Por André Guilherme Vieira | Valor Econômico
SÃO PAULO - Em 18 termos de depoimentos prestados à Procuradoria-Geral da República, sete delatores da Odebrecht atribuem o recebimento de vantagens indevidas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além do custeio de despesas pessoais do ex-presidente pela empreiteira, bem como a realização de reformas no sítio de Atibaia (SP) - que seria propriedade oculta do petista -, e ainda, a compra de imóveis para o uso pessoal do ex-presidente e para a instalação da nova sede do Instituto Lula.
As acusações sobre supostos favorecimento e enriquecimento relacionados a Lula foram feitas por Marcelo e Emílio Odebrecht, e pelos ex-executivos Alexandrino Alencar, Carlos Armando Paschoal, Paul Altit, Paulo Baqueiro de Melo e João Carlos Nogueira.
Com os pedidos de abertura de investigação feitos pela PGR e remetidos pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, à primeira instância, novas seis frentes de apuração ampliam as diversas investigações contra Lula já conduzidas pela força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba e pelo Ministério Público Federal (MPF) no Distrito Federal. Atualmente Lula responde a cinco ações penais que envolvem corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Nos vídeos que registram seus depoimentos em delação premiada, os empresários Marcelo e Emílio Odebrecht afirmam que Lula e Dilma Rousseff tinham clara noção do montante de dinheiro destinado ao PT, tanto por caixa dois como por contrapartida a interesses do grupo empresarial.
Emílio Odebrecht também afirmou que se reuniu com Lula dentro do Palácio do Planalto para tratar com o então presidente sobre a reforma do sítio de Atibaia - o imóvel seria de Lula, que é acusado de ocultar a propriedade.
O encontro narrado por Emílio teria ocorrido em 30 de setembro de 2010, no penúltimo dia do segundo mandato presidencial de Lula. Na ocasião, o empresário afirma ter comunicado o petista de que a reforma no sítio estaria concluída até o dia 15 de janeiro de 2011.
Já segundo Alexandrino Alencar, Lula teria prometido interceder no governo Dilma Rousseff para tornar mais "fluido" o relacionamento da então presidente da República com o à época presidente do grupo, Marcelo Odebrecht.
Em contrapartida, disse Alexandrino, Lula pediu que a empresa apoiasse os negócios do filho caçula do ex-presidente, Luís Cláudio Lula da Silva - investigado na Operação Zelotes.
"O projeto dele era criar uma liga de futebol americano profissional no Brasil", relatou o delator. "Eu fiquei encarregado de criar esse empresário ou essa liga", acrescentou. Segundo Alexandrino, a empreiteira não atuava nesse setor, mas ele buscaria pessoas capacitadas para ajudar. Alexandrino falou ainda sobre pagamentos por palestras de Lula.Segundo ele, as palestras foram a forma encontrada pela empresa para remunerar o ex-presidente Lula, "face ao que ele fez durante muitos anos para o grupo, e que fosse de uma maneira lícita, transparente", disse.
De acordo com Alexandrino, a empresa percebeu que as viagens de Lula "abriam oportunidades de negócios e sedimentavam a imagem da Odebrecht". Mas ele negou que as visitas de Lula a diversos países tivessem o propósito de defender interesses da empresa.
A delação de Marcelo Odebrecht atingiu em cheio Dilma Rousseff. Ele disse que era o responsável pela interlocução direta com a então presidente, com quem afirmou que mantinha ao menos dois encontros por ano, que duravam de duas a quatro horas, para tratar de "diversos assuntos" de interesse do grupo Odebrecht. Essas reuniões ocorriam no Planalto ou na biblioteca do Palácio da Alvorada, segundo Marcelo.
O empresário falou também que costumava ter encontros rápidos com a então presidente, "de 5, 10, 20 minutos em geral", durante inaugurações ou visitas a obras, e viagens no Brasil e ao exterior. Marcelo afirmou que tinha "uma agenda constante com Antonio Palocci e Guido Mantega, que definiu como "interlocutores da Presidência da República e do PT".
Marcelo Odebrecht disse que todas as campanhas municipais que a empresa apoiou tiveram repasses de dinheiro por intermédio do marqueteiro João Santana, a pedido do ex-ministro Palocci. O empresário disse que Mantega chegou a pedir R$ 57 milhões que inicialmente seriam destinados à compra de apoio dos partidos PDT, Pros, PSD, PRB e PCdoB, para que dessem apoio à chapa presidencial de 2014, formada por Dilma e pelo então vice-presidente Michel Temer.
Marcelo também esclareceu que previamente havia firmado acerto de R$ 100 milhões para a campanha presidencial de 2014, e que, depois disso, veio um pedido adicional de Mantega.
Segundo a versão de Marcelo, ele disse a Mantega que não poderia fazer nova doação e ofereceu como alternativa repassar o recurso para João Santana. Segundo o empresário, Mantega não concordou, sugerindo então que a Odebrecht doasse para os partidos que integravam a coligação da chapa Dilma-Temer. Marcelo disse que acabou pagando R$ 25 milhões, destinando R$ 5 milhões ao Pros, R$ 5 milhões para o PDT, R$ 5 milhões para o PRB e R$ 7 milhões ao PCdoB.
Marcelo esclareceu aos procuradores que, primeiramente Palocci e depois Guido Mantega, eram seus interlocutores diretos com o governo. Já Emílio Odebrecht era o responsável pela interface direta com Lula durante dos dois mandatos do petista.
De acordo com o empresário, os recursos originados no Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht eram usados por orientação dos ex-ministros "para fins diversos". Ele narra "desde doação oficial tanto para campanhas políticas, principalmente em 2010 e 2014", como doações viabilizadas pela via do caixa dois. "E também [ia] para pagamentos de caixa dois de campanhas do exterior que interessavam, por alguma razão, ao PT, ao governo federal, apoiar", afirmou Marcelo.
O ex-presidente do grupo Odebrecht acrescentou que Palocci fez pedidos de pagamentos para o ex-presidente Lula, para custear despesas que envolviam o Instituto Lula.
Marcelo citou a compra do terreno na Vila Clementino, em São Paulo, que seria usada como nova sede da entidade. Em declarações prestadas por escrito à PGR, antes de depor oficialmente, Emílio Odebrecht contou como se davam as negociações sobre doações de campanha ao ex-presidente Lula e ao PT.
"O pedido de ajuda era de fato feito por ele [Lula] diretamente a mim, mas combinávamos sempre de designar um representante de cada lado para negociar os valores e combinar os detalhes", escreveu Emílio, sem, no entanto, contextualizar quando e onde tal episódio ocorreu. Em vídeo de um de seus depoimentos, Emílio diz que sabia que parte dos pagamentos ocorreu por meio de caixa dois, apesar de alegar que não conhecia detalhes dessas operações.
"Minha estimativa é que tenhamos pagado ao PT e a Lula, em atendimento a solicitações feitas a pretexto de campanha, o montante em torno de R$ 20 milhões por campanha", afirmou. Em nota, os advogados de Lula afirmaram que os depoimentos dos delatores da Odebrecht à PGR são "acusações frívolas, pela ausência total de qualquer materialidade". (Colaboraram Daniela Chiaretti, Fernando Taquari e Camilla Veras Mota)
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