Valor Econômico
Mínimo já chegou a US$ 306 e caiu para US$
197 em 2021
O Brasil não está preparado para nenhuma
guerra, não tem um comandante determinado, não está mais arrumado do que o
“pessoal lá fora” e não é “duro na queda”.
Na verdade, a economia brasileira se mostra
“mole na queda” há décadas. Recentemente, sofreu duas grandes recessões em 2015
e 2016, de lá para cá o PIB está quase estagnado e não apenas por culpa da
pandemia e da guerra do Putin. Houve também erros de condução da economia,
vários deles decorrentes da ideia liberal de que a austeridade fiscal leva
automaticamente ao crescimento.
O déficit público zerado do ano passado, tido como um troféu pelos economistas do governo, não pôs carne nos pratos nem gasolina nos tanques. Desgraça pouca é bobagem, diz o ditado popular. Assim, o brasileiro teve em 2021, ao mesmo tempo, duas grandes desventuras: o rendimento médio real dos salários caiu 7% (9,7% se considerado o trimestre encerrado em janeiro), segundo menor nível da série histórica, e a taxa de inflação aumentou para 10,06%, a maior em seis anos. Ou seja, as pessoas ganharam menos e gastaram mais para se sustentar.
Esse cenário, agravado pelos efeitos ainda
presentes da pandemia e pela guerra inventada por Putin, leva a uma óbvia
conclusão: ganhará o pleito presidencial de outubro o candidato que conseguir
convencer o eleitor de que vai criar empregos e aumentar a renda do brasileiro.
Promessas de austeridade e corte de gastos
pouco devem ajudar. Muito menos o velho discurso anticorrupção. Os
pré-candidatos já perceberam isso. Basta ver os anúncios oficiais dos partidos
na televisão.
O salário mínimo sim, tenderá a ser um
assunto recorrente nos debates. Pessoas que viveram os dramáticos anos
1980/1990 no Brasil lembram que uma das ambições nacionais, reivindicação
constante das entidades de trabalhadores, era o mínimo equivalente a US$ 100,
uma das metas sempre citadas nos programas de candidatos à Presidência.
A meta foi alcançada e superada. Segundo
cálculos do Valor Data, o mínimo saiu de US$ 56,6 em 2002 para US$ 306 em 2010.
Após esse ano, porém, entrou em queda, até terminar 2021 em US$ 197, o nível
mais baixo em 13 anos.
Além do relativo efeito cambial
(valorização do real), o que impulsionou o mínimo em dólares foi a adoção de
uma legislação que previa aumentos reais, que vigorou a partir de 2006 e foi
abandonada por Bolsonaro. O cálculo de reajuste anual levava em conta a
inflação do ano anterior acrescida do percentual de variação do PIB de dois
anos antes. De 2001 a 2013, a valorização do mínimo em reais foi de 349%, muito
acima da inflação no período, de 121%. Por outro lado, os fatores que levaram o
mínimo a perder mais valor foram também o câmbio e as retrações/estagnações do
PIB.
O principal empecilho para o reajuste real
do salário mínimo sempre foi o impacto que isso teria nos gastos do setor
público, principalmente na Previdência Social. Muitas vezes tentou-se
desconectar os benefícios do INSS da variação do mínimo, sem sucesso. Hoje, os
aposentados que recebem mais de um salário têm reajuste que acompanha a
inflação, e não a correção do mínimo.
Não se deve esperar, na campanha eleitoral,
um confronto explícito entre os que defendem a recuperação do mínimo e os que
preferem proteger os cofres da Previdência. Pregar a austeridade fiscal, ainda
que esse discurso tenha sido dominante na mídia brasileira nos últimos anos,
não é uma atitude popular e não conquista votos quando se tenta fazer isso com
prejuízo para os mais pobres.
O aumento real do mínimo elevou os gastos
da Previdência e o custo unitário do trabalho a partir de 2006/08, mas também
teve um extraordinário efeito positivo no consumo, na distribuição da renda, na
evolução dos índices de desenvolvimento humano e, naturalmente, na redução da
pobreza no país.
Outro tema que voltará ao debate são os
juros. O Banco Central, agora autônomo, faz acenos para a moderação, mas deve
dar continuidade à sua política de aperto monetário, que contraria tanto a
extrema direita que apoia Bolsonaro quanto a esquerda que sustenta Lula.
Aumentar juros em ano eleitoral, com 65 milhões de pessoas inadimplentes, é uma
política, no mínimo, corajosa.
A aprovação da autonomia do BC foi
costurada às pressas pelo governo para garantir, entre outras razões, certo
controle da política monetária após uma eventual eleição de um governo de
oposição em outubro, já que o presidente do BC não poderá ser demitido por quem
assumir em janeiro de 2023. Agora, o feitiço se virou contra o feiticeiro,
porque Bolsonaro não terá como evitar que, em plena campanha de reeleição, o BC
aumente a taxa de juros, dando prato cheio para as críticas dos candidatos de
oposição.
O outro prato cheio será a queda da renda
média do trabalhador em 2021 para R$ 2.587 por mês, segundo dados da Pnad,
valor 7% inferior ao de 2020. A taxa de desemprego recuou no ano passado, mas
ainda estava em 13,2%, enquanto os EUA estão com pleno emprego. Com inflação e
juros de dois dígitos e salários em queda, a recuperação da economia será
impossível neste ano de eleições. Os pessimistas preveem recessão e os
otimistas, crescimento de 0,6%.
Os economistas do governo continuam a dizer
que o Brasil “está condenado a crescer”. Mas estamos chegando ao fim do
primeiro trimestre sem sinais positivos nesse sentido e 12 milhões de
desempregados. Vale lembrar, então, frase dita certa vez ao Valor pelo empresário José
Mindlin (1914-2010): “O economista é aquela pessoa para a qual contra
argumentos não há fatos”. É difícil discordar, embora haja exceções.
Nenhum comentário:
Postar um comentário