Por Lilian Venturini e Ma Leri / Valor Econômico
Já um nome menos associado a Jair Bolsonaro, a depender do cenário, impõe mais dificuldades ao atual presidente
São Paulo - O lançamento da pré-candidatura
do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à Presidência da República deve ter como
efeito inicial um freio nas articulações de outros nomes da direita para 2026.
O processo, no entanto, pode acabar favorecendo a formação de quadros
independentes do bolsonarismo, avaliam cientistas políticos ouvidos pelo Valor. Há a leitura, ainda, de
que o cenário -- se confirmado -- seria mais vantajoso para o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), que deve tentar a reeleição.
"É um banho de água fria em alguns candidatos. Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo] dizia que não era candidato, mas se movia como se fosse. O anúncio significa um freio de mão nesse processo, paralisa. Vai levar alguns dias, se não semanas, para avaliar se é definitivo ou não, que jogo é esse, se tem negociação, o que está por trás. Empaca o ritmo da direita", afirma o cientista político Carlos Melo, professor do Insper.
Além de Tarcísio, colocam-se como
pré-candidatos os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União) e de Minas,
Romeu Zema (Novo). Estes dois últimos reafirmaram que são pré-candidatos à
Presidência após o PL confirmar o nome de Flávio na sexta-feira (5), reforçando
a aposta em uma estratégia de múltiplos nomes do campo político no primeiro
turno. O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), é cotado, mas não se
apresenta oficialmente como pré-candidato.
Melo é cauteloso ao comentar a reação de alas
de partidos do Centrão, como o União Brasil, que indicou ter preferência por um
nome que não represente a polarização com o PT. "Precisa ver se toda a
direita vai fazer esse raciocínio em relação aos votos de Bolsonaro. O
bolsonarismo tem um piso, um piso elevado, de 15% talvez 20% dos votos. Isso
não é pouca coisa. Se [a candidatura de Flávio] for definitiva, se for séria,
vai ser complicado."
Para Claudio Couto, cientista político e
professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a pré-candidatura de Flávio
representa uma tentativa da família de manter o controle sobre a direita ao
garantir que um “nome Bolsonaro” esteja na urna em 2026. No entanto, vê uma
situação paradoxal — ao tentar reafirmar sua hegemonia, a família Bolsonaro
pode acabar abrindo caminho para uma direita pós-Bolsonaro.
"Se candidaturas da direita saem agora,
competindo com essa candidatura do Flávio e dividem esse eleitorado, mesmo que
elas não ganhem a eleição, elas iniciam um processo de autonomização em relação
ao bolsonarismo e começam a criar um campo próprio, eles podem, por exemplo,
tentar criar lideranças próprias que atraiam para si o apoio social, o apoio de
determinados setores da economia e tudo mais, sem ficar na dependência da
benção que o bolsonarismo podia lhes dar", disse.
O cientista político e sócio da Hold
Assessoria Legislativa, André César, avalia que Flávio tem característica
pragmática, o que pode favorecer alianças. Mas lembra que ainda há margem para
mudanças nas negociações.
"Ele [Flávio] sendo pragmático, tem um
potencial de agregar mais gente em torno dele. Mas nada é definitivo, porque o
processo mesmo vai ser em abril, data-chave, quando os nomes dos potenciais
candidatos vão deixar seus cargos para se colocar", acrescenta.
Para o campo da esquerda, a primeira
avaliação é de vantagem para Lula. Carlos Melo, do Insper, acredita que o
antipetismo e o antibolsonarismo serão decisivos para definir os rumos das
candidaturas nas próximas eleições.
"Claro que para Lula ter um discurso
antibolsonarista com um candidato com sobrenome Bolsonaro é sempre muito mais
fácil para explorar essa força política chamada antibolsonarismo. Me parece uma
vantagem para Lula. Se [a candidatura de Flávio] for para valer, o PT vai
comemorar", afirma.
Já um nome menos associado a Jair Bolsonaro,
a depender do cenário, impõe mais dificuldades ao atual presidente. "Ainda
que tivesse o apoio do bolsonarismo, seria alguém que poderia dizer que não é
bolsonarista, que não é radical, ou que é um 'bolsonarista moderado' – embora
isso pareça uma contradição em termos, e de fato é – o candidato ao menos teria
esse discurso. Com Bolsonaro no nome não tem como dizer que é bolsonarista, mas
não muito", afirma.
O professor lembra que no início do ano o
cenário era desfavorável para Lula, com o antipetismo mais aflorado. O
sentimento, no entanto, perdeu força no decorrer do segundo semestre em
consequência do que ele chama de "erros" do bolsonarismo, entre eles
a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos, que
contribuiu para o tarifaço a produtos brasileiros.
A reação do mercado financeiro na
sexta-feira, com alta do dólar e queda do Ibovespa, reforça, segundo Melo, a
percepção desse grupo, mais associado ao antipetismo, de que um nome menos
ligado a Bolsonaro talvez fosse melhor para enfrentar o PT e Lula nas urnas.
"O mercado colocou na cabeça que Tarcísio de Freitas é um candidato
imbatível. Quando vê esse projeto Tarcísio ser fragilizado mais uma vez pelo
fortalecimento dessa hipótese chamada Flávio Bolsonaro, o mercado recua e
joga."

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