- O Globo
Retirada dos militares aumentará a resistência do país à reforma da Previdência. Um dos maiores defeitos do sistema brasileiro de aposentadorias e pensões é ser muito desigual. Ele sempre tratou diferentemente certos grupos. A reforma da Previdência se propôs a reduzir essas distâncias, mas quando protege as Forças Armadas, policiais militares e bombeiros está enfraquecendo o projeto. Esse é um ponto de desequilíbrio da reforma.
O secretário da Previdência, Marcelo Caetano, explica que a retirada das Forças Armadas, e agora dos policiais militares e bombeiros, da reforma foi uma decisão política. Mas que a ideia continua sendo a de reduzir diferenças de tratamento.
— Um dos grandes nortes da reforma é a harmonização dos tratamentos, é ter regras as mais parecidas possíveis entre os grupos e corporações diferentes. Estamos harmonizando regras entre servidores públicos e trabalhadores privados e acabando com alguns sistemas diferenciados como o de professores e policiais civis. Estamos com propostas de igualação, mas partindo de pontos distintos. Portanto, as regras de transição serão diferentes — diz o secretário.
Ele explica que os trabalhadores do setor privado terão seu benefício calculado de acordo com as novas regras. Além de terem um aumento do tempo exigido para se aposentar, as regras de cálculo do benefício serão alteradas pela reforma. Já no setor público, quem entrou antes de 2003 pode receber o último salário integral. Quem entrou depois da reforma de Lula, em 2003, recebe não o último salário, mas uma média dos salários:
— As minhas regras de transição de funcionário público são diferentes das de um trabalhador do setor privado. No futuro, haverá convergência. Depois, será tudo igual, mas estamos partindo de pontos distintos.
Numa entrevista que fiz com Marcelo Caetano na Globonews, perguntei por que o déficit deu um salto tão grande de um ano para o outro, saindo de R$ 86 bilhões para R$ 152 bilhões:
— Há uma questão estrutural na sociedade brasileira que é o envelhecimento da população, que está num ritmo muito rápido. Hoje, existem 11 idosos para cada 100 pessoas em idade ativa. Isso vai crescer e em 2060 teremos 44 idosos em cada 100 pessoas. Esse envelhecimento muito acentuado faz o déficit subir, mas grande parte do aumento recente se deve à recessão.
Não é um exagero a exigência de 49 anos de contribuição para que o trabalhador do setor privado tenha um benefício de 100% para o qual ele contribuiu? Marcelo Caetano acha que não. Explicou que a taxa de reposição — o que o trabalhador recebe na aposentadoria do salário que recebia — é alta no Brasil, em torno de 80%. Numa comparação do BID, é uma das maiores da América Latina. A conta foi feita na época do fator previdenciário, que de certa forma retorna agora. De acordo com o BID, a taxa sustentável no país deveria ser menos de 40%:
— Nós estamos mantendo a taxa de reposição em torno dos 80%, mas exigindo tempo maior de trabalho para as pessoas se aposentarem. No Brasil, os trabalhadores que ganham salário mínimo se aposentam e continuam ganhando o mesmo valor, portanto a reposição é de 100%. Nas outras faixas, há redução. Claro que a gente não vai propor o que o BID calcula que seja o ideal porque fica inviável para a vida das pessoas.
Caetano explica que as regras parecem duras, mas continuarão permitindo ao aposentado um provento num dos percentuais mais altos da América Latina.
Em relação às viúvas e viúvos jovens, abaixo de 44 anos, o governo Dilma já havia acabado com a pensão vitalícia. Tentou também um mecanismo de redução do valor muito parecido com o que foi adotado agora, mas o Congresso rejeitou.
A pior decisão foi excluir as Forças Armadas, que representam um déficit de R$ 32,5 bilhões, e agora os PMs e bombeiros.O Ministério da Defesa diz que o déficit é apenas R$ 13 bilhões porque só conta as pensões. Diz que militar não se aposenta, porque fica na reserva. Caetano acredita que haverá um projeto específico:
— A perspectiva do governo é encaminhar uma proposta posteriormente para as Forças Armadas. Está sendo discutido neste momento e eu participei de reuniões com militares, só não há um projeto formulado. Mas haverá. O tempo dirá.
Que o tempo diga que o governo teve a coragem de incluir também as Forças Armadas nesse esforço coletivo de equilibrar a Previdência.
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