DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Até as eleições de 2012 a presidente Dilma Rousseff terá um ano e meio para aproveitar a força política das urnas e fazer o Congresso aprovar uma agenda que Lula desistiu de tocar, mas é fundamental para a economia prosperar, para tornar mais limpa a prática política, para a dívida social recuar e para acabar com a miséria. Se conseguir, seu governo será bem avaliado e dará a ela cacife para ser reeleita em 2014, desta vez sem apadrinhamento algum. Será um período difícil, concentrado no prazo exíguo e, ao mesmo tempo, ampliado em múltiplos segmentos em que a ação do governo é fundamental e determinante para fazer o País avançar.
Dessa agenda tudo é prioritário, mas a reforma política se sobrepõe, porque ela abre caminho para facilitar, acelerar e viabilizar todo o resto. É uma espécie de mãe de todas as reformas. Na visão limitada dos políticos, a reforma política é simplesmente prover dinheiro público para financiar campanhas eleitorais e ponto. Ela é muito mais. É a espinha dorsal do fortalecimento das instituições e da democracia, o anteparo ao fisiologismo e à corrupção, desencoraja o desvio do dinheiro público e força presidente, governadores e prefeitos a governarem melhor, com mais eficiência. O interesse público estará preservado e a população ficará agradecida se suas regras atenderem a esses objetivos. Importante também é não ceder a pressões para amansar a Lei de Responsabilidade Fiscal e não permitir que governantes gastem mais do que podem. Sancionada no governo FHC, essa lei é parte integrante da reforma política, embora a vinculação não tenha sido explicitada na época da sua aprovação.
Para aprovar as reformas e outros projetos do Executivo no Congresso é fundamental que a nova presidente resista à prática do toma lá dá cá, ao jogo de chantagem dos parlamentares. Se ceder na primeira vez, a chantagem se espalha e Dilma pode virar refém de uma prática que Lula e o mensalão fartamente provaram ser desastrosa para o País e para quem o governa. Não só porque avança sobre o dinheiro do contribuinte. Também porque vender dificuldades para obter facilidades leva tempo, deforma o conteúdo das matérias, atrasa sua tramitação e o Executivo acaba desistindo de projetos essenciais para o País. Foi o que aconteceu com Lula, que desistiu das reformas tributária, trabalhista, sindical e previdenciária, causando um lamentável atraso de oito anos.
Dilma acaba de escolher seu ministério, contemplando os dez partidos políticos da aliança que a elegeu. Em regimes democráticos, de representação partidária, essa prática é legítima, desde que os escolhidos tenham o passado limpo e agreguem competência e preparo técnico ao cargo. Em relação à maioria dos ministros escolhidos, tais critérios não foram, nem minimamente, observados. Mas está feito, vá lá. Agora ela vai enfrentar uma segunda etapa de pressões para nomear políticos em diretorias de estatais, agências reguladoras, órgãos públicos em Brasília e nos Estados e cargos no segundo, terceiro e quarto escalões.
Aí já é diferente. Mais uma vez, Dilma precisa resistir com força, mostrar-se irredutível. Para administrar com eficiência o bem público, o governante não pode entregar cargos técnicos, que executam decisões e projetos de governo, a políticos fisiológicos, cujo interesse é unicamente extrair do cargo vantagens para seu partido. Como julga que nunca erra, Lula recusou-se a aprender com erros. Mas Dilma deve ter na memória os últimos oito anos de enorme desgaste político com os eleitores e fracasso de gestão em estatais e órgãos públicos por Lula ter nomeado políticos oportunistas para cargos técnicos.
Esse é o arcabouço político e humano com que Dilma vai trabalhar nos próximos quatro anos. É imperfeito, sujeito a pressões políticas, lobbies e chantagens. Portanto, ela deve ficar permanentemente atenta para três objetivos: esgotar o calor das urnas para aprovar matérias difíceis - e de interesse do País - nos primeiros 18 meses de mandato; não nomear políticos incompetentes para funções técnicas; e adotar, desde já, por princípio não ceder a chantagens de parlamentares.
