderá a 4,12% do Produto Interno Bruto (PIB) e a 21,05% da arrecadação administrada pela Receita Federal. Tradicionalmente, leva mais quem tem mais poder para extorquir recursos do setor público.
No jargão profissional, gasto tributário é o nome dos benefícios fiscais concedidos a indivíduos, empresas e outras organizações para atender a objetivos econômicos e sociais considerados, em princípio, de alta relevância. Mas essa é apenas uma definição ideal.
Na prática, a renúncia pode favorecer o hospital beneficente, a instituição realmente séria de pesquisa e ensino e também o devedor caloteiro de um banco público, assim como o empresário pouco disposto a enfrentar os desafios do mercado. Seria enorme a lista dos parasitas do dinheiro público. Nesse jogo, investir para inovar e competir deixa de ser responsabilidade típica da empresa em busca de lucro e torna-se encargo partilhado por um governo bonzinho. Apoiar programas e projetos de modernização pode ser, sim, parte da política pública, mas só quando há evidente valor estratégico nessa orientação. Não tem sido esse o caso.
A maior fatia dos gastos tributários, de 28%, corresponderá, em 2019, aos benefícios concedidos por meio do Simples Nacional. Isso consumirá, segundo estimativa da Receita, R$ 87,25 bilhões. Isenções e deduções de rendimentos de pessoas físicas corresponderão a 10% da renúncia total, parcela igual à das vantagens concedidas a empresas da Zona Franca de Manaus.
As isenções e deduções de rendimentos incluirão benefícios como auxílio-moradia e auxílio-alimentação pagos a funcionários públicos e vantagens concedidas a receptores de lucros e dividendos. Entidades sem fins lucrativos ficarão com 8%, assim como a agricultura. Fatias menores comporão o resto dos benefícios.
Um raro corte na renúncia fiscal será proporcionado pela redução dos setores favorecidos, desde a gestão petista, com a desoneração da folha de pagamentos. A diminuição dos setores foi menor que a proposta inicialmente pelo Executivo, porque congressistas decidiram manter a vantagem para vários tipos de empresas. De toda forma, a renúncia será 35% menor e ficará, segundo a Receita, em R$ 9,5 bilhões.
A desoneração concedida a mais de 50 setores deveria, segundo a justificativa oficial, ter favorecido o emprego e aumentado a competitividade das empresas beneficiadas. Nada disso ocorreu. A produção industrial começou a derrapar em 2012, as condições do emprego pioraram e ninguém poderia falar seriamente de ganhos de competitividade a partir daqueles benefícios.
O Tribunal de Contas da União tem alertado o governo para a necessidade de fiscalização do uso dos benefícios e de avaliação de seus efeitos. O alerta foi quase inútil. Algum esforço de revisão crítica foi ensaiado no Ministério da Fazenda, mas sem grande efeito. A área política do Executivo continuou empenhada em barganhar benefícios e isso pesou mais nas decisões do governo do que a prudência da área financeira. O Congresso continuou mais empenhado em atender às pretensões de grupos e setores empresariais.
Um quadro mais completo do desperdício incluiria os subsídios concedidos pelo Tesouro por meio de bancos estatais. Os principais beneficiários foram, durante a gestão petista, os empresários amigos da corte. Pouco se avançou na mudança e nada garante avanço maior no próximo governo.
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