O Povo (CE)
Como reunir, no mesmo
caldo, uma liderança com identidade histórica de centro-esquerda e a fina flor
do radicalismo conservador?
Ciro Gomes subiu ao
palanque nesta semana para o anúncio de seu retorno ao PSDB. Chegou de braço
dado com o velho amigo Tasso
Jereissati, de quem andou afastado por questões eleitorais, mas
cujo abraço não constrange. É um político moderado, respeitado pela classe política
como um todo, com história reconhecida de trabalho pelo desenvolvimento do
Ceará.
A alegria que mostra com Tasso não é vista quando precisa se deixar fotografar com os novos aliados, com quem terá de acertar a mais difícil aliança política que a cena local viu nas últimas décadas. Como reunir, no mesmo caldo, uma liderança com identidade histórica de centro-esquerda e a fina flor do radicalismo conservador? Até onde é possível ir em troca de votos? 2026 vai nos dizer.
É uma aliança envergonhada, necessária,
visivelmente incômoda para ciristas e bolsonaristas. A contradição, quando é
despudoradamente aparente, é muito difícil de justificar, mesmo para os
admiradores cheios de boa vontade com um político de língua grande, bravateiro,
dado a hipérboles, arroubos e gafes. Mesmo o pragmatismo eleitoral requer um
certo verniz de coerência.
Para Ciro Gomes e Roberto Cláudio, foi um movimento de sobrevivência,
de tentativa de preservação de alguma relevância depois do erro estratégico que
fez eclodir, no último pleito, as pontes entre PDT e PT no Ceará. Avaliaram que
a única saída seria aninhar-se na oposição bolsonarista, dando por inevitável a
polarização e considerando impossível qualquer vitória fora do eixo de
influência de Lula e Bolsonaro.
Eu me pergunto se essa seria,
necessariamente, a única via possível para Ciro Gomes e Roberto Cláudio, considerando a
singularidade da conjuntura política depois da condenação de Jair Bolsonaro. A direita
nunca esteve tão enredada nos efeitos de seu próprio sucesso e vive um dilema
interno difícil, que a fragiliza eleitoralmente. Não seria uma janela de
oportunidade para que uma centro-direita mais fresca, jovem e midiática pudesse
tomar os corações dos cearenses simpáticos a Ciro?
Mesmo o nome de Roberto Cláudio não renderia
uma candidatura desprezível, porque, além do recall, não há, do lado dos
bolsonaristas, um nome com musculatura para disputar uma eleição majoritária
com capacidade de cooptação de um eleitor de centro antipático ao PT e reativo
a Bolsonaro. Mais do que isso, a batalha interna ao campo bolsonarista por
protagonismo já vem rendendo embates fratricidas. Seria uma chance, quem sabe,
para um nome que superasse o radicalismo.
O que temos é uma aliança inexplicável entre
aliados visceralmente incompatíveis. Vejamos se o desejo de poder que os irmana
será suficiente para reuni-los em torno de uma campanha competente e viável no
próximo ano.

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