quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

O DI incomoda muita gente:: Celso Ming

Os desmentidos do ministro da Fazenda, Guido Mantega, não foram convincentes. Terça-feira ele negara qualquer estudo no âmbito do governo que previsse a criação de sobretaxação das aplicações atreladas aos juros básicos (fundos DI). Mas outras informações dão conta de que discussões existem – e novas necessidades também.

Primeiramente, é preciso entender de onde provêm pressões por mudança. Hoje, grande volume de aplicações financeiras varia conforme os juros básicos (Selic) determinados pelo Banco Central. Em fundos DI (Depósitos Interbancários), o patrimônio financeiro no Brasil é de mais de R$ 235 bilhões (11,7% da indústria de fundos).

O principal título que lastreia esse fundo é a Letra Financeira do Tesouro (LFT), que paga a variação da Selic. O estoque desse título em janeiro era de R$ 776 bilhões. Foi instituído em meados dos anos 80, tempos de inflação braba, quando a dívida pública teve de ser refinanciada diariamente no mercado. A LFT é, assim, um entulho inflacionário.

O principal problema que faz o governo tentar virar o jogo é o fato de os fundos DI tirarem força da política monetária (de juros) do Banco Central. Caso as aplicações fossem prefixadas (juros fixos), o aplicador perderia dinheiro se a inflação subisse e, por consequência, os juros também – para combatê-la. E ganharia se ocorresse o contrário. Mas, no caso das aplicações atreladas à Selic, a remuneração flutua diariamente de acordo com as mexidas nos juros promovidas pelo Banco Central. Assim, não ajudam a transmitir a força da política de juros (redução ou elevação do volume de dinheiro no mercado).

Como o projeto é derrubar os juros "a um dígito" (abaixo dos 10% ao ano) e, com o tempo, deixá-los nos padrões internacionais, a LFT é uma pedra no meio do caminho do Banco Central. Com sua remoção, teriam de ser criados modos de o investidor sair dos títulos condicionados à evolução diária da Selic – portanto, à remuneração calculada pelo DI. O Tesouro também perde por não conseguir alongar o perfil de vencimento da dívida pública.

Daí essa ideia de sobretaxar essas aplicações para que o aplicador migre para títulos (e fundos) prefixados. Questões semelhantes atingem a caderneta de poupança, que paga pedaço da TR (Taxa Referencial (substituta da antiga correção monetária) mais juros de 0,5% ao mês (ou 6,1668% ao ano, em termos compostos). Mas eventuais mudanças nas regras da caderneta ficam para serem avaliadas em outra oportunidade.

O problema é que o cronograma de implementação das alterações na política de juros do Banco Central parece mais curto do que exigiria o prazo de implantação de mudanças tão relevantes nas aplicações financeiras. É preciso saber, por exemplo, se a alteração de tributação alcançará também o estoque atual de títulos e de cotas de fundos DI ou se só novas aplicações. Caso não alcancem, o mercado terá de conviver com regimes tributários diferentes. Além disso, essas mudanças não devem reduzir apenas a remuneração do aplicador. Avançarão, também, sobre a remuneração cobrada pelos bancos a título de taxa de administração.

Enfim, se não forem bem feitas, mudanças tão relevantes podem desorganizar o mercado financeiro e atuar com forte desestímulo à formação de poupança.

CONFIRA

O gráfico traz a evolução do déficit nominal do setor público. (Déficit nominal é a diferença, a menor, entre receitas e despesas do Setor Público, incluídos juros da dívida. Difere do resultado primário, no qual não contam juros como despesa

Ao alcance da mão. Nesta quarta-feira, o ministro Guido Mantega avisou que a obtenção de um déficit nominal zero é "exequível" e que ele pode ser alcançado "nos próximos anos". Quando isso acontecer, os juros vão despencar no Brasil, porque as despesas públicas não precisarão de cobertura.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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