Na semana passada o governo divulgou medidas visando ao aumento da competitividade da economia brasileira e ao estímulo à produção industrial. Uma economia estável e em crescimento, combinada com o excesso de liquidez no mercado financeiro internacional e instabilidades nas economias industrializadas, resultou num real valorizado. O País terá de aprender a conviver com essa moeda forte. Terá, também, de conviver num ambiente de incertezas, sem perspectiva de construção de acordo ou consenso que restabeleça a estabilidade na relação entre as moedas dos diversos países. Ou seja, conviver com o risco de ampliação do protecionismo mundo afora. Nesse contexto, está correto o governo em buscar proteger a economia e, em particular, a indústria, principalmente visando a aumentar a competitividade no médio e no longo prazos.
No conjunto de medidas, uma, já tomada anteriormente e ampliada agora, é a desoneração parcial da folha de pagamento, aparentemente bem recebida por empresários e economistas. Vale a pena avaliar a sua eficácia.
Sobre a folha de salários incidem encargos que podem ser divididos em três grupos: 1) diferentes componentes da remuneração direta do trabalhador, como 13.º salário, adicional de férias e FGTS; 2) contribuição patronal para a Previdência Social; e 3) outros encargos não relacionados diretamente à atividade do trabalhador, como contribuições para o sistema S, o Sebrae, o Incra, salário educação e seguro contra acidentes de trabalho. O primeiro grupo, por se constituir em salário propriamente dito e ter proteção constitucional, não está sujeito à eliminação. A medida proposta se refere à desoneração dos 20% relativos à contribuição patronal para a Previdência. Parte da arrecadação será mantida por uma contribuição de 1% ou 2% sobre o faturamento, conforme o setor de atividade. O governo estimou uma redução de cerca de R$ 7,2 bilhões/ano na receita da Previdência Social.
Aqui começam os problemas. De um lado, beneficiam-se alguns setores da economia, tornando desiguais as relações de custos intersetoriais. De outro lado, cria-se um subsídio para os setores escolhidos que resultará em aumento no déficit da Previdência Social. A sociedade vai pagá-lo com outros impostos ou com o aumento da dívida pública, a menos que seja indicado o corte de gastos correspondente à desoneração tributária.
Ademais, o impacto de redução do custo é relativamente pequeno, provavelmente entre 1,5% e 2% da carga tributária decorrente da contribuição patronal. Não chega a compensar o impacto da elevação dos custos de mão de obra (labor unity) resultante dos aumentos reais de salários nos acordos coletivos de 2011, que em média atingem 3% a 4%. Pode-se dizer, ainda, que essa redução não compensará também a soma dos custos de outras medidas que têm sido tomadas, como, por exemplo, o pagamento proporcional do FGTS por anos trabalhados e súmulas do TST que oneram o custo da mão de obra. Enfim, a medida é ineficaz, do ponto de vista da redução dos custos de produção, e injusta, do ponto de vista tributário.
Para reduzir o custo de mão de obra, seria mais eficaz excluir os encargos que não estão diretamente relacionados com a atividade do trabalhador e que representam 7,5% da folha salarial e eliminar ou reduzir significativamente os custos de demissão, como a multa rescisória.
A transferência da contribuição patronal à Previdência Social da folha de salário para o faturamento é medida que não resulta em redução relevante nos custos de produção. Poderia ter maior impacto sobre a formalização do emprego, se aplicada às micro e pequenas empresas. Sua eficácia não resistirá ao primeiro teste.
De fato, as questões que afetam a competitividade internacional da economia brasileira não são novas nem transitórias. Enfrentá-las requer a retomada da agenda de reformas como a tributária e a trabalhista. Não será com medidas pontuais e ineficazes que a indústria do Brasil vai ampliar sua competitividade.
Professor da Fundação Dom Cabral, foi ministro do Trabalho, do Planejamento, orçamento do governo FHC
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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