- Folha de S. Paulo
Encarceramento está deixando de ser uma solução racional
Estamos habituados a pensar que lugar de bandido é a cadeia, mas essa é uma ideia relativamente nova. Embora gregos e romanos tenham, já na Antiguidade, feito experimentos com a prisão como castigo para certos delitos, a maior parte dos Estados que desenvolveram sistemas penais se valia de versões mais ou menos escancaradas da “lex talionis”, isto é, do “olho por olho, dente por dente”.
É só a partir do século 17 que alguns países europeus vão voltar a flertar, e muito lentamente, com a cadeia como forma de punição. Antes disso, calabouços e masmorras eram apenas lugares onde o acusado aguardava sua sentença, frequentemente a execução, por enforcamento, decapitação, ou mesmo pelo fogo, ou algum tipo de castigo físico, como mutilações, chibatadas ou a marcação a ferro quente. A prisão nos moldes de hoje só se disseminou mesmo a partir do início do século 19.
E por que eu estou contando tudo isso? Bem, nossos trisavós também devem ter achado estranho quando pararam de enforcar bandidos e decidiram colocá-los em celas. Suspeito até que muitos disseram que isso era um arremedo de justiça. Mas o fato é que as considerações racionais dos pensadores iluministas acabaram prevalecendo, e os Estados concluíram que não era preciso incorrer em crueldade para obter os efeitos dissuasivos da aplicação de penas.
De modo análogo, o encarceramento está deixando de ser uma solução racional. No Brasil, gastamos R$ 20 bilhões por ano no sistema penitenciário e o efeito mais notável dessa política é que fornecemos mão de obra cativa para o PCC. Num mundo mais racional, a cadeia seria reservada para os criminosos que, se deixados soltos, sairiam atirando em seus patrícios. Para os demais, precisamos encontrar outras penas, menos onerosas e suficientemente dissuasivas. Muitos de nossos trisavós também acharam que não daria, mas deu, e o mundo é hoje um lugar melhor.
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