O governo federal admitiu não ter condições de garantir a segurança de todos os líderes indígenas, quilombolas, sem-terra e ambientalistas que correm risco de vida no país. Nem os 30 nomes considerados mais vulneráveis pela Comissão Pastoral da Terra têm garantia de proteção. A ministra dos direitos Humanos, Maria do Rosário, afirmou: “Seria errôneo e uma ilusão dizer que temos condições para atender a esta lista. Vamos fazer uma avaliação.” A Pastoral entregou ao governo uma lista com 207 nomes que, entre 2000 e 2011, sofreram mais de uma ameaça – 42 foram assassinados. Restam 165. Uma semana após a execução de ambientalistas no Pará, o clima na região é de medo. Sem proteção, parte dos moradores abandonou suas casas.
Um governo de cobertor curto
IMPASSE NO CAMPO
Ministra admite que não consegue proteger nem 30 dos 165 ameaçados de morte
Evandro Éboli
Na semana seguinte a quatro assassinatos de ativistas na Amazônia, o governo reconheceu, ontem, não ter instrumentos e condições para garantir a segurança de todos os líderes que correm risco de serem assassinados no campo e que constam da lista de ameaçados feita pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, afirmou ser necessário fazer uma triagem na relação da entidade e escolher quais são os prioritários entre os mais ameaçados.
- Seria errôneo e uma ilusão dizer que temos condições para atender a esta lista. Vamos analisar a listagem da CPT e fazer uma avaliação. Vamos buscar os casos mais graves, sobre os quais nos debruçaremos - disse Maria do Rosário, após encontro com líderes da CPT em seu gabinete.
Anteontem, porém, em reunião do presidente da República interino, Michel Temer, com ministros da área, o governo anunciara que daria prioridade máxima à proteção de pessoas marcadas para morrer.
A CPT entregou ao governo uma lista com 207 nomes de líderes rurais, indígenas, quilombolas, sem-terra e ambientalistas que, entre 2000 e 2011, sofreram mais de uma ameaça ou foram vítimas de tentativas de assassinato. Mas, desse total, 42 foram assassinados. Dos 165 ameaçados ainda vivos, a CPT destacou 30 líderes, cujos casos são considerados mais vulneráveis.
A ministra não garantiu quantos dos relacionados poderão contar com a proteção do governo. Essa análise ainda será feita e não há data prevista para encerrar esse trabalho. Questionada após admitir que o governo não assegura a proteção da totalidade dos ameaçados, a ministra tentou se justificar.
- O que quero dizer é que é errôneo garantir escolta para os 1.850 (número total da lista da CPT). Não poderia prometer ao Brasil oito ou nove policiais para cada um desses ameaçados. Mas nunca houve uma articulação desse nível.
Rainha entre os que podem ter proteção
Na relação dos 30 camponeses mais ameaçados da CPT estão os nomes de dois líderes expressivos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST): José Rainha, em São Paulo, e Jaime Amorim, em Recife. Entre os ameaçados também estão religiosos e agentes da Pastoral.
O secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que participou da reunião, afirmou que a garantia da segurança a esses camponeses necessariamente não se dá com a escolta policial, mas pode ser feita com outro tipo de ação.
- O propósito não é só punir os homicídios, mas também as ameaças. Faremos uma análise mais detalhada da relação e destacar quais casos necessitam da vigilância presencial, se a ameaça de fato é consistente ou não, se o ameaçado está no centro do conflito. É preciso levar em conta fatores pessoais e circunstanciais - disse Luiz Paulo Barreto.
Os dirigentes da CPT participaram da entrevista coletiva e, em algumas vezes, Maria do Rosário demonstrou irritação com suas declarações, em especial com as cobranças que faziam ao governo. Um desses momentos se deu quando José Batista Afonso, advogado da CPT em Marabá (PA), afirmou que, entre as causas das quatro mortes de líderes na semana passada estão a discussão e a aprovação do Código Florestal, no Congresso Nacional. A ministra reagiu na hora, interrompendo a fala de Batista.
-- Não é esse o entendimento do governo. Podemos divergir - disse Maria do Rosário.
Batista ainda foi cortado pela ministra quando dizia que proteção aos ameaçados não resolve o problema e que é necessário haver políticas públicas efetivas, segundo ele, como priorizar a reforma agrária. Ao afirmar que, no Pará, dos 20 defensores dos direitos humanos ameaçados, apenas seis são protegidos, Rosário reagiu novamente:
- E o Pará é o que tem o maior número de protegidos. O Brasil é o único país do mundo com programa de proteção aos defensores dos direitos humanos.
No final, Rosário afirmou que a proteção com escolta policial é também uma forma de violação de direitos humanos.
- Não é bom viver permanentemente num programa desses. É para ser uma excepcionalidade. Viver sob escolta na missa, na escola, no supermercado é também uma violação dos direitos humanos. É uma violação da privacidade - disse Rosário.
Passados oito dias da morte de José Cláudio e sua mulher, Maria do Espírito Santo, a direção nacional do PT divulgou nota ontem para manifestar indignação com os assassinatos ocorridos na Região Amazônica. A nota é assinada pelo presidente do partido, Rui Falcão, e por secretários petistas. O PT afirma que apoia a iniciativa do governo federal "de dar prioridade máxima ao assunto". "É preciso estancar a violência, dar proteção às lideranças locais e investigar a fundo os crimes cometidos", diz a nota.
FONTE: O GLOBO
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