A agenda. Na campanha Dilma evitou falar das reformas (política, tributária, trabalhista, sindical e previdenciária). É um tema politicamente complicado para ser defendido em momentos de caça aos votos. Mas Dilma sabe que elas são tão essenciais quanto difíceis de passar no Congresso. Daí o esforço para tentar aprová-las nos primeiros 18 meses de governo. Além delas, fazem parte da agenda de curto prazo as microrreformas - dirigidas a apoiar o crescimento de longo prazo, criar ambientes propícios a novos negócios e a aumentar a eficiência do mercado. Eliminar papelada, encurtar prazos, facilitar, enfim, a burocracia para a abertura de empresas são providências bem-vindas para estimular novos investimentos, gerar emprego e renda. Correndo por fora desta agenda, a nova presidente vai enfrentar o complicado e minucioso trabalho de administrar o cotidiano da economia.
Dilma assume num momento em que a economia está mais aquecida do que deveria, pressionando a alta da inflação - o Banco Central (BC) elevou sua projeção para 2011 de 4,6% para 5% - e gerando expectativa de o BC voltar a elevar a taxa Selic na próxima reunião do Copom. Se quiser evitar isso, ela terá de endurecer no desempenho fiscal, cortar despesas, suspender contratações, frear a ambição do PT por cargos, recusar pressões e lobbies por gastos de toda ordem e, se necessário, cortar investimentos do PAC. Desequilibrado em razão do desajuste cambial e da crise nos países ricos, o déficit externo está em plena ascensão, devendo fechar 2010 em US$ 49 bilhões e, segundo o BC, em US$ 64 bilhões em 2011 - 31% maior do que este ano. Esse é um problema delicado que requer atenção e ação para não se agravar.
A boa notícia é que a maioria das empresas tem planos de investir em 2011, segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas. Mais investimento, mais emprego, mais dinheiro circulando, mais receita tributária. E é com esse aumento de receita que Dilma deveria organizar um programa de pagamento gradual da dívida e de redução a zero do déficit público nominal.
No mais, boa sorte ao Brasil e à gestão da nova presidente. E um feliz ano-novo aos queridos leitores.
Jornalista, é professora de comunicação da PUC-RIO
Até as eleições de 2012 a presidente Dilma Rousseff terá um ano e meio para aproveitar a força política das urnas e fazer o Congresso aprovar uma agenda que Lula desistiu de tocar, mas é fundamental para a economia prosperar, para tornar mais limpa a prática política, para a dívida social recuar e para acabar com a miséria. Se conseguir, seu governo será bem avaliado e dará a ela cacife para ser reeleita em 2014, desta vez sem apadrinhamento algum. Será um período difícil, concentrado no prazo exíguo e, ao mesmo tempo, ampliado em múltiplos segmentos em que a ação do governo é fundamental e determinante para fazer o País avançar.
Dessa agenda tudo é prioritário, mas a reforma política se sobrepõe, porque ela abre caminho para facilitar, acelerar e viabilizar todo o resto. É uma espécie de mãe de todas as reformas. Na visão limitada dos políticos, a reforma política é simplesmente prover dinheiro público para financiar campanhas eleitorais e ponto. Ela é muito mais. É a espinha dorsal do fortalecimento das instituições e da democracia, o anteparo ao fisiologismo e à corrupção, desencoraja o desvio do dinheiro público e força presidente, governadores e prefeitos a governarem melhor, com mais eficiência. O interesse público estará preservado e a população ficará agradecida se suas regras atenderem a esses objetivos. Importante também é não ceder a pressões para amansar a Lei de Responsabilidade Fiscal e não permitir que governantes gastem mais do que podem. Sancionada no governo FHC, essa lei é parte integrante da reforma política, embora a vinculação não tenha sido explicitada na época da sua aprovação.
Para aprovar as reformas e outros projetos do Executivo no Congresso é fundamental que a nova presidente resista à prática do toma lá dá cá, ao jogo de chantagem dos parlamentares. Se ceder na primeira vez, a chantagem se espalha e Dilma pode virar refém de uma prática que Lula e o mensalão fartamente provaram ser desastrosa para o País e para quem o governa. Não só porque avança sobre o dinheiro do contribuinte. Também porque vender dificuldades para obter facilidades leva tempo, deforma o conteúdo das matérias, atrasa sua tramitação e o Executivo acaba desistindo de projetos essenciais para o País. Foi o que aconteceu com Lula, que desistiu das reformas tributária, trabalhista, sindical e previdenciária, causando um lamentável atraso de oito anos.
