quarta-feira, 14 de agosto de 2024

Nilson Teixeira - Falta clareza nos comunicados do Copom

Valor Econômico

A incerteza gerada nos últimos documentos do Copom reforça a necessidade de aumentar sua clareza e assertividade

Um dos exemplos das alterações promovidas pelas duas gestões mais recentes do Banco Central (BC) para tornar sua comunicação mais tempestiva e transparente vem do comunicado do Copom, que passou a discutir sua avaliação e a explicar as decisões tomadas logo após o término da sua reunião. Apesar do excelente avanço, o documento ainda é dúbio, em parte devido à possível percepção de que um eventual erro de avaliação do Copom pode comprometer a credibilidade do BC.

A crença sobre esse risco é equivocada, pois não faz sentido ter a pretensão de antecipar com precisão a dinâmica dos fundamentos e, consequentemente, dos juros. Nesse contexto, a melhor resposta do BC seria a publicação de um comunicado assertivo e direto, de forma a reduzir a incerteza sobre a provável atuação da instituição para diferentes cenários prospectivos.

Comentários como os do comunicado de 31 de julho como “demanda serenidade e moderação” e “o Comitê se manterá vigilante”, bem como a inclusão do trecho “acompanhamento diligente e ainda” antes da referência de “maior cautela” presente no texto anterior, dizem muito pouco. Por definição, o Copom precisa sempre de serenidade e de moderação, assim como se manter sempre vigilante com um acompanhamento diligente. Essa abordagem dúbia e pouco clara deveria ser abandonada, pois é um resquício do passado em que não se percebia que uma comunicação tempestiva e transparente contribui para a melhor condução da política monetária.

A incerteza gerada pela comunicação pouco direta dos comunicados é comprovada pela reação a respeito do último balanço de riscos para a inflação. Enquanto alguns participantes de mercado assinalaram que o balanço passou a ser assimétrico, pois o documento tinha aumentado os riscos negativos de dois para três e mantido apenas dois positivos; outros concluíram que o equilíbrio continuava simétrico, pois o que importaria seria a relevância de cada fator e não o número deles.

O Copom falha ao transferir informações relevantes para a semana seguinte à reunião e ao dar espaço para a alegação de que são transmitidas informações inéditas nas primeiras discussões públicas, ou até privadas, de membros do comitê com audientes externos após a divulgação dos documentos. Na última reunião do Copom, por exemplo, o comunicado de 31 de julho teria sido mais adequado caso tivesse apontado claramente sua leitura sobre o balanço de riscos frente à reunião anterior, em vez de só especificar sua avaliação sobre o tema em 6 de agosto, ao assinalar que “todos os membros concordaram que há mais riscos para cima na inflação, inclusive com vários membros enfatizando a assimetria do balanço de riscos”.

O comitê também erra ao não especificar de forma direta que aumentou a probabilidade do cenário em que é necessário aperto monetário adicional em algum momento futuro para garantir a convergência da inflação para sua meta, em vez de mencionar “a necessidade de maior vigilância”.

As capas dos principais jornais no dia seguinte à divulgação dos documentos comprovam as diferenças de interpretação sobre o seu teor. Em reação ao comunicado, as manchetes de 1 de agosto nos quatro principais jornais do país foram: Copom mantém a Selic em 10,5% (Valor); BC e Fed mantêm juros, mas com sinais distintos para novas decisões (Estado de S. Paulo); BC mantém juro em 10,5% ao ano pela 2ª vez seguida (Folha de S. Paulo) e BC mantém juros e cita maior vigilância (O Globo).

As manchetes em 7 de agosto, após a divulgação da ata no dia anterior, tiveram mensagem bastante diferente, sendo, respectivamente, de: Copom usa tom duro em ata, e juro futuro sobe; Banco Central avisa que não hesitará em elevar juro para conter a inflação; BC sobe o tom e diz que pode elevar os juros para conter a inflação; e BC afirma que não hesitará em subir juros contra a inflação. As matérias não deixam dúvidas de que a ata foi mais incisiva do que o comunicado na indicação do risco de alta de juros.

As reações dos futuros de taxa de juros após a divulgação dos documentos também comprovam que a ata teve um tom mais duro sobre o risco de alta da taxa Selic frente às expectativas embutidas nos preços no dia anterior. Após a divulgação do comunicado, as taxas de juros após a 1ª hora de funcionamento do mercado em 1 de agosto recuaram 7 pontos base (pb) nos contratos de janeiro de 2025 e 7 pb nos de janeiro de 2027. Já após a divulgação da ata em 6 de agosto, as taxas de juros aumentaram na 1ª hora de operações, respectivamente, 6 pb e 9 pb. Caso o comunicado tivesse indicado adequadamente o risco de elevação da taxa Selic, a reação dos juros após a divulgação da ata teria sido menos significativa - não houve outras notícias relevantes desde o fechamento no dia anterior.

A linguagem mais cifrada em seus comunicados não é uma exclusividade do BC. Os textos dos comitês monetários dos bancos centrais dos EUA (Fed) e da Área do Euro (BCE) são igualmente indiretos. Todavia, as entrevistas dos presidentes dessas instituições imediatamente após a sua divulgação agregam mais informações, servindo para esclarecer as mensagens, bem como tornar a comunicação mais completa sobre as discussões dos seus encontros. A maior transparência do Fed também está presente nas projeções dos participantes do seu comitê para os fed funds nos primeiros três anos. No caso do Brasil, a ata tem servido para calibrar e tornar menos obtusa a comunicação da autoridade monetária. Todavia, a ata só é divulgada com três dias de defasagem e mantém tom cifrado.

Em suma, a incerteza gerada nos últimos documentos do Copom reforça a necessidade de aumentar sua clareza e assertividade. A divulgação de um comunicado mais claro e direto seria fundamental para ampliação da qualidade na comunicação do BC, redução da incerteza sobre a reação do Copom em diferentes cenários plausíveis e melhoria da coordenação das expectativas de mercado. Essa estratégia seria muito mais eficiente do que, por exemplo, a incorporação de entrevista após a reunião do órgão.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom! O colunista está coberto de razão. Os comunicados do COPOM mais confundem do que informam!