O Estado de S. Paulo
Há uma percepção de que mais americanos não
acreditam que o sonho americano seja possível
Uma casa branca, uma varanda, cercas de madeira pintadas de branco, um gramado verde, uma bandeira dos Estados Unidos hasteada no jardim. Este é, ou era, o imaginário do sonho americano. Ele representa a conquista material – a casa, o carro, o jardim –, mas também carrega a promessa de recompensa pelo trabalho árduo. Há uma percepção crescente de que mais e mais americanos não acreditam que o sonho americano seja possível.
Pesquisas recentes confirmam essa sensação:
apenas 36% dos americanos consideram o sonho possível hoje, comparado a 53% em
2012, segundo o The Wall Street Journal. Entre os mais jovens, 42% ainda
acreditam nele, enquanto 68% dos mais velhos mantêm a esperança. Moradia cara e
dívidas estudantis alimentam esse ceticismo, de acordo com a Pew Research.
O recém-empossado presidente Trump herdará
uma economia decente de seu antecessor: desemprego baixo, inflação em
desaceleração e o PIB surpreendendo positivamente. O cenário está longe de ser
catastrófico e levanta a dúvida de quanto a economia influenciou a derrota da
ex-vice-presidente Kamala Harris. Mas talvez essa análise careça de algo menos
objetivo. As pessoas não apenas avaliam o presente: julgam o que esperavam que
ele fosse. A frustração nasce do descompasso entre a expectativa e a realidade,
mesmo que esta última, por si só, seja aceitável.
Enquanto escrevia esta coluna, recebi de um
amigo um meme que parecia traduzir perfeitamente o espírito desta reflexão. Era
Al Bundy, interpretado por Ed O’Neill no seriado Married With Children. Ele
estava sentado no sofá, curvado, com a mão enfiada na calça e a expressão
típica de desgosto. A legenda dizia: “Nos anos 90, Al Bundy era considerado
pobre”. Abaixo, uma foto de uma casa ampla, de dois andares, com garagem e
espaço de sobra. O meme, na linguagem dos jovens, encapsula perfeitamente o que
mudou. O que antes era “pobreza” hoje está inalcançável para muitos.
A agenda econômica de Trump, até agora, foca
na imposição de tarifas sobre todas as importações para os Estados Unidos, na
redução de impostos corporativos e no abandono da busca por energia limpa ao
declarar uma “emergência energética nacional” para promover a perfuração de
petróleo doméstica. Difícil imaginar que a resposta para os empregos do futuro
esteja em soluções antiquadas como estas.
Resta, então, a dúvida: será que Trump
conseguirá responder às frustrações que o elegeram?
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