Ilustríssima / Folha de S. Paulo
[RESUMO] O Brasil sofreu 13 investidas
golpistas desde a Independência, entre as quais o ataque aos
três Poderes no último dia 8. A ação dos bolsonaristas guarda
semelhanças com o levante da AIB (Ação Integralista Brasileira) em 1938. Nesses
episódios, os golpistas encontraram a residência e a sede da Presidência
desguarnecidas, as forças de segurança demoraram a
chegar e houve omissão de setores do Exército. Resta saber se o
futuro da nova extrema
direita será melhor que o do fascismo
tropicalizado dos anos 1930,
que entrou em declínio após a Segunda Guerra.
Alguns fenômenos políticos, sobretudo
quando inusuais e estrepitosos, ao ocorrerem tornam irresistíveis os exercícios
comparativos. É quando a leitura dos fatos os coloca em perspectiva, permitindo
identificar singularidades, de um lado, e constantes históricas, de outro.
O 8 de Janeiro,
que despertou estupor no
mundo, por certo demandará um olhar assim quando as investigações
descortinarem toda a sua tessitura, incluindo, além dos vândalos, a autoria
intelectual e os apoiadores
explícitos e ocultos e esclarecendo como se dava a relação
entre os quartéis e os acampados à
sua frente.
Nós não temos, que eu saiba, um estudo
comparativo suficientemente amplo desses processos de tomada violenta do poder
na América
Latina, embora o continente seja pródigo deles. Nem mesmo das
revoluções havidas —do que, aliás, já reclamava Joaquim Nabuco (1849-1910) em
sua releitura do fim trágico do presidente chileno José Manuel Balmaceda— e
muito menos no Brasil, onde, desde a Independência, tivemos 13 golpes de
Estado, exitosos ou não.
Eles se distinguem dos movimentos
separatistas, como a Confederação do Equador (1824) ou a Guerra dos
Farrapos (1835-1845). Diferem também de outros conflitos como
a Revolução
Constitucionalista de São Paulo (1932) e mais ainda dos
movimentos revoltosos tenentistas, incluída a Coluna Prestes (1924).
Golpes ou autogolpes implicam o assalto
direto aos Poderes e objetivam a ruptura constitucional. Foram de iniciativa
palaciana os de 1823 (dissolução da Assembleia Constituinte), 1840 (Golpe da
Maioridade), 1891 (Deodoro fecha o Congresso) e 1937 (Estado Novo).
O de Marechal Deodoro durou apenas 20 dias.
Todos os demais tiveram como objetivo a
destituição ou o impedimento dos então chefes de Estado. Começando pela implantação
da República (1889), depois pela Revolução de 1930, que culminou com
o golpe militar que depôs Washington Luiz, pela Intentona Comunista (1935),
pelo Levante integralista de 1938, pela deposição de Vargas (1945), pelo chamado
contragolpe legalista do marechal Lott (1955), pela adoção forçada do
parlamentarismo (1961), pelo golpe militar
de 1964, que inaugurou a Quinta República, e pelo assalto às
sedes dos três Poderes em janeiro de 2023. Golpes e autogolpes vitoriosos foram
70% deles.