Madame du Barry, a namorada de Luís 15, tornou-se um exemplo da cegueira dos poderosos. Cheia de dinheiro e joias, vivia em seu castelo quando começou a Revolução Francesa. Foi várias vezes a Londres e sempre retornou a Paris. Em 1793 ela foi presa e passada na lâmina. A madame sabia o que estava acontecendo, até porque um dia deixaram a cabeça de seu novo namorado na janela de sua casa. Perdera a capacidade de entender seu país.
Só a síndrome da Madame Du Barry pode explicar que o comissário José Dirceu tenha resolvido passar num resort de endinheirados o dia (útil) da sessão do Supremo que o mandou dormir na cadeia. Se ele acreditava que ninguém saberia e que celulares não fazem vídeos, a Du Barry também achava que tinha amigos na nova ordem.
A alma da bela senhora influencia outros comissários. O PT paulista quer pacificar a ofensiva contra a máfia de fiscais de renda que mordiam empresários. O governador de Brasília, Agnelo Queiroz, quer contratar por R$ 1,4 milhão anuais um serviço de jatinhos que lhe permita fazer até mesmo voos internacionais. A repórter Patrícia Campos Mello revelou que Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, defendeu nos Estados Unidos a negociação de um acordo de livre-comércio com os Estados Unidos. Direito dele, mas poderia ter levantado o assunto em Pindorama, pois um acordo desse tipo provocaria uma mudança radical na economia do país. Um dos triunfos da diplomacia de Lula foi o enterro da proposta americana de criação da Alca. Semelhante iniciativa, vinda do presidente da CNI, recebeu uma resposta burocrática do Ministério do Desenvolvimento: "O governo está focado na troca de ofertas com os europeus para um futuro acordo de livre comércio Mercosul-União Europeia". É pouco, até porque se a CNI quer um acordo de livre-comércio com os americanos, o ministério teria a obrigação de rediscutir o foco. Quando o doutor Robson Andrade presidia a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, concedeu ao comissário Fernando Pimentel, atual ministro do Desenvolvimento, uma Bolsa Consultoria de R$ 1 milhão por nove meses de serviço.
Viva o Brasil
Jango voltou a Brasília na última quinta-feira e foi recebido com uma salva de 21 tiros de canhão. Trapaça da História: foram disparados mais tiros de armas pesadas nessa cerimônia do que nas 48 horas do levante militar que o depôs, em 1964.
João Goulart asilou-se no Uruguai voando num teco-teco, voltou a Brasília num Hércules da FAB e desceu nos ombros de dez soldados. Enquanto viveu, seria preso se pusesse os pés no seu país. Durante muitos anos, nem passaporte teve.
Foi uma cerimônia oficial, com banda e cornetas, nada a ver com o dia de 1976, quando 400 mil pessoas levaram o caixão de Juscelino Kubitschek pelas avenidas do Rio e de Brasília cantando a modinha "Peixe Vivo". Essa foi a primeira manifestação popular desde que a ditadura baixou a noite do AI-5, em dezembro de 1968. JK teve direito a luto oficial, Jango, nem isso.
Nessa hora, alguém pode olhar para o céu e lembrar a figura da escritora gaúcha Mila Cauduro, morta em 2011, aos 95 anos.
A ditadura exigiu que o cortejo fúnebre de Jango viajasse até São Borja sem parar na estrada, pois queria evitar a repetição das cenas ocorridas meses antes com JK. Mila saiu de Porto Alegre levando uma faixa branca, na qual estava escrita, em letras vermelhas, a palavra "Anistia". No velório, com a ajuda da filha de Jango e a concordância da viúva Maria Thereza, colocou-a sobre o caixão. No dia seguinte, pela primeira vez, a palavra maldita estava na primeira página dos jornais.
Militava no comitê gaúcho pela anistia uma jovem que saíra da cadeia em 1972. Chamava-se Dilma Rousseff.
O futuro de Barbosa
Na sessão de quarta-feira do STF Joaquim Barbosa disse que até dezembro haverá um pedido de aposentadoria de ministro da corte. Pelo calendário, não haveria. O decano Celso de Mello só completará 70 anos em novembro de 2015. Se Barbosa se referia à própria aposentadoria precoce, o calendário eleitoral informa que até abril ele poderá decidir se entra na disputa da eleição presidencial, pois os juízes têm um prazo especial para desincompatibilizações. Se não disputar o Planalto, estará preso à lei que exige um ano de domicílio eleitoral no Estado onde pretende disputar um cargo. Como seu domicílio está no Rio, só poderá concorrer no Rio. Joaquim Barbosa disputando o Palácio Guanabara ou uma cadeira de senador animaria a campanha do Estado.
Mistério
Há alguns meses, quando havia uma vaga no STF, um conhecido advogado recebeu uma inesperada visita de um amigo. Ele lhe perguntou qual seria seu voto no embargo relacionado com a formação de quadrilha dos réus do mensalão. Ouvindo que o advogado mandaria todos para a cadeia, em regime fechado, o amigo retornou a Brasília. O sujeito oculto da pergunta era o comissário José Dirceu. Se essa conversa foi a única, ou se o amigo tinha alguma credencial, não se sabe.
Aviso amigo
O repórter Diego Escosteguy denunciou um nicho de propinas montado entre a empresa que presta assessoria de imprensa ao ministro Guido Mantega e alguns de seus colaboradores. Não existe ministro, governador ou prefeito bobo. Eles sabem quando usam dinheiro da Viúva em gambiarras injustificáveis.
A bruxa Warren assusta Wall Street
Um ano depois de ter chegado ao Senado americano, Elizabeth Warren confirma os piores receios da banca. Ela surge como possível candidata à Presidência dos Estados Unidos. Tem 63 anos, foi professora de Harvard e conhece o avesso do andar de cima. O companheiro Obama nomeou-a para dirigir a Agência de Proteção Financeira do Consumidor e, em seguida, desidratou-a. É uma crítica feroz dos privilégios de Wall Street e da mitologia dos milionários: "Neste país ninguém ficou rico à sua custa -ninguém. Você transporta seus produtos em estradas que nós pagamos; você contrata pessoas que foram educadas pelo sistema público, sua fábrica está segura porque nós pagamos a polícia e os bombeiros. (...) Nosso contrato social pressupõe que você receba uma parte dos benefícios e pague para que um garoto seja beneficiado por ele".
Warren surge como uma adversária da máquina de Hillary Clinton, impulsionada pelo êxito de Bill de Blasio, um candidato que saiu do nada e arrastou a Prefeitura de Nova York. Ambos são chamados de populistas. No vocabulário político americano essa palavra não tem a carga demófoba que adquiriu no Brasil. Theodore Roosevelt foi um presidente populista, com muita honra.
As chances de Elizabeth Warren são poucas, como eram as de Obama quando foi para o Senado, em 2005. Mesmo assim, começaram a influenciar a campanha.
Fonte: O Globo
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