Folha de S. Paulo
Real se valoriza de modo impressionante;
situação econômica do Brasil não mudou
O
preço do dólar cai de modo impressionante nesta semana. Tentar entender as
andanças no câmbio já
é difícil para períodos, digamos, de um ano, que dirá de minúcias de três dias.
Muita vez, nem mesmo o Banco Central sabe com precisão o que se passa.
Há estranhezas no ar, inclusive nessas
explicações que, em cima do lance, gente falante de "o mercado" dá
para cada movimento horário do dólar.
Muito interessante, quase divertido, é saber
para onde foi a desconfiança na política fiscal, que em dezembro explicava boa
parte da desvalorização do real. Claro que a economia e o mercado brasileiros
são barquinhos no mar da finança mundial —vão na onda. Mesmo assim, parece
esquisito que o dólar no Brasil tenha perdido quase toda a gordura
que ganhou no Natal do pânico, em parte, em tese, por causa do pânico
fiscal.
De notável, também, há essa conversa
internacional de que Donald Trump pegaria
leve no aumento do imposto de importação ("tarifas"), pois não
decretou nada até agora e, quanto a ameaças, teria baixado o tom. Assim,
diminuiria o risco de que se implementasse uma política que poderia elevar a
inflação. É.
Pode ser que os povos dos mercados
internacionais acreditem nisso, por ora, o que tem consequências práticas.
No entanto, o governo Trump 2 tinha apenas
três dias e meio de duração enquanto se escreviam estas linhas. Trump prometeu
tomar atitudes a partir de fevereiro, quanto a Canadá e México; para outros
países, a partir de abril. Pode vir chumbo ainda. Não é tudo, porém.
Nos planos do trumpismo, há promessas de
cortes de impostos sem previsão de receita extra ou cortes de despesas. A
situação fiscal jamais foi tão ruim em 50 anos, fora nos anos da epidemia e
naqueles que se seguiram ao desastre financeiro que explodiu em 2008, momentos
em que o Fed dava
uma mãozona no financiamento do governo.
Do gasto primário americano, 56% vai para
Previdência e saúde; 24% para defesa e serviço social para veteranos (manter o
império e cuidar de seus soldados custa caro). Um corte vai doer; pode ser
difícil.
O problema fiscal já bate nas taxas de juros americanas.
De resto, a economia dos EUA deu sinais de que está forte ou se fortalecendo
desde o terço final de 2024, mesmo com a alta de juros do Fed.
Além de impostos de importação maiores,
também imigração menor, estímulo fiscal extra e economia talvez crescendo além
da conta poderiam fazer
com que o Fed até não cortasse a taxa de juros neste ano. Resta saber quão
fundo Trump irá nessas políticas inflacionárias.
No Brasil, não houve novidades de
perspectivas econômicas, fiscais e monetárias. De notório, há menos dinheiro
aplicado na hipótese de desvalorização extra do real, embora nem aí seja
possível ter clareza do que se passa.
As taxas de juros no atacadão do mercado de
dinheiro continuam nas alturas, o que encarece o custo de financiamento dos
enormes déficits e dívida do governo. A taxa de um ano ainda está perto de 10%
ao ano, em termos reais, nos níveis mais altos desde 2006, afora picos em 2009
e 2016.
Diz-se agora que a diferença de taxas de
juros entre Brasil e EUA ajuda a derrubar o dólar. Não raro, ajuda. Mas não era
o que se dizia na praça em dezembro e não houve mudança relevante na estimativa
de juros aqui e nos EUA.
Precisam inventar uma explicação melhor.
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