quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Na batalha do royalty governo já é perdedor - Raquel Ulhôa

O desfecho que a presidente Dilma Rousseff dará ao projeto de lei mudando a distribuição dos recursos provenientes da exploração do petróleo (royalty e participação especial) entre União, Estados e municípios é desconhecido, mas os parlamentares preparam-se para nova polêmica em torno do assunto: garantir a destinação total dessa riqueza em educação.

Como bandeira, a ideia é simpática. Tem "grande apelo populista", como diz o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski. Mas, se a intenção do governo for - de fato - tornar obrigatório o investimento em educação (por Estados, municípios e a própria União) de todo o dinheiro dos royalties e participações especiais resultantes da exploração do petróleo do mar, a chiadeira vai ser grande. Prefeitos e governadores não querem engessar o dinheiro. E tem forte demanda do setor da saúde.

Dilma pode sancionar o projeto do Congresso (que reduz a parte dos Estados e municípios produtores na renda do petróleo) e deixar que Rio de Janeiro e Espírito Santo recorram ao Supremo Tribunal Federal (STF). Podem ser anos de incerteza. Ela pode também sancionar uma parte - a que trata do futuro, da divisão dos royalties do petróleo do pré-sal (explorado pelo novo modelo de partilha de produção) - e vetar tudo o que relativo à arrecadação dos campos já explorados atualmente. É o que esperam os ditos produtores.

Planalto opera mal desde 2009 e agora tem nova etapa

Se fizer isso, a presidente desagrada pelo menos 24 dos 27 Estados da Federação (São Paulo em geral fica em cima do muro) e milhares de municípios. Essas unidades continuam mobilizadas e já mostraram força. Desde 2009, seus representantes impõem sucessivas derrotas ao governo nesse assunto. Dilma estaria sujeita a ter seu veto derrubado, embora a prática seja raríssima no Legislativo (dois terços de cada Casa).

Desde o início da discussão sobre o marco regulatório da exploração do petróleo do pré-sal, deputados e senadores têm deixado claro que a questão dos royalties está politicamente decidida: o país não aceita mais que o petróleo extraído do mar beneficie apenas Estados cujos litorais são voltados a esses campos, principalmente Rio e Espírito Santo. Não aceitam sequer que eles sejam chamados de produtores, e sim "confrontantes".

Pelas regras atuais, fixadas em lei de 1997, Estados e municípios produtores ficam com cerca de 60% dos royalties e 50% da participação especial. À União cabem 30% dos royalties e os outros 50% da PE. Para os demais, são destinados menos de 10% dos royalties e nada da PE. Em 2010, esses recursos chegaram a R$ 22 bilhões. Rio e seus municípios ficaram com 4,3 bilhões de royalties e R$ 5,5 bilhões de PE. Com a descoberta do pré-sal, Vital calcula, em seu relatório, que em 2020 essa verba chegue a R$ 60 bilhões. Mas os não produtores não querem esperar o futuro.

O governo do Rio, com o governador Sérgio Cabral (PMDB), à frente, argumenta que o Estado vai quebrar. Perderia em 2013 cerca de R$ 4,6 bilhões. Até 2020, a perda estimada é de 77 bilhões. Cabral diz que a organização da Copa do Mundo e da Olimpíada fica ameaçada. Além disso, a dívida do Estado com a União e a previdência dos servidores são vinculadas à renda do petróleo.

Uma passeata está sendo preparada para o dia 26. O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), que calcula sua perda em cerca de R$ 1 bilhão por ano, a partir de 2013, participará do ato no Rio. Diz que, se o projeto for sancionado, vai desorganizar a economia, obras serão paralisadas e o plano de investimento terá de ser revisto. Na sexta-feira, será reativado um comitê em defesa ao Espírito Santo.

Interlocutores de Dilma afirmam que ela não tomou decisão sobre o projeto. Os sinais são lidos de acordo com os interesses dos ouvintes. Para Rio e Espírito Santo, a presidente já deixou claro, em discurso em evento para os próprios prefeitos, que não quer alterar o passado (ou seja, a distribuição do dinheiro arrecadado nos campos já licitados).

Para representantes de Estados que hoje praticamente nada recebem, como o senador Wellington Dias (PT-PI), ex-governador e autor da proposta original que resultou no projeto aprovado pelo Senado e pela Câmara, o texto não pode ser considerado inconstitucional por não alterar os termos dos contratos firmados entre União e empresas.

O projeto que aprova o Plano Nacional da Educação (PNE) - que fixa diretrizes para o setor nos próximos dez anos - saiu da Câmara destinando 50% dos royalties para a educação, como forma de se atingir a meta de 10% do Produto Interno Bruto (PIB).

O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), relator da proposta na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), quer discutir a ampliação desse percentual para 100%, atendendo à determinação da presidente, reafirmada em entrevista ao Valor desta semana. As primeiras audiências públicas, com o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, pela manhã, e várias entidades do setor, à tarde, serão realizadas no dia 29.

O PNE já causa fissuras. Roberto Requião (PMDB-PR), presidente da Comissