domingo, 7 de dezembro de 2025

Anúncio de candidatura de Flávio freia outros nomes da direita e deve beneficiar Lula, dizem analistas

Por Lilian Venturini e Ma Leri / Valor Econômico

Já um nome menos associado a Jair Bolsonaro, a depender do cenário, impõe mais dificuldades ao atual presidente

São Paulo - O lançamento da pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à Presidência da República deve ter como efeito inicial um freio nas articulações de outros nomes da direita para 2026. O processo, no entanto, pode acabar favorecendo a formação de quadros independentes do bolsonarismo, avaliam cientistas políticos ouvidos pelo Valor. Há a leitura, ainda, de que o cenário -- se confirmado -- seria mais vantajoso para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve tentar a reeleição.

"É um banho de água fria em alguns candidatos. Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo] dizia que não era candidato, mas se movia como se fosse. O anúncio significa um freio de mão nesse processo, paralisa. Vai levar alguns dias, se não semanas, para avaliar se é definitivo ou não, que jogo é esse, se tem negociação, o que está por trás. Empaca o ritmo da direita", afirma o cientista político Carlos Melo, professor do Insper.

Além de Tarcísio, colocam-se como pré-candidatos os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União) e de Minas, Romeu Zema (Novo). Estes dois últimos reafirmaram que são pré-candidatos à Presidência após o PL confirmar o nome de Flávio na sexta-feira (5), reforçando a aposta em uma estratégia de múltiplos nomes do campo político no primeiro turno. O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), é cotado, mas não se apresenta oficialmente como pré-candidato.

Melo é cauteloso ao comentar a reação de alas de partidos do Centrão, como o União Brasil, que indicou ter preferência por um nome que não represente a polarização com o PT. "Precisa ver se toda a direita vai fazer esse raciocínio em relação aos votos de Bolsonaro. O bolsonarismo tem um piso, um piso elevado, de 15% talvez 20% dos votos. Isso não é pouca coisa. Se [a candidatura de Flávio] for definitiva, se for séria, vai ser complicado."

Para Claudio Couto, cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a pré-candidatura de Flávio representa uma tentativa da família de manter o controle sobre a direita ao garantir que um “nome Bolsonaro” esteja na urna em 2026. No entanto, vê uma situação paradoxal — ao tentar reafirmar sua hegemonia, a família Bolsonaro pode acabar abrindo caminho para uma direita pós-Bolsonaro.

"Se candidaturas da direita saem agora, competindo com essa candidatura do Flávio e dividem esse eleitorado, mesmo que elas não ganhem a eleição, elas iniciam um processo de autonomização em relação ao bolsonarismo e começam a criar um campo próprio, eles podem, por exemplo, tentar criar lideranças próprias que atraiam para si o apoio social, o apoio de determinados setores da economia e tudo mais, sem ficar na dependência da benção que o bolsonarismo podia lhes dar", disse.

O cientista político e sócio da Hold Assessoria Legislativa, André César, avalia que Flávio tem característica pragmática, o que pode favorecer alianças. Mas lembra que ainda há margem para mudanças nas negociações.

"Ele [Flávio] sendo pragmático, tem um potencial de agregar mais gente em torno dele. Mas nada é definitivo, porque o processo mesmo vai ser em abril, data-chave, quando os nomes dos potenciais candidatos vão deixar seus cargos para se colocar", acrescenta.

Para o campo da esquerda, a primeira avaliação é de vantagem para Lula. Carlos Melo, do Insper, acredita que o antipetismo e o antibolsonarismo serão decisivos para definir os rumos das candidaturas nas próximas eleições.

"Claro que para Lula ter um discurso antibolsonarista com um candidato com sobrenome Bolsonaro é sempre muito mais fácil para explorar essa força política chamada antibolsonarismo. Me parece uma vantagem para Lula. Se [a candidatura de Flávio] for para valer, o PT vai comemorar", afirma.

Já um nome menos associado a Jair Bolsonaro, a depender do cenário, impõe mais dificuldades ao atual presidente. "Ainda que tivesse o apoio do bolsonarismo, seria alguém que poderia dizer que não é bolsonarista, que não é radical, ou que é um 'bolsonarista moderado' – embora isso pareça uma contradição em termos, e de fato é – o candidato ao menos teria esse discurso. Com Bolsonaro no nome não tem como dizer que é bolsonarista, mas não muito", afirma.

O professor lembra que no início do ano o cenário era desfavorável para Lula, com o antipetismo mais aflorado. O sentimento, no entanto, perdeu força no decorrer do segundo semestre em consequência do que ele chama de "erros" do bolsonarismo, entre eles a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos, que contribuiu para o tarifaço a produtos brasileiros.

A reação do mercado financeiro na sexta-feira, com alta do dólar e queda do Ibovespa, reforça, segundo Melo, a percepção desse grupo, mais associado ao antipetismo, de que um nome menos ligado a Bolsonaro talvez fosse melhor para enfrentar o PT e Lula nas urnas. "O mercado colocou na cabeça que Tarcísio de Freitas é um candidato imbatível. Quando vê esse projeto Tarcísio ser fragilizado mais uma vez pelo fortalecimento dessa hipótese chamada Flávio Bolsonaro, o mercado recua e joga."

 

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