Valor Econômico
O câmbio, beirando os R$ 6, empurra a inflação e o juro. E assim, o impacto fiscal ameaça transformar todo o esforço em enxugamento de gelo
Já ficou claro que vai sair cara a pressão do
presidente da República pela inclusão no pacote fiscal da isenção de Imposto de
Renda para quem ganha até R$ 5 mil. O câmbio, beirando os R$ 6, empurra a
inflação e o juro. E assim, o impacto fiscal ameaça transformar todo o esforço
em enxugamento de gelo.
Sim, era uma promessa de campanha, mas também
poderia sido deixado para 2025, com a mesma incidência a partir de 2026 como
agora foi proposto. Permitiria uma melhor gestão de expectativas, por um lado,
e ofereceria um bônus para seu eleitorado no ano da sucessão presidencial.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece ter sido movido não apenas pela necessidade de compensar a alteração na regra de reajuste do salário mínimo mas também pela ânsia de encontrar uma ponte para o universo dos pequenos empreendedores que tem desafiado e, em muitos casos, derrotado o governo, vide a proposta para os motoristas de aplicativos.
O problema é que não basta uma benesse do
gênero. Este público é, em grande parte, o núcleo duro da votação de Pablo
Marçal (1,7 milhão), cujas ambições são mais calcadas na certeza de que é a fé
cega na teologia do empreendedorismo que vai enriquecê-lo.
Para esse público, tudo o que o governo pode
fazer é não atrapalhá-lo, o que casa com a proposta de isenção do IR. Mas a
proposta é que a isenção valha apenas em 2026, abrindo uma longa e larga
avenida para desinformação e decepção. Só lembrando que o ambiente digital onde
tudo isso prospera continua desregulado e, pelas difíceis perspectivas do
julgamento no Supremo Tribunal Federal do artigo 19 do Marco Civil da Internet,
assim permanecerá.
Ao bancar esta proposta e pressionar as
expectativas do mercado, o presidente fragilizou a posição do governo frente ao
Congresso. Pode ser real a disposição demonstrada pelo presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em aprovar o pacote a toque de caixa, mas o preço a
ser cobrado será descontado da economia projetada.
Ao explicar as medidas, o ministro Fernando
Haddad buscou conter esta frustração de expectativas do mercado lembrando que o
Congresso não poderá aprovar a isenção sem a devida compensação. Pelo pacote,
esta se daria pela taxação das rendas acima de R$ 50 mil.
De fato, vai ser difícil para o Congresso se
opor à isenção do IR para a renda até R$ 5 mil, mas apostar na cobrança da
conta sobre os mais ricos é ignorar como a proposta de taxação de fundos
exclusivos entrou e saiu do Congresso. A alíquota, inicialmente proposta em 15%
findou em 8%.
O governo tem uma boa interlocução com a
cúpula dos grandes bancos, como o almoço de fim de ano da Federação dos Bancos
com a presença de três ministros (Haddad, Simone Tebet e Alexandre Padilha)
nesta sexta demonstrará, mas não são esses interlocutores que movem as
expectativas.
Quem faz preço no mercado é a indústria
tupiniquim dos fundos de investimento que, ao longo dos 20 anos desde que Lula
chegou ao poder pela primeira vez, transformou-se numa das maiores do mundo
pelo juro na lua e por circunstâncias regulatórias.
Esta indústria assistiu o governo Jair
Bolsonaro transformar duas rubricas, o Bolsa Família e as emendas
parlamentares, em 0,5% do PIB para 1,8% sem abrir o bico. Como recaiu sobre o
governo Lula lidar com esta herança, é injusto supor que se desconheçam as
afinidades ideológicas que os movem a agir com dois pesos e duas medidas, mas é
razoável imaginar que ao bancar a guerra desta maneira o presidente esteja
dando murro em ponta de faca.
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