Dilma acaba de escolher seu ministério, contemplando os dez partidos políticos da aliança que a elegeu. Em regimes democráticos, de representação partidária, essa prática é legítima, desde que os escolhidos tenham o passado limpo e agreguem competência e preparo técnico ao cargo. Em relação à maioria dos ministros escolhidos, tais critérios não foram, nem minimamente, observados. Mas está feito, vá lá. Agora ela vai enfrentar uma segunda etapa de pressões para nomear políticos em diretorias de estatais, agências reguladoras, órgãos públicos em Brasília e nos Estados e cargos no segundo, terceiro e quarto escalões.
Aí já é diferente. Mais uma vez, Dilma precisa resistir com força, mostrar-se irredutível. Para administrar com eficiência o bem público, o governante não pode entregar cargos técnicos, que executam decisões e projetos de governo, a políticos fisiológicos, cujo interesse é unicamente extrair do cargo vantagens para seu partido. Como julga que nunca erra, Lula recusou-se a aprender com erros. Mas Dilma deve ter na memória os últimos oito anos de enorme desgaste político com os eleitores e fracasso de gestão em estatais e órgãos públicos por Lula ter nomeado políticos oportunistas para cargos técnicos.
Esse é o arcabouço político e humano com que Dilma vai trabalhar nos próximos quatro anos. É imperfeito, sujeito a pressões políticas, lobbies e chantagens. Portanto, ela deve ficar permanentemente atenta para três objetivos: esgotar o calor das urnas para aprovar matérias difíceis - e de interesse do País - nos primeiros 18 meses de mandato; não nomear políticos incompetentes para funções técnicas; e adotar, desde já, por princípio não ceder a chantagens de parlamentares.
A agenda. Na campanha Dilma evitou falar das reformas (política, tributária, trabalhista, sindical e previdenciária). É um tema politicamente complicado para ser defendido em momentos de caça aos votos. Mas Dilma sabe que elas são tão essenciais quanto difíceis de passar no Congresso. Daí o esforço para tentar aprová-las nos primeiros 18 meses de governo. Além delas, fazem parte da agenda de curto prazo as microrreformas - dirigidas a apoiar o crescimento de longo prazo, criar ambientes propícios a novos negócios e a aumentar a eficiência do mercado. Eliminar papelada, encurtar prazos, facilitar, enfim, a burocracia para a abertura de empresas são providências bem-vindas para estimular novos investimentos, gerar emprego e renda. Correndo por fora desta agenda, a nova presidente vai enfrentar o complicado e minucioso trabalho de administrar o cotidiano da economia.
Dilma assume num momento em que a economia está mais aquecida do que deveria, pressionando a alta da inflação - o Banco Central (BC) elevou sua projeção para 2011 de 4,6% para 5% - e gerando expectativa de o BC voltar a elevar a taxa Selic na próxima reunião do Copom. Se quiser evitar isso, ela terá de endurecer no desempenho fiscal, cortar despesas, suspender contratações, frear a ambição do PT por cargos, recusar pressões e lobbies por gastos de toda ordem e, se necessário, cortar investimentos do PAC. Desequilibrado em razão do desajuste cambial e da crise nos países ricos, o déficit externo está em plena ascensão, devendo fechar 2010 em US$ 49 bilhões e, segundo o BC, em US$ 64 bilhões em 2011 - 31% maior do que este ano. Esse é um problema delicado que requer atenção e ação para não se agravar.
A boa notícia é que a maioria das empresas tem planos de investir em 2011, segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas. Mais investimento, mais emprego, mais dinheiro circulando, mais receita tributária. E é com esse aumento de receita que Dilma deveria organizar um programa de pagamento gradual da dívida e de redução a zero do déficit público nominal.
No mais, boa sorte ao Brasil e à gestão da nova presidente. E um feliz ano-novo aos queridos leitores.
Jornalista, é professora de comunicação da PUC-RIO
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