DEU EM GRAMSCI E O BRASIL
Em artigo de novembro/2009, o ex-presidente Fernando Henrique adverte-nos para o perigoso legado lulista da desmoralização dos partidos políticos na esteira do simbiótico entrelaçamento entre seu governo, os sindicatos, algumas corporações empresariais e os fundos de pensão. Comentando seu texto, o cientista político Fábio Wanderley observou, de passagem, que “o que caberia esperar de FHC como importante líder partidário, em vez da mera constatação da crise dos partidos, é antes a resposta ao desafio de como seu PSDB poderia escapar a ela e penetrar para valer o eleitorado atraído pelos despautérios lulistas”.
A observação de Wanderley é pertinente e merece ser mais bem investigada para se determinar a causa dessa incapacidade ou impossibilidade.
O balanço da atuação do PSDB na era Lula (2003-2010) é espantosamente negativo do ponto de vista da atitude de um partido de oposição, que, para voltar ao poder, deve saber explorar as falhas do adversário no governo, ao mesmo tempo que sustenta suas bandeiras programáticas fundamentais. Nesse sentido, a candidatura Alckmin (2006) foi arquetípica em termos do fenômeno que se quer aqui comentar.
As causas da impotência oposicionista tucana são muitas e continuam importantes para se tentar determinar o comportamento do partido na eleição que se aproxima. Comecemos pela formação do partido e sua ascensão ao poder nacional em 1994.
Depois de titubear entre a denúncia da corrupção no Governo Collor e o pragmatismo de conquistar espaços ministeriais em seu interior, em meio ao crescente isolamento político de seu titular depois do fracassado tiro anti-inflacionário, os tucanos foram arrastados pelo clamor da classe média, mobilizada pelos petistas, em prol do impedimento do presidente acusado de corrupção. Foi dessa forma quase involuntária que o PSDB veio a conseguir um lugar estratégico na coalizão de sustentação do vice Itamar Franco, que assumira em lugar de Collor. Graças à resistência petista em assumir suas responsabilidades no novo governo de coalizão que se formava, os tucanos gozaram de um confortável espaço político para implementar o Plano Real e, assim, pavimentar a espetacular vitória na eleição de 1994, atropelando o favoritismo de Lula.
A verdade, todavia, é que o partido parlamentar, nascido da costela progressista do PMDB na Constituinte de 1986, não tinha em seu DNA uma estrutura popular própria capaz de lhe garantir tal espaço a partir de uma densidade político-social construída de baixo para cima, devendo seu sucesso mais à competência técnica de seus quadros e à incapacidade de parcela majoritária da esquerda de exercer um papel positivo no período democrático — o PCB conseguira dar esse passo já em 1967, mas, além de mortalmente golpeado pelo aparelho repressivo nos anos 1970, assessorado pela CIA, entrou em crise no período da redemocratização em meio à percepção restritiva de que tal virada dependia de relações carnais com o liberalismo-social, condição essa que aniquilaria o capital político dos comunistas como partido antissistema.
A hegemonia tucana à esquerda, desse modo, era mais garantida pela incapacidade dos petistas de progredirem nessa direção — a própria vitória de Collor em 1989 pode ser vista por esse prisma, já que o PT não foi capaz de adaptar os ideais históricos da esquerda (reformas de base) às novas condições da crise do Estado autoritário —, do que por uma tomada de posição ativa do PSDB em ocupar esse espaço através de uma aliança com o PCB e o restante da esquerda democrática. Dessa forma, a hegemonia tucana começa a ruir no momento em que Lula convence o PT, no final dos anos 1990, depois de duas acachapantes derrotas eleitorais para FHC, de que o poder só seria acessível por meio de uma guinada ao centro.
A manobra lulista até hoje não foi suficientemente entendida pelos tucanos, que, desde então, perderam o rumo e só não são superados eleitoralmente pela incapacidade ainda maior dos conservadores de reconquistarem seu lugar no proscênio partidário nacional. Mas o que é necessário destacar é que tal desnorteamento se vincula umbilicalmente à inapetência tucana e de seu ideólogo maior, FHC, de superar sua aversão à política de massas e adotar uma postura menos “cardinalícia” e mais militante na construção de uma centro-esquerda democrática, revertendo a desvantagem estrutural de seu DNA elitista-parlamentar.
