CartaCapital
Estamos diante de um novo ataque
“democrático” aos países da América Latina, tal como o perpetrado nos anos 70
Trump exercita, sem peio, o propósito
de constranger (invadir?) a Venezuela de Nicolás Maduro e a Colômbia
de Gustavo Petro. O pretexto arguido para a prática dessa fancaria é combater o
tráfico de drogas. Barcos foram bombardeados, acusados de transportar drogas
para os Estados Unidos. Nessa empreitada, pereceram muitos cidadãos dos países
condenados pelos tribunais da “democracia” norte-americana.
Estamos diante de um novo ataque “democrático” aos países da América Latina, tal como o perpetrado pela Operação Condor em meados dos anos 70. Diga-se que o Brasil foi pioneiro, ao embarcar nas naves da repressão e da tortura em 1964, também sob o patrocínio da CIA, que, ainda nos anos 70, iria mobilizar militares chilenos, argentinos e uruguaios para promover aventuras golpistas.
No Chile, despontou o general Augusto
Pinochet, o mais bárbaro dentre os ditadores da safra produzida pelos
“salvadores de democracias” que se espalhavam pelo mundo afora na época da
Guerra Fria. Em 1976, a Argentina recebeu os préstimos do truculento Jorge
Rafael Videla.
Nas décadas de 60 e 70, os rapazes da CIA
peregrinavam por aqui, ensinando às forças de segurança e de ocupação da
Latino-América a sequestrar, torturar e matar as lideranças populares e os
opositores dos regimes militares. Todo cidadão medianamente informado sabia e
sabe que os fardados foram instalados no poder no Brasil, na Argentina, no
Chile, no Uruguai etc. mediante a ação conjunta das direitas
latino-americanas – sempre antinacionais e antipopulares – e dos “democratas”
do Departamento de Estado e da CIA.
Esses poderes norte-americanos disseminavam à
força a doutrina, um tanto paradoxal, da necessidade das ditaduras como atalhos
para a democracia. As ditaduras espalharam-se pelo subcontinente em meio ao
entusiasmo e ao júbilo dos bacanas da região.
O resultado dessa truculência é de
conhecimento geral: desastres econômicos e sociais de enormes proporções, que
nos largaram na rabeira da tão ansiada e celebrada modernidade. Ainda hoje,
depois do fracasso retumbante das ditaduras e dos ditadores latino-americanos,
não escasseiam os entusiastas dos métodos e das práticas do “pega, esfola e
mata”. Não bastasse isso, os próceres civis e militares dos regimes
autoritários – que aderiram com o mesmo fervor patriótico às “novas
democracias” – ditavam regras e jogavam de mão nos Parlamentos, nos quartéis,
nos ministérios e nos meios de comunicação.
Os meios de comunicação, diga-se, foram
pródigos em celebrar os crimes e as barbaridades cometidos em nome da liberdade
e da civilização ocidental e cristã. Não faltaram os épicos da mídia, exaltando
a coragem e a bravura dos totalitários que se lançaram ao combate pela
supressão dos princípios do aclamado liberalismo.
As gerações mais novas, as que foram poupadas
das misérias daqueles tempos, devem ficar imaginando o quanto vale uma imprensa
livre e independente. Mas não podem imaginar a ânsia de vômito que acomete os
mais velhos, quando são obrigados a ler ou a assistir a tais espetáculos de
elevado cinismo midiático.
Saiba, meu caro jovem, que os grandes
senhores da mídia e da informação, os que hoje se apresentam como baluartes dos
direitos e da democracia, foram cúmplices e beneficiários dos regimes de
exceção. Foi nessa época que constituíram os seus impérios de
comunicação. Na base do “é dando que se recebe”, passaram a prestar
serviços aos governantes de turno, enquanto cavavam subsídios e incentivos,
além de outros favores não especificados em lei.
As ditaduras latino-americanas naufragaram
nas águas de sua própria incompetência. Nos anos 80, a crise da dívida externa
machucou gravemente as economias da região que buscaram abastecimento no
crédito em dólar. As crises se multiplicaram nas hoje chamadas economias
emergentes. Do México à Argentina, sem esquecer o Brasil, as economias
balançaram, açoitadas por desvalorizações cambiais dolorosas e crises fiscais e
financeiras.
Confrontados com os resultados de suas
imprudências, os “donos do pedaço” foram incapazes de um gesto de penitência,
ainda que inspirado na moral dos fariseus. Pior, olham o passado como juízes do
tribunal da história. Mas é inútil protestar: afinal, eles se consideram os Donos
do Poder. Decidem quem tem o poder de julgar e quem deve sentar-se nos bancos
dos réus.
Publicado na edição n° 1385 de CartaCapital, em 29 de outubro de 2025.

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