Às
vésperas do Dia do Trabalho, há 40 anos, um show em comemoração à data havia
sido programado no Riocentro. No palco, grandes nomes da MPB. No
estacionamento, duas bombas dentro de um Puma. Um dos artefatos explodiu antes
da hora, vitimando dois militares (um deles fatalmente) e trazendo à luz a
faceta mais sombria do grupo que se insurgia ante o processo de abertura
política.
No
açodamento inicial das investigações, organizações clandestinas de esquerda
foram apontadas como suspeitas pelas autoridades encarregadas do caso. Faltou
esclarecer, no entanto, que tais organizações já haviam sido extintas quase uma
década antes. Precipitação semelhante àquela verbalizada pelo presidente
Figueiredo ao tomar conhecimento do episódio: “Finalmente os comunistas fizeram
uma bobagem”.
O
tempo, em pouco tempo, se encarregaria de revelar todo o desengano do
presidente.
Desmoralizada no estacionamento do centro de convenções, a linha-dura se recolheu. Rumou ao ostracismo e a negócios mais lucrativos e obscuros. A partir daquela data, os atentados deixaram de ocorrer, e o processo de abertura política pôde seguir seu caminho livre de embaraços. Desaguaria na Nova República e nos novos ares democráticos que o Brasil passou a vivenciar a partir de março de 1985.
O
episódio e suas investigações inconclusivas (até hoje não se chegou aos
culpados) evidenciam que as versões sobrevivem aos fatos. Infelizmente. A
“ameaça” comunista, àquela altura um verdadeiro tigre de papel, em realidade
servia apenas a interesses escusos — o principal deles seria prolongar
indefinidamente o regime militar.
Para
o bem do Brasil, não colou.
Transpostas
para os dias atuais, as supostas “ameaças” de grupos organizados que aspiram a
uma revolução socialista soam como devaneio até para os mais crédulos, mas
ainda despertam sinceras ambições. Ontem, como hoje, podem servir de pretexto
para a manutenção do poder. Amoldando-se à conveniência momentânea, tais
bravatas podem estar em todo lugar e, ao mesmo tempo, em lugar nenhum. Tudo
dependerá das circunstâncias em que o país chegará a outubro de 2022.
Impiedosamente
minado por uma pandemia que destroça a saúde do povo e castiga a economia, o
Brasil tem um porvir duvidoso. Garantidos mesmo, só os solavancos que
inevitavelmente ocorrerão. Se os 36 anos da nossa democracia serão suficientes
para aguentar a pressão que virá, só o futuro poderá dizer. Embora tenhamos
instituições vigilantes e democraticamente maduras, ainda é cedo para cravar
qualquer prognóstico.
O
certo é que o futuro é incerto. Dessa constatação, emerge a maior lição que é
possível extrair da longínqua noite de 30 de abril de 1981: há momentos em que,
embora os inimigos sejam imaginários, o perigo pode ser real. Aquela tenebrosa
noite ainda não terminou.
Pelo
menos para alguns.
*Advogado e autor de “Me esqueçam — Figueiredo: a biografia de uma presidência”
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