sábado, 27 de agosto de 2022

Hélio Schwartsman - Darwinismo vacinal

Folha de S. Paulo

Por que as escolas não conseguem ensinar o beabá do pensamento crítico?

Darwinismo social é o nome que se dá a um conjunto de teses que procuravam legitimar diferenças raciais e de classe. Evocando a noção de "sobrevivência dos mais aptos", ideólogos como Herbert Spencer e Francis Galton sugeriam que os mais ricos e mais poderosos estavam nessa posição porque eram inerentemente superiores. Baseado mais numa falácia (a do apelo à natureza) do que na leitura rigorosa dos textos do naturalista inglês, o darwinismo social teve seu apogeu no final do século 19 e início do 20, caindo em opróbrio após a 2ª Guerra Mundial.

Se ainda fosse necessário buscar dados empíricos para desmentir o darwinismo social, a pesquisa do Sou Ciência (Centro de Estudos Sociedade, Universidade e Ciência), da Unifesp, sobre a vacinação contra Covid no Brasil funcionaria como prova irrefutável. A sondagem mostrou que foram justamente os mais ricos e os mais instruídos, supostamente os mais "aptos", os que menos se imunizaram.

Dos que têm renda superior a seis salários mínimos, 59% tomaram duas ou mais doses da vacina, contra 86% dos que ganham até um salário mínimo. Já a proporção de imunizados entre os detentores de diploma universitário é de 68%, contra 89% entre os que só têm ensino fundamental.

O mais provável é que considerações políticas tenham afetado a decisão dos mais ricos e instruídos sobre vacinar-se. Esse grupo também é mais bolsonarista, e os bolsonaristas se imunizaram menos.
Sempre insisti aqui que é um mito a ideia de que mais educação e mais informação fazem com que as pessoas votem melhor. Mas confesso que esperava que, passando do registro do voto para o da sobrevivência, a análise racional de evidências, que pode ser ensinada nas escolas, prevalecesse sobre os aspectos emocionais que afetam o posicionamento político. Aparentemente, não é o que ocorre.

É o caso de descobrir por que as escolas não conseguem ensinar o beabá do pensamento crítico.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Posição política vem mais do caráter da pessoa que de sua formação intelectual.