Valor Econômico
A incerteza gerada nos últimos documentos do Copom reforça a necessidade de aumentar sua clareza e assertividade
Um dos exemplos das alterações promovidas pelas duas gestões mais recentes do Banco Central (BC) para tornar sua comunicação mais tempestiva e transparente vem do comunicado do Copom, que passou a discutir sua avaliação e a explicar as decisões tomadas logo após o término da sua reunião. Apesar do excelente avanço, o documento ainda é dúbio, em parte devido à possível percepção de que um eventual erro de avaliação do Copom pode comprometer a credibilidade do BC.
A crença sobre esse risco é equivocada, pois
não faz sentido ter a pretensão de antecipar com precisão a dinâmica dos
fundamentos e, consequentemente, dos juros. Nesse contexto, a melhor resposta
do BC seria a publicação de um comunicado assertivo e direto, de forma a
reduzir a incerteza sobre a provável atuação da instituição para diferentes
cenários prospectivos.
Comentários como os do comunicado de 31 de
julho como “demanda serenidade e moderação” e “o Comitê se manterá vigilante”,
bem como a inclusão do trecho “acompanhamento diligente e ainda” antes da
referência de “maior cautela” presente no texto anterior, dizem muito pouco.
Por definição, o Copom precisa sempre de serenidade e de moderação, assim como
se manter sempre vigilante com um acompanhamento diligente. Essa abordagem
dúbia e pouco clara deveria ser abandonada, pois é um resquício do passado em
que não se percebia que uma comunicação tempestiva e transparente contribui
para a melhor condução da política monetária.
A incerteza gerada pela comunicação pouco
direta dos comunicados é comprovada pela reação a respeito do último balanço de
riscos para a inflação. Enquanto alguns participantes de mercado assinalaram
que o balanço passou a ser assimétrico, pois o documento tinha aumentado os
riscos negativos de dois para três e mantido apenas dois positivos; outros
concluíram que o equilíbrio continuava simétrico, pois o que importaria seria a
relevância de cada fator e não o número deles.
O Copom falha ao transferir informações
relevantes para a semana seguinte à reunião e ao dar espaço para a alegação de
que são transmitidas informações inéditas nas primeiras discussões públicas, ou
até privadas, de membros do comitê com audientes externos após a divulgação dos
documentos. Na última reunião do Copom, por exemplo, o comunicado de 31 de
julho teria sido mais adequado caso tivesse apontado claramente sua leitura
sobre o balanço de riscos frente à reunião anterior, em vez de só especificar sua
avaliação sobre o tema em 6 de agosto, ao assinalar que “todos os membros
concordaram que há mais riscos para cima na inflação, inclusive com vários
membros enfatizando a assimetria do balanço de riscos”.
O comitê também erra ao não especificar de
forma direta que aumentou a probabilidade do cenário em que é necessário aperto
monetário adicional em algum momento futuro para garantir a convergência da
inflação para sua meta, em vez de mencionar “a necessidade de maior
vigilância”.
As capas dos principais jornais no dia
seguinte à divulgação dos documentos comprovam as diferenças de interpretação
sobre o seu teor. Em reação ao comunicado, as manchetes de 1 de agosto nos
quatro principais jornais do país foram: Copom mantém a Selic em 10,5% (Valor);
BC e Fed mantêm juros, mas com sinais distintos para novas decisões (Estado de
S. Paulo); BC mantém juro em 10,5% ao ano pela 2ª vez seguida (Folha de S.
Paulo) e BC mantém juros e cita maior vigilância (O Globo).
As manchetes em 7 de agosto, após a
divulgação da ata no dia anterior, tiveram mensagem bastante diferente, sendo,
respectivamente, de: Copom usa tom duro em ata, e juro futuro sobe; Banco
Central avisa que não hesitará em elevar juro para conter a inflação; BC sobe o
tom e diz que pode elevar os juros para conter a inflação; e BC afirma que não
hesitará em subir juros contra a inflação. As matérias não deixam dúvidas de
que a ata foi mais incisiva do que o comunicado na indicação do risco de alta
de juros.
As reações dos futuros de taxa de juros após
a divulgação dos documentos também comprovam que a ata teve um tom mais duro
sobre o risco de alta da taxa Selic frente às expectativas embutidas nos preços
no dia anterior. Após a divulgação do comunicado, as taxas de juros após a 1ª
hora de funcionamento do mercado em 1 de agosto recuaram 7 pontos base (pb) nos
contratos de janeiro de 2025 e 7 pb nos de janeiro de 2027. Já após a
divulgação da ata em 6 de agosto, as taxas de juros aumentaram na 1ª hora de operações,
respectivamente, 6 pb e 9 pb. Caso o comunicado tivesse indicado adequadamente
o risco de elevação da taxa Selic, a reação dos juros após a divulgação da ata
teria sido menos significativa - não houve outras notícias relevantes desde o
fechamento no dia anterior.
A linguagem mais cifrada em seus comunicados
não é uma exclusividade do BC. Os textos dos comitês monetários dos bancos
centrais dos EUA (Fed) e da Área do Euro (BCE) são igualmente indiretos.
Todavia, as entrevistas dos presidentes dessas instituições imediatamente após
a sua divulgação agregam mais informações, servindo para esclarecer as
mensagens, bem como tornar a comunicação mais completa sobre as discussões dos
seus encontros. A maior transparência do Fed também está presente nas projeções
dos participantes do seu comitê para os fed funds nos primeiros três anos. No
caso do Brasil, a ata tem servido para calibrar e tornar menos obtusa a
comunicação da autoridade monetária. Todavia, a ata só é divulgada com três
dias de defasagem e mantém tom cifrado.
Em suma, a incerteza gerada nos últimos
documentos do Copom reforça a necessidade de aumentar sua clareza e
assertividade. A divulgação de um comunicado mais claro e direto seria
fundamental para ampliação da qualidade na comunicação do BC, redução da incerteza
sobre a reação do Copom em diferentes cenários plausíveis e melhoria da
coordenação das expectativas de mercado. Essa estratégia seria muito mais
eficiente do que, por exemplo, a incorporação de entrevista após a reunião do
órgão.
Um comentário:
Muito bom! O colunista está coberto de razão. Os comunicados do COPOM mais confundem do que informam!
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