quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Cabral: 'Querem roubar o Rio'

DEU EM O GLOBO

O governador do Rio, Sérgio Cabral, esteve ontem no Congresso e não conseguiu barrar emenda da bancada nordestina que estende para as áreas já concedidas do pré-sal (28% do total) a nova partilha dos royalties, mais favorável aos estados produtores. O Rio começará a receber, em 2010, royalties do campo de Tupi, no pré-sal. Cabral viajou a Brasília com o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, que representa outro grande estado produtor, e saiu irritado:

"Querem roubar o Rio de Janeiro. É perder absolutamente o respeito federativo, é abrir um precedente perigoso no Congresso Nacional (...) Peço a solidariedade dos governadores nordestinos em nome do povo nordestino que mora no Rio."

Pré-sal: Cabral vê "roubo ao Rio"

Sem conseguir barrar emenda que muda royalties de áreas já licitadas, governador eleva o tom

Gustavo Paul e Gerson Camarotti

A ameaça de perder uma boa parcela da receita estadual com royalties de petróleo nas áreas já licitadas do pré-sal levou os governadores do Rio, Sérgio Cabral, e do Espírito Santo, Paulo Hartung, a apelarem ao governo federal para negociar uma solução junto aos demais estados da federação. Ontem, os dois foram pessoalmente ao Congresso e tentaram, sem sucesso, barrar a emenda da bancada nordestina que estende para a área já concedida do pré-sal (28% do total) a nova divisão dos royalties, mais favorável aos estados não produtores. Os textos também preveem o avanço destes sobre as receitas de participações especiais (PEs), que têm 95% da arrecadação atual destinados ao Rio.

Diante do impasse, Cabral elevou o tom ontem e afirmou que a medida "representa um butim (produto de saque)". Ele lembrou que o Rio começará a receber royalties em 2010 do campo de Tupi, no pré-sal, e ressaltou que o estado já perdeu nessa negociação, com o fim das PEs, que não existem no regime de partilha da produção.

- E ainda vem um grupo de parlamentares, por motivos diferentes, roubar o Rio de Janeiro. É perder absolutamente o respeito federativo, é abrir um precedente perigoso no Congresso Nacional - disse Cabral.

Para ele, a discussão não é matemática. É política:

- Peço a solidariedade dos governadores nordestinos em nome do povo nordestino que mora no Rio.

Se for aprovada a emenda da bancada do Nordeste, a receita do Rio poderá sofrer um baque nos próximos anos. Os estados e municípios produtores recebem atualmente 52,5% dos royalties. A proposta para o novo regime de partilha prevê que, nas áreas ainda não licitadas do pré-sal, esse percentual seja reduzido para 34%, sendo 25% para os estados, 6% para os municípios e 3% para os municípios com instalações petrolíferas. O que os estados nordestinos querem é estender essa nova divisão para a parte do pré-sal já concedida.

Até 2025, Rio receberia R$243 bi

Segundo estimativas da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, entre 2010 e 2025, o Rio de Janeiro e os municípios fluminenses vão acumular R$243 bilhões em royalties e PE com as áreas já concedidas para a exploração do petróleo, incluindo o pré-sal. São Paulo receberia R$107 bilhões e Espírito Santo, R$18 bilhões.

A intermediação com o governo federal começou a ser feita na noite de ontem, liderada pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), que recebeu a incumbência de levar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a questão. Hoje, Cabral terá um encontro com Lula no Rio. Um dos argumentos é que, sem um entendimento, não se conseguirá aprovar o marco regulatório do pré-sal na Câmara este ano.

No entender dos estrategistas dos estados produtores, a posição intransigente dos governadores nordestinos, capitaneados pelo de Pernambuco, Eduardo Campos, também presidente do PSB, visa a barganhar mais recursos do petróleo a curto prazo. Dessa forma, o governo federal teria de concordar em ceder uma parcela do que irá arrecadar com os megacampos de Tupi, Iara e Júpiter, por exemplo.

Diante do impasse, as bancadas fluminense e capixaba começaram a ensaiar a obstrução da votação do projeto que cria o modelo de partilha. O início da discussão do projeto, previsto para ontem, foi transferido para hoje. Mas não há certeza de que a apreciação poderá ocorrer de fato.

O clima foi tenso ontem. Numa reunião com Temer e com os líderes do governo, Henrique Fontana (PT-RS), e do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), também relator do projeto de partilha, Cabral e Hartung constataram que as bancadas de seis partidos (PP, PR, PSB, PDT e PTB e parte do PMDB) não abririam mão da emenda a favor da maior distribuição dos royalties. Isso enfureceu Cabral:

- Vou procurar Lula. Hoje são deputados da base do governo que estão assinando emendas. É um governador da base do governo que está fazendo proselitismo e demagogia com o estado alheio, querendo se notabilizar nacionalmente com prejuízo do povo do Rio - disse Cabral, numa referência ao governador pernambucano.

Cabral e Hartung também se reuniram com os deputados. A constatação era que, se o projeto for a plenário sem entendimento prévio, a emenda do PSB será aprovada pela maioria dos deputados de outros estados. Preocupado com o impasse, o Palácio do Planalto decidiu atuar junto às bancadas.

- A posição do governo é apoiar o relatório aprovado na comissão especial, que dará um aumento de sete vezes na participação dos royalties dos estados não produtores. Achamos que a disputa não pode retardar o novo marco regulatório. Por isso, nossa orientação é derrubar a obstrução - disse ao GLOBO o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que descartou abrir mão de sua parcela dos royalties para solucionar o impasse. - Não devemos mexer naquilo que já foi licitado.

Nos bastidores, Lula estaria preocupado com a posição bélica de Cabral. Segundo um assessor, ele estaria incendiando a disputa federativa, o que poderia ampliar uma rebelião dos demais estados contra o Rio. Afinal, Cabral afirmou que a proposta da bancada nordestina abre brechas para que sejam discutidas outras questões:

- Vamos discutir a Zona Franca de Manaus, o fundo do Nordeste e por que o povo do Rio de Janeiro recebe só R$600 milhões de Fundo de Participação dos Estados, enquanto Pernambuco recebe R$3 bilhões por ano. Nunca questionamos isso.

Colaborou Cristiane Jungblut

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