O Globo
Presidente brasileiro é visto como ingênuo
ao tentar ter influência nos grandes temas políticos em que tem pouca ou
nenhuma
O presidente Lula é ingênuo ou
megalomaníaco? Na revista inglesa The Economist, e em diversas abordagens de
jornais dos Estados Unidos, a possibilidade de o presidente brasileiro ser
ingênuo tentando ter influência nos “grandes temas políticos em que tem pouca
ou nenhuma” é a mais aventada. Essa obsessão de Lula de se tornar um líder
internacional sem resolver as questões internas do país que governa é antiga,
talvez convencido pelo então presidente Barack Obama, que o classificou como “o
cara” numa reunião internacional.
Mas Obama se arrependeria mais tarde. No último ano de seu segundo mandato, o Brasil tentou intermediar um acordo nuclear entre Irã e Estados Unidos, coadjuvado pela Turquia, mas ele foi rejeitado pelos americanos. O governo brasileiro divulgou uma carta que o presidente americano enviara a Lula querendo provar que o governo dos EUA fugia de compromissos assumidos. Só que na carta de Obama estava definido que o Irã deveria “reduzir substancialmente” seu estoque de urânio de baixo enriquecimento na transição para o acordo internacional. Como Brasil e Turquia permitiam que o Irã continuasse a enriquecer urânio por um ano antes dessa transição, o governo americano recusou o acordo, fechado mais adiante.
Em 22 de julho de 2010, em meio a uma crise
causada pelas acusações do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe na OEA de que
guerrilheiros das Farc tinham estabelecido bases e se escondido atrás da
fronteira venezuelana, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, anunciou o
rompimento das relações diplomáticas entre os dois países. O Brasil se ofereceu
para intermediar um acordo, mas foi vetado pela Colômbia por não ter
imparcialidade para tal. Hoje, depois de ter assumido uma posição descabida a
favor da Rússia na guerra com a Ucrânia, o país perdeu completamente a capacidade
de participar de um “grupo de países a favor da paz”. Não tem cabimento afirmar
que a guerra existe por culpa do país invadido, a Ucrânia. O raciocínio parece
baseado em pílulas de sabedoria de mesa de bar, onde Lula pretendia resolver a
questão “tomando uma cervejinha”. Quando um não quer, dois não brigam,
raciocina simploriamente Lula.
O curioso é que o governo brasileiro sob
Lula é parceiro reconhecido internacionalmente em temas caros a ele: combate à
pobreza e meio ambiente. Há um antiamericanismo infantil na esquerda
brasileira, que não distingue um governo democrata, como o de Biden, de um
republicano radical, como o de Trump. O acrônimo mais famoso das últimas duas
décadas, Bric —criado em análise do Goldman Sachs do final de 2003 unindo as iniciais
de Brasil, Rússia, Índia e China - mais tarde entraria a África do Sul,
passando a ser conhecido como Brics -, países que estariam no topo da economia
mundial nos próximos 50 anos —, está em franca decadência há bom tempo. Pelo
estudo, o Brasil seria a quinta economia do mundo, medida pelo Produto Interno
Bruto. Para chegar lá em 2050, teria de crescer em média 3,6% por 50 anos. Mas
tem crescido à média de 2,5% nos últimos 40. Essa performance nos tem valido a
classificação de “eternos emergentes”, mais desagradável que “país do futuro”.
Até agora, as discussões no Brics têm sido dominadas por temas que dividem os integrantes: a representação mais ampla dos países emergentes nas organizações estabelecidas depois da Segunda Guerra Mundial e a questão do protecionismo, especialmente na agricultura. Dois deles, China e Rússia, estão entrincheirados entre os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. E, no tema do protecionismo, a divisão ocorre em outras linhas, porque o Brasil busca apoio aos seus produtos agrícolas, e China e Índia têm o interesse de resguardar sua agricultura familiar. A oposição aos Estados Unidos pode uni-los, mas, neste novo mundo geopolítico desenhado pela crise internacional, ainda há muitos avanços a ser feitos pelo Brics.
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