Folha de S. Paulo
Ausência parcial traz o lembrete de uma
dependência acentuada e da chantagem direta feita pelo Congresso
A cirurgia que deve tirar Lula de
campo até a próxima semana exibe sintomas agudos de deformações conhecidas do
governo e das relações de poder no país. A internação do presidente não oferece
um grande risco político imediato, mas expõe anomalias institucionais e
fragilidades domésticas da gestão petista.
A concentração da autoridade política nas
mãos de Lula é a marca mais cantada deste mandato. Não é uma grande deformação
para os padrões do presidencialismo brasileiro, mas essa característica
condicionou toda a estrutura do poder a uma dependência
acentuada da porta para dentro e da porta para fora.
A coincidência da internação com a corrida acelerada para a aprovação do ajuste fiscal mostra o quanto Lula precisa de Lula. Ainda que o presidente esteja disposto a despachar do hospital, o momento politicamente delicado é um lembrete de que parte da influência do petista está ancorada em seus gestos públicos e conversas reservadas em Brasília.
Nenhum ministro de Lula teve disposição ou
força para adoçar o remédio amargo da contenção de gastos em dois setores
cruciais para a deglutição do pacote: a base social do governo e o PT. Até aqui, o presidente
não puxou para seu colo o desgaste das medidas, mas auxiliares avaliavam que só
ele teria condições de cumprir a missão. No hospital, seu alcance fica limitado
por alguns dias.
Dentro dos palácios, a distorção é ainda mais
nítida. Horas antes da internação, o próprio Lula precisou endossar um acordo
de liberação de emendas para tentar destravar a votação do pacote num Congresso
que nunca considerou suficiente a palavra de ministros destacados pelo petista.
A aberração política aparece na forma de uma chantagem que só funciona quando é
apresentada diretamente ao presidente.
O tamanho dos eventuais prejuízos da ausência
parcial de Lula ainda será medido. Os possíveis efeitos de curto prazo na
operação política do governo, porém, são mais palpáveis do que as precoces
especulações sobre 2026 e a sucessão do petista. Considerada a previsão dos
médicos de uma boa recuperação, tudo indica que essa questão também
dependerá mais do próprio Lula do que de outros personagens.
3 comentários:
O cordão dos puxa saco cada vez aumenta mais!
Chacrinha
A ver.
Excelente coluna! Lula e seu governo deixaram quase tudo pra última hora, e agora não tem correria que dê conta de tudo, ainda mais com a má vontade do Congresso. Vai faltar tempo e vai faltar ano pra aprovar tudo que o Governo queria/esperava...
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