quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Clóvis Rossi: Murcha a última rosa vermelha

- Folha de S. Paulo

Até na Suécia esquerda cai e xenofobia avança

A social-democracia, que vem sofrendo sucessivos retrocessos na Europa, conhecerá no domingo (9) um novo revés, desta vez atingindo uma das suas grifes mais reluzentes, o Partido Social-Democrata e do Trabalhador da Suécia.

A mais recente pesquisa, divulgada no dia 2, dá apenas 25,6% à social democracia, seu registro mais baixo em praticamente um século (desde que, em 1921, foi introduzido o sufrágio universal no país).

É um resultado desastroso, ainda mais se se considerar que outro carro-chefe dos partidos que usam um punho e uma rosa como símbolo, o SPD alemão, obteve igualmente o pior resultado no pós-guerra no pleito de 2017 (26,4%).

O retrocesso talvez não impeça, se as pesquisas estiverem certas, que o partido continue sendo o mais votado: "Está muito longe dos anos de glória, mas também está longe de um colapso", diz à Folha Nicholas Aylott, professor de Ciência Política da Universidade Sodertorn, de Estocolmo.

É pouco, no entanto, para um partido que esteve no poder em 60 dos últimos 100 anos, 41 deles consecutivos (1932-1973).

Essa cronologia demonstra que a social-democracia é a principal responsável pela construção do invejável modelo de bem-estar social que caracteriza os países nórdicos em geral e a Suécia em particular.

Como lembra o Financial Times, "pesquisas internacionais coroam a Suécia como a melhor nação em tudo, de competitividade econômica a fazer o bem para a humanidade".

Na opinião de Hakan Blomqvist, do Instituto de História Contemporânea da Universidade Sodertorn, foi a guinada para o centro que levou ao declínio da social democracia: "A social-democracia sueca seguiu, até certo ponto, a 'Terceira Via' de Tony Blair [o líder trabalhista britânico dos anos 90].

Desregulamentou os mercados financeiros, privatizou serviços do Estado como eletricidade, telecomunicações e algo da seguridade social, além de ter praticado cortes na saúde, no seguro-desemprego, no sistema de aposentadoria e outros benefícios sociais".

É um relato que serve para outros partidos da social-democracia na Europa e que ajuda a explicar o declínio deles. Se a centro-esquerda coincide com a centro-direita, é mais lógico votar nesta última, que tem tais políticas no DNA.

O que incomoda o establishment sueco e europeu é o fato de que o retrocesso da social democracia não está levando votos para o Moderados, o partido que representa a direita civilizada, e, sim, para a extrema direita.

Cresce o Democratas Suecos, fundado em 1988, com raízes em grupos neonazistas: colou praticamente na social-democracia (25,6% a 18,1%). Estão à frente do Moderados (17%).

O grupo, nacionalista, xenófobo e eurocético, se beneficiou da crise migratória de 2015, ano em que 163 mil pessoas desembarcaram na Suécia, o maior número em relação à população em toda a Europa.

Esse avanço cria o grande desafio para a Suécia nestas eleições, como analisa o professor Aylott: "A Suécia será capaz de alcançar uma acomodação com a extrema direita como ocorreu na Dinamarca e na Noruega, ou lidar com ela começará a erodir as fundações da democracia, como muita gente acredita?"

Vale para a Suécia, vale para a Europa e até para o Brasil, em circunstâncias distintas.

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