Colada a essa incapacidade genética de desenvolver uma organicidade popular autônoma no seio da organização partidária e, por consequência, de mobilizar diretamente seus adeptos na luta por um programa, o partido adquiriu uma deficiência volitiva mais geral, ligada à incapacidade de sustentar seu próprio programa de maneira aberta e clara. Por medo de desagradar a opinião pública — que, na verdade, se define no processo, como bem vimos no referendo de 2005 (lei do desarmamento) —, o PSDB abre mão de interpelar programaticamente os eleitores na direção que lhe parece mais correta, o que acaba por facilitar as coisas para o PT — engendrando a famosa profecia que se autorrealiza —, cujas estruturas mobilizatórias foram em parte preservadas mesmo depois dos desastrosos escândalos desde 2005 (mensalão, aloprados, etc.).
De outro lado, a forma de difusão programática que conseguem residualmente fazer é pré-partidária, estando ligada quase exclusivamente à defesa dos governos de seus principais líderes — não por acaso, os Democratas definham diante da escassez de governadores. Desse modo, tanto Serra quanto Aécio fazem da administração de seus estados o fio condutor de seu programa, não obstante nenhum presidente desde a redemocratização ter sido escolhido por esse critério.
Vejamos: Tancredo foi eleito pelo colégio eleitoral parlamentar de então por ser um expoente moderado das oposições ao regime militar, e não por seu desempenho no Governo de Minas (1982-84); Collor, em 1989, venceu agitando a bandeira do fim da inflação (o “tiro certeiro”), da desburocratização (caça aos marajás) e da abertura comercial do país (crítica às “carroças nacionais”), com alusões marginais a seu Governo em Alagoas (1986-89), mais lembrado pela oposição do que por sua própria campanha; Cardoso foi consagrado em 1994 e 1998 pelo sucesso de seu Plano Real, que, lastreado pela paridade cambial, facilitou a abertura comercial, as privatizações e, acrescido de programas sociais como o Bolsa Escola e o Comunidade Solidária, ajudaram-no a projetar uma imagem de modernizador preocupado com a equalização social, e não por seu desempenho puramente administrativo no Ministério da Fazenda de Itamar; Lula, enfim, agregando ao Real uma política de crescimento via produção (formalização do emprego) e aprofundando o engajamento do Estado na equalização social (Fome Zero/Bolsa Família), foi vitorioso em 2002 e 2006 sem ter nenhuma experiência administrativa anterior para exibir.
Dessa maneira, o PSDB tenta defender suas bandeiras históricas de viés, “costeando o alambrado”, como diria Brizola, com medo de ser contaminado pela impopularidade de FHC, erro que, tudo indica, continuará cometendo em 2010. Com base nisso, pode-se dizer que os tucanos foram aprisionados numa espécie de caverna platônica, de onde só podem avistar as sombras de seu antigo programa, agora sob a aparência fantasmagórica de uma projeção que anima a hegemonia petista sobre a centro-esquerda e a massa despolitizada das cidades e dos campos.
O quadro tem algumas semelhanças com as dificuldades da UDN diante do eixo populista (PSD-PTB) nos anos 1940-60, não obstante os udenistas terem sido, ao contrário dos tucanos, exímios defensores de suas bandeiras históricas, por terem, em seu DNA, estruturas capazes de organização pelo menos dos estratos médios e mais elevados da população. Até por isso, diante do fracasso histórico da UDN em chegar ao poder por moto próprio, os tucanos, incapazes de abordar criticamente sua própria trajetória eleitoral, lançam-se na paranoica tentativa de eludirem-se a si mesmos, na esperança de serem lembrados pelos eleitores como outra coisa mais familiar, o que pode ser entendido como o prenúncio de uma transfiguração do tipo janista ou collorista — que acometeu a UDN em 1960 e quase o fez com o PSDB em 1990.
É nessa chave que devemos entender a impotência de Fernando Henrique — e dos tucanos —, apontada por Wanderley, em apresentar saídas para o partido retomar a iniciativa e sustentar sua pretensão de voltar ao Planalto Central. Diante de uma sociedade que experimenta grandes mudanças, desde os anos 1970, os tucanos se revelam um partido covarde, apequenado diante do desafio de coligir argumentos que venham acompanhados de sinalizações de mudanças para o país.
A fórmula do “bom governante”, tocador de obras e formulador de políticas despolitizadas não pode e não vem sendo a marca das disputas presidenciais, por ser o Brasil um país de modernização inconclusa que demanda soluções macropolíticas para seus problemas históricos. Sem entrar no mérito político das políticas públicas levadas a cabo por Lula e sem considerar a necessidade de travar a disputa pelo legado do progressismo no país — mesmo que seja no sentido da superação do Governo FHC —, não resta aos tucanos outra saída a não ser torcer quase passivamente para que o destempero emocional de Dilma emerja em 2010 com a força que vitimou Ciro Gomes em 2002.
Mesmo assim, é preciso lembrar que em 2002 Serra, mesmo consagrado como bom gestor da saúde, não foi capaz de aproveitar os tropeços dos adversários para se colocar na dianteira, tendo sido preterido por um Lula (“paz e amor”) determinado a escapar da armadilha de líder radical em que os conservadores o haviam aprisionado desde a fundação do PT (1979); e, assim, Serra quase foi solapado por Garotinho na disputa pelo 2º turno. Mesmo que Dilma faça o jogo dos tucanos em 2010, como Lula o fez em 1994/1998, é possível que Serra não seja o beneficiário, se sua campanha se mantiver norteada pela ideia de bom Governador de SP — tal como outrora Alckmin, o bom Prefeito de SP —, sem entrar a fundo no debate sobre os problemas nacionais de modo a se reapropriar do Real a partir de uma crítica às insuficiências da política econômico-social dos petistas e mesmo de FHC. E se nesse caminho encontrar pela frente qualquer outro candidato capaz disso, empalmando bandeiras nacionais que venham ao encontro das expectativas da maioria dos eleitores, então aí as chances serão mesmo nulas.
Hamilton Garcia de Lima é cientista político e professor da Uenf (Universidade Estadual do Norte Fluminense), em Campos.
Em artigo de novembro/2009, o ex-presidente Fernando Henrique adverte-nos para o perigoso legado lulista da desmoralização dos partidos políticos na esteira do simbiótico entrelaçamento entre seu governo, os sindicatos, algumas corporações empresariais e os fundos de pensão. Comentando seu texto, o cientista político Fábio Wanderley observou, de passagem, que “o que caberia esperar de FHC como importante líder partidário, em vez da mera constatação da crise dos partidos, é antes a resposta ao desafio de como seu PSDB poderia escapar a ela e penetrar para valer o eleitorado atraído pelos despautérios lulistas”.
A observação de Wanderley é pertinente e merece ser mais bem investigada para se determinar a causa dessa incapacidade ou impossibilidade.
O balanço da atuação do PSDB na era Lula (2003-2010) é espantosamente negativo do ponto de vista da atitude de um partido de oposição, que, para voltar ao poder, deve saber explorar as falhas do adversário no governo, ao mesmo tempo que sustenta suas bandeiras programáticas fundamentais. Nesse sentido, a candidatura Alckmin (2006) foi arquetípica em termos do fenômeno que se quer aqui comentar.
As causas da impotência oposicionista tucana são muitas e continuam importantes para se tentar determinar o comportamento do partido na eleição que se aproxima. Comecemos pela formação do partido e sua ascensão ao poder nacional em 1994.
Depois de titubear entre a denúncia da corrupção no Governo Collor e o pragmatismo de conquistar espaços ministeriais em seu interior, em meio ao crescente isolamento político de seu titular depois do fracassado tiro anti-inflacionário, os tucanos foram arrastados pelo clamor da classe média, mobilizada pelos petistas, em prol do impedimento do presidente acusado de corrupção. Foi dessa forma quase involuntária que o PSDB veio a conseguir um lugar estratégico na coalizão de sustentação do vice Itamar Franco, que assumira em lugar de Collor. Graças à resistência petista em assumir suas responsabilidades no novo governo de coalizão que se formava, os tucanos gozaram de um confortável espaço político para implementar o Plano Real e, assim, pavimentar a espetacular vitória na eleição de 1994, atropelando o favoritismo de Lula.
A verdade, todavia, é que o partido parlamentar, nascido da costela progressista do PMDB na Constituinte de 1986, não tinha em seu DNA uma estrutura popular própria capaz de lhe garantir tal espaço a partir de uma densidade político-social construída de baixo para cima, devendo seu sucesso mais à competência técnica de seus quadros e à incapacidade de parcela majoritária da esquerda de exercer um papel positivo no período democrático — o PCB conseguira dar esse passo já em 1967, mas, além de mortalmente golpeado pelo aparelho repressivo nos anos 1970, assessorado pela CIA, entrou em crise no período da redemocratização em meio à percepção restritiva de que tal virada dependia de relações carnais com o liberalismo-social, condição essa que aniquilaria o capital político dos comunistas como partido antissistema.
A hegemonia tucana à esquerda, desse modo, era mais garantida pela incapacidade dos petistas de progredirem nessa direção — a própria vitória de Collor em 1989 pode ser vista por esse prisma, já que o PT não foi capaz de adaptar os ideais históricos da esquerda (reformas de base) às novas condições da crise do Estado autoritário —, do que por uma tomada de posição ativa do PSDB em ocupar esse espaço através de uma aliança com o PCB e o restante da esquerda democrática. Dessa forma, a hegemonia tucana começa a ruir no momento em que Lula convence o PT, no final dos anos 1990, depois de duas acachapantes derrotas eleitorais para FHC, de que o poder só seria acessível por meio de uma guinada ao centro.
A manobra lulista até hoje não foi suficientemente entendida pelos tucanos, que, desde então, perderam o rumo e só não são superados eleitoralmente pela incapacidade ainda maior dos conservadores de reconquistarem seu lugar no proscênio partidário nacional. Mas o que é necessário destacar é que tal desnorteamento se vincula umbilicalmente à inapetência tucana e de seu ideólogo maior, FHC, de superar sua aversão à política de massas e adotar uma postura menos “cardinalícia” e mais militante na construção de uma centro-esquerda democrática, revertendo a desvantagem estrutural de seu DNA elitista-parlamentar.
Colada a essa incapacidade genética de desenvolver uma organicidade popular autônoma no seio da organização partidária e, por consequência, de mobilizar diretamente seus adeptos na luta por um programa, o partido adquiriu uma deficiência volitiva mais geral, ligada à incapacidade de sustentar seu próprio programa de maneira aberta e clara. Por medo de desagradar a opinião pública — que, na verdade, se define no processo, como bem vimos no referendo de 2005 (lei do desarmamento) —, o PSDB abre mão de interpelar programaticamente os eleitores na direção que lhe parece mais correta, o que acaba por facilitar as coisas para o PT — engendrando a famosa profecia que se autorrealiza —, cujas estruturas mobilizatórias foram em parte preservadas mesmo depois dos desastrosos escândalos desde 2005 (mensalão, aloprados, etc.).
De outro lado, a forma de difusão programática que conseguem residualmente fazer é pré-partidária, estando ligada quase exclusivamente à defesa dos governos de seus principais líderes — não por acaso, os Democratas definham diante da escassez de governadores. Desse modo, tanto Serra quanto Aécio fazem da administração de seus estados o fio condutor de seu programa, não obstante nenhum presidente desde a redemocratização ter sido escolhido por esse critério.
Vejamos: Tancredo foi eleito pelo colégio eleitoral parlamentar de então por ser um expoente moderado das oposições ao regime militar, e não por seu desempenho no Governo de Minas (1982-84); Collor, em 1989, venceu agitando a bandeira do fim da inflação (o “tiro certeiro”), da desburocratização (caça aos marajás) e da abertura comercial do país (crítica às “carroças nacionais”), com alusões marginais a seu Governo em Alagoas (1986-89), mais lembrado pela oposição do que por sua própria campanha; Cardoso foi consagrado em 1994 e 1998 pelo sucesso de seu Plano Real, que, lastreado pela paridade cambial, facilitou a abertura comercial, as privatizações e, acrescido de programas sociais como o Bolsa Escola e o Comunidade Solidária, ajudaram-no a projetar uma imagem de modernizador preocupado com a equalização social, e não por seu desempenho puramente administrativo no Ministério da Fazenda de Itamar; Lula, enfim, agregando ao Real uma política de crescimento via produção (formalização do emprego) e aprofundando o engajamento do Estado na equalização social (Fome Zero/Bolsa Família), foi vitorioso em 2002 e 2006 sem ter nenhuma experiência administrativa anterior para exibir.
Dessa maneira, o PSDB tenta defender suas bandeiras históricas de viés, “costeando o alambrado”, como diria Brizola, com medo de ser contaminado pela impopularidade de FHC, erro que, tudo indica, continuará cometendo em 2010. Com base nisso, pode-se dizer que os tucanos foram aprisionados numa espécie de caverna platônica, de onde só podem avistar as sombras de seu antigo programa, agora sob a aparência fantasmagórica de uma projeção que anima a hegemonia petista sobre a centro-esquerda e a massa despolitizada das cidades e dos campos.
O quadro tem algumas semelhanças com as dificuldades da UDN diante do eixo populista (PSD-PTB) nos anos 1940-60, não obstante os udenistas terem sido, ao contrário dos tucanos, exímios defensores de suas bandeiras históricas, por terem, em seu DNA, estruturas capazes de organização pelo menos dos estratos médios e mais elevados da população. Até por isso, diante do fracasso histórico da UDN em chegar ao poder por moto próprio, os tucanos, incapazes de abordar criticamente sua própria trajetória eleitoral, lançam-se na paranoica tentativa de eludirem-se a si mesmos, na esperança de serem lembrados pelos eleitores como outra coisa mais familiar, o que pode ser entendido como o prenúncio de uma transfiguração do tipo janista ou collorista — que acometeu a UDN em 1960 e quase o fez com o PSDB em 1990.
É nessa chave que devemos entender a impotência de Fernando Henrique — e dos tucanos —, apontada por Wanderley, em apresentar saídas para o partido retomar a iniciativa e sustentar sua pretensão de voltar ao Planalto Central. Diante de uma sociedade que experimenta grandes mudanças, desde os anos 1970, os tucanos se revelam um partido covarde, apequenado diante do desafio de coligir argumentos que venham acompanhados de sinalizações de mudanças para o país.
A fórmula do “bom governante”, tocador de obras e formulador de políticas despolitizadas não pode e não vem sendo a marca das disputas presidenciais, por ser o Brasil um país de modernização inconclusa que demanda soluções macropolíticas para seus problemas históricos. Sem entrar no mérito político das políticas públicas levadas a cabo por Lula e sem considerar a necessidade de travar a disputa pelo legado do progressismo no país — mesmo que seja no sentido da superação do Governo FHC —, não resta aos tucanos outra saída a não ser torcer quase passivamente para que o destempero emocional de Dilma emerja em 2010 com a força que vitimou Ciro Gomes em 2002.
Mesmo assim, é preciso lembrar que em 2002 Serra, mesmo consagrado como bom gestor da saúde, não foi capaz de aproveitar os tropeços dos adversários para se colocar na dianteira, tendo sido preterido por um Lula (“paz e amor”) determinado a escapar da armadilha de líder radical em que os conservadores o haviam aprisionado desde a fundação do PT (1979); e, assim, Serra quase foi solapado por Garotinho na disputa pelo 2º turno. Mesmo que Dilma faça o jogo dos tucanos em 2010, como Lula o fez em 1994/1998, é possível que Serra não seja o beneficiário, se sua campanha se mantiver norteada pela ideia de bom Governador de SP — tal como outrora Alckmin, o bom Prefeito de SP —, sem entrar a fundo no debate sobre os problemas nacionais de modo a se reapropriar do Real a partir de uma crítica às insuficiências da política econômico-social dos petistas e mesmo de FHC. E se nesse caminho encontrar pela frente qualquer outro candidato capaz disso, empalmando bandeiras nacionais que venham ao encontro das expectativas da maioria dos eleitores, então aí as chances serão mesmo nulas.
Hamilton Garcia de Lima é cientista político e professor da Uenf (Universidade Estadual do Norte Fluminense), em Campos.
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