O Globo
PT terá mais dificuldade em operar sem o
combustível emocional do bolsonarismo, mas, para suprir essa lacuna, há os
ricos
Para surpresa de ninguém, Lula anunciou que
será candidato a seu quarto mandato presidencial — fez isso a exatos 12 meses
da eleição e num momento em que as pesquisas lhe são favoráveis. Segundo os
últimos levantamentos, o petista não apenas continua liderando as intenções de
voto em todos os cenários, no primeiro e no segundo turno, como ampliou sua
vantagem em relação aos potenciais adversários. Conseguirá Lula manter a
vantagem até outubro do ano que vem?
No estrito âmbito das pesquisas eleitorais, tem-se a favor dele que dá a largada, senão bem posicionado, ao menos na melhor colocação obtida neste ano, podendo ainda melhorar. Todos os presidentes brasileiros que tentaram a reeleição, incluindo o derrotado Jair Bolsonaro, aumentaram sua popularidade durante a campanha.
O nome disso é uso da máquina de governo,
recurso de que agora Lula poderá fazer máximo uso graças ao pacote de projetos
aprovados ou em via de ser aprovados pelo Congresso, incluindo ampliação da
isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês, distribuição
gratuita de gás de cozinha, isenção na conta de luz para 17 milhões de famílias
e pagamento de bolsas a estudantes do ensino médio. Trata-se de um formidável
enxoval eleitoral, desenhado sob medida pelo governo para agradar ao eleitorado
da classe C, morador das periferias das grandes cidades, segmento que
pesquisadores apontam como definidor do resultado da eleição de 2026.
Pesam, porém, contra Lula, vários e
relevantes fatores. O primeiro é a sua — ainda alta — reprovação apontada pelas
mesmas pesquisas. O segundo é o histórico e elevado índice de abstenção que
recai sobre seu eleitorado mais pobre (61% para quem ganha até dois salários
mínimos), que se torna tão mais relevante quanto mais apertada se projeta uma
eleição, caso desta. Pesquisadores preveem que ficará em torno de 3 pontos
percentuais a diferença de votos entre o vencedor e o derrotado no pleito do
ano que vem.
Mas, acima de tudo, pesa contra Lula a
ausência de Jair Bolsonaro. Por deméritos próprios, o ex-presidente foi para
Lula em 2022 um adversário sem igual — candidato que mobilizou rejeição e medo
em tal proporção que, a quatro dias do segundo turno, pesquisa do instituto
Quaest mostrava que quase metade (46%) dos eleitores de Lula dizia votar nele
não porque achasse que merecia, mas porque queria “tirar Bolsonaro” do poder
(verdade que o mesmo se deu do outro lado, com 48% dos bolsonaristas dizendo
que votariam no então presidente para evitar “a volta do PT”).
Agora, com qualquer outro nome no páreo que não um Bolsonaro, essa gorda
porcentagem de votos reativos dificilmente cairá no colo de Lula outra vez.
Ele já percebeu a falta que Bolsonaro lhe
fará — e ensaia, como novo argumento de campanha, uma versão do “nós contra
eles”, em que a direita antidemocrática é substituída pelos “ricos que não
querem pagar impostos”. A escolha de Guilherme
Boulos para ministro da Secretaria-Geral da Presidência reforça essa
ideia. A missão do deputado do PSOL será,
segundo ele próprio, percorrer o país para defender um governo “que se colocou
muito firmemente na defesa do povo contra os bilionários e na defesa do Brasil
contra o ataque estrangeiro”. Ex-líder do movimento dos sem-teto e organizador
dos recentes protestos contra o PL da Anistia e a PEC da Blindagem, Boulos terá
ainda a tarefa de “mobilizar as ruas” em 2026. Em outras palavras: encher
avenidas, produzir bonitas imagens do povo — o “nós” materializado — e, com
isso, reacender a polarização que Lula dizia querer superar quando, candidato
em 2022, prometia “unir o país”.
O PT terá mais dificuldade em operar sem o
combustível emocional do bolsonarismo, mas, para suprir essa lacuna, existem os
ricos — e também os Estados Unidos,
o Congresso de um “baixo nível” como nunca se viu e as elites de forma geral.
Mudam os inimigos do povo, Lula permanece o mesmo.

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