sábado, 11 de junho de 2022

Eduardo Affonso: Habitantes de Bolsolândia e Luloverso são birrentos

O Globo

Uma pesquisa recente traz alguns dados interessantes a respeito de quem não vota em Lula nem em Bolsonaro —os nem-nem, outrora conhecidos como isentões e cada vez mais chamados, injustamente, de omissos.

O percentual dos que votaram branco ou nulo em 2018 e avaliam de forma negativa o atual governo é bem mais próximo daquele dos que pensam assim e votaram em Haddad que dos que apertaram o 17 e não o fariam mais.

Questionados sobre o que mais lhes dá medo, quase metade dos nem-nem aponta a continuidade de Bolsonaro, ante um terço para quem o bicho-papão é a volta do PT.

Esses resultados vêm na contramão do que apregoa a militância petista, que substituiu os mantras “É golpe”, “Fora Temer” e “Ele não” por “Quem não é Lula nem Bolsonaro é Bolsonaro”. Pois é: não foi golpe; o Temer ficou; deu ele, sim — e há mais nem-nem antibolsonarista que antilulista.

Quando se apresenta o nome dos candidatos, a maioria vai de Lula, um terço insiste em Bolsonaro, e a proporção dos que não sabem é quase irrelevante. Mas, na intenção de voto espontânea, tudo muda. Há bem mais indecisos que lulistas — e eles são o dobro dos bolsonaristas. É muita indecisão a quatro meses do pleito —sem contar que mais de 30% dos eleitores dizem que seu voto ainda pode mudar.

Isso explica o desespero no Bolsoverso (realidade paralela em que o Brasil está dando certo, a culpa do que dá errado é do STF, e não há corrupção ou fome) e na Lulolândia (paraíso encantado onde a Petrobras não foi saqueada, há ditaduras do bem, e Lula é inocente). No primeiro, só o “Mito” pode nos defender das invasões bárbaras que nos transformariam numa Venezuela ou (pior!) num Brasil com tiburis, wyllys e mercurys frequentando o Alvorada. Na segunda, Lula é a única esperança democrática, o último cartucho contra o fascismo, o agronegócio e o pop sertanejo. Ao contrário da direita e da esquerda, onde há gente adulta, esses territórios míticos são habitados por nenéns ideológicos — mimados, birrentos e narcisistas.

Bolsonaro foi eleito, em grande parte, graças ao voto de quem topava qualquer coisa, menos Lula (ou seu testa de ferro). Se o ex-presidente subir de novo a rampa, será eterno credor daqueles que têm repulsa a tudo o que Bolsonaro representa.

Até ontem, MDB e PSDB se engalfinhavam, tentando obter vantagens nas disputas paroquiais, em detrimento de um projeto maior. Para chegar ao segundo turno (ou evitar um vexame no primeiro), a terceira via não pode depender apenas da rejeição aos outros candidatos. Tem de apresentar propostas —e melhores que o retorno à velha matriz econômica ou a manutenção da barbeiragem vigente. O que, convenhamos, não há de ser tão difícil assim.

Considerável parcela do eleitorado (vide a pesquisa lá dos primeiros parágrafos) merece deixar de ser nem-nem e ter uma candidatura de peso para chamar de sua. Merece parar de se definir pela negação, de escolher pelo avesso. E deixar isso para os nenéns da Bolsolândia e do Luloverso, que parecem não enxergar muito além do próprio cordão umbilical.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Eu não sou nem uma coisa nem outra,eu vou sempre pelo menos pior,exigir pureza e santidade é perder tempo.