O Globo
Semestre perdido termina sem que articulação
política saiba como desarmar bombas no Congresso
Lula não tem sequer uma boa notícia para
comemorar no primeiro semestre de 2025. Não à toa, depois de algumas mudanças
ministeriais no início do ano para inaugurar o que seria a fase das “entregas”
do terceiro mandato, hoje a coisa mais difícil é achar um ministro disposto a
dar as caras para defender a administração, que vai levando um 7 a 1 por dia no
Congresso sem esboçar plano de reação.
As obras não apareceram, as viagens aos estados foram episódicas, sem nada de memorável — pelo contrário, numa recente ida a Pernambuco Lula chegou a dizer que Deus deixou o sertão sem água porque sabia que ele seria presidente e resolveria o problema —, e nem aquele apelo para que assuma pessoalmente a articulação política parece fazer sentido num momento de completo afastamento entre Executivo e Legislativo.
O presidente recebeu Hugo Motta
(Republicanos-PB) e seu antecessor Arthur Lira (PP-AL) sábado no Alvorada. Nada
aconteceu, e nesta segunda-feira o governo tomou uma derrota de lavada na
votação da urgência para a votação dos Projetos de Decreto Legislativo (PDLs)
para derrubar um já desidratado decreto de elevação do IOF.
De nada adianta a cantilena que lideranças
governistas tentam vender nas conversas em off segundo a qual a votação da
urgência não necessariamente significa que o mérito dos PDLs será aprovado. Só
quem nunca pisou no carpete verde da Câmara pode se convencer desse
blá-blá-blá.
As semanas de trégua que o governo terá,
graças aos santos juninos e a seus festejos de grande potencial eleitoral, só
seriam relevantes se os responsáveis pela suposta articulação política e a
equipe da Fazenda tivessem o que oferecer no lugar do IOF. Mas já ficou claro
que ninguém fala a mesma língua nesse capítulo.
Existe uma incompatibilidade fundamental
entre a composição da base aliada e o time escalado para ser seu interlocutor.
Enquanto os partidos do Centrão vão aumentando sua indisposição em relação à
agenda de Lula para o Brasil, os escalados para toureá-los são 100% petistas,
dos líderes na Câmara, no Congresso e no Senado aos ministros do Palácio do
Planalto.
O placar da votação da urgência dos PDLs
escancarou o que isso significa: menos de 100 votos é o que o núcleo petista da
articulação política comanda hoje. No Senado, o cálculo de lulistas desolados e
preocupados é que esse grupo fiel não chegue a 20 dos 81 senadores.
Se as nuvens carregadas sobre o arcabouço
fiscal não fossem suficientes para prenunciar um segundo semestre tão
complicado quanto o primeiro, Lula ainda recebeu de presente de Davi Alcolumbre
(União-AP) a leitura do requerimento de criação da CPI Mista do INSS.
Depois do tão esperado recesso, nada indica
que o trem volte aos trilhos, pois o Legislativo segue colocando lenha na
fogueira onde ardem a popularidade e a governabilidade do petista.
É nesse cenário de conflagração que o governo
precisará aprovar, até 30 de setembro, o projeto que amplia a isenção de
Imposto de Renda da Pessoa Física para quem ganha até R$ 5 mil, considerado a
cartada mais certeira de Lula para recuperar sua popularidade e,
consequentemente, sua dianteira nas pesquisas de intenção de voto para o ano
que vem. Esse é o prazo para que a mudança valha em 2026 — e, mesmo assim, será
uma perspectiva apenas para a declaração de IR de 2027, com efeitos nas urnas
ainda a ser medidos.
O clima na Esplanada oscila entre a apatia, a
desconfiança entre ministros e a admissão de que são poucas as armas
disponíveis para mudar essa clara disposição do Congresso de complicar a vida
do governo. Só liberar as emendas, agora, parece pouco diante de um quadro em
que deputados e senadores parecem não acreditar mais nas chances de reação do
presidente e de seu combalido exército.
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