Foram
incumbidos de redigi-la, pelo Ministro do Trabalho, Alexandre Marcondes Filho,
quatro procuradores da Justiça do Trabalho: Luís Augusto do Rego Monteiro, José
de Segadas Viana, Dorval de Lacerda e Arnaldo Lopes Sussekind. A tarefa
teórico-burocrática, desamparada de experiências na vida real, foi levada a
cabo em dez meses e o anteprojeto, submetido ao ministro em novembro de 1942,
sendo publicado em janeiro no Diário Oficial para receber sugestões. Quatro
meses depois, em 1.º de maio, Vargas celebrou o Dia do Trabalho com o
Decreto-Lei n.º 5.452, que aprovou a Consolidação.
A
Carta de 37 fora inspirada na Carta del Lavoro da Itália fascista de Benito
Mussolini. Dela vieram, transplantados para o Direito Constitucional e do
Trabalho, o sindicato único reconhecido e controlado pelo Estado, a divisão de
trabalhadores e empregadores em categorias profissionais e econômicas, o
imposto sindical, a Justiça do Trabalho investida de poder normativo, a
criminalização da greve, o dirigente pelego e corrupto.
Em
24 de julho de 1943, ante a certeza da vitória dos países aliados na grande
guerra contra o nazi-fascismo (1939-1945), Mussolini foi derrubado. A ditadura
e o corporativismo sindical deixaram de existir, com o imediato ressurgimento
dos partidos políticos e de sindicatos livres da intromissão do governo.
Vargas, por sua vez, foi deposto em 29 de outubro de 1945 e nova Constituição
democrática, promulgada em 18 de setembro de 1946. A CLT, entretanto,
permaneceu intocada, trazendo nas veias estruturas corporativo-fascistas,
contidas na Carta de 37.
Em
1970 o Tribunal Superior do Trabalho (TST) elaborou anteprojeto de Código
Processual do Trabalho, entregue ao ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, em
setembro daquele ano. Na edição de 9 de setembro o jornal O Estado de S. Paulo
noticiou o ocorrido e citou os ministros Mozart Russomano e Arnaldo Sussekind,
para os quais aquele seria "o mais completo código processual de que se
tem notícia no mundo ocidental". Um dos objetivos do projeto consistia na
redução do número de recursos. Com mais de 500 artigos, a iniciativa morreu no
berço.
Preocupado
com movimentos grevistas deflagrados pelos metalúrgicos de São Bernardo do
Campo (SP) a partir de 1978, o presidente João Figueiredo retomou a ideia de
modernização da CLT. Uma comissão de juristas foi organizada, sob a presidência
do ministro Sussekind, para a redação de anteprojeto. Em março de 1979 já se
achava concluído. Sobre ele escreveu a revista Veja, na edição de 9 de maio:
"Grande por fora - O anteprojeto da CLT com mais de 1.300 artigos".
Ouvido a respeito, Lula, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Bernardo, disparou: "Não adianta remendar a CLT". A seu ver, o
correto seria aprovar lei básica reunindo garantias essenciais e mínimas,
deixando o restante por conta de negociações coletivas protegidas contra
interferências externas. Derrotada pela crítica, a pretensiosa iniciativa foi
sepultada.
Nova
tentativa de atualização ocorreu 29 anos depois. A essa altura, Luiz Inácio
Lula da Silva, presidente da República, em 25 de setembro de 2003 instalou o
Fórum Nacional do Trabalho, integrado por dezenas de representantes do governo,
dirigentes sindicais patronais e profissionais e advogados. Em fevereiro de
2005 o ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, submeteu ao presidente proposta
de emenda aos artigos 8.º, 11, 37 e 114 da Constituição de 1988, acompanhada de
anteprojeto de lei de relações sindicais. Passados mais de sete anos, ambos
continuam engavetados, rejeitados por trabalhadores e patrões.
Ao
se vincular ao modelo corporativo-fascista, a CLT garroteou a vida sindical e
as negociações coletivas, submetidas ao arbítrio do Judiciário, e privilegiou o
direito individual, ininterruptamente ampliado por meio de normas esparsas, que
o fazem cada vez mais volumoso, complexo, obscuro, confuso, como prova a
jurisprudência inconstante. Daí o gigantesco número de conflitos que chegam à
Justiça do Trabalho - hoje representada por 1.418 varas instaladas e 169 à
espera de instalação, 24 tribunais regionais, na maioria dos casos subdivididos
em turmas, e pelo TST - e ao Supremo Tribunal Federal, alvo de recursos
extraordinários que lhe sobrecarregam a pauta. Apenas no período compreendido
entre 2000 e agosto de 2012 deram entrada mais de 30,3 milhões de ações
individuais e coletivas.
É
temerário ignorar a crise econômica mundial, refletida no acelerado aumento do
desemprego na União Europeia, e subestimar o avanço da China do século 21.
Dentro desse contexto, o Brasil não se deve descuidar e deixar de lado reformas
há décadas exigidas. Uma das providências destinadas à proteção e
sustentabilidade do mercado interno consiste na modernização trabalhista. A
desindustrialização é real, e não mera tese de pessimistas. A indústria acusou
neste ano os piores resultados desde 2009. A porcentagem que lhe cabe no produto
interno bruto (PIB) tem caído e 2012 se encerrará com perda de milhares de
postos de trabalho, principalmente em São Paulo, muitos desaparecidos, outros
preenchidos pela robotização.
A
presidente Dilma Rousseff tem problemas a resolver na esfera trabalhista.
Poderá optar pela inércia - o que não me parece ser do seu feitio - ou dar
passos iniciais, com a extinção do corruptor imposto sindical, a quebra do
monopólio de representação, a criação do Simples Trabalhista, a redução da
interferência nas relações de trabalho, sobretudo nas terceirizações, e
negociações coletivas. Não é tudo, mas parte do que deve ser feito, em
benefício de segurança jurídica nas relações de trabalho.
Almir
Pazzianotto Pinto, advogado; foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior
do Trabalho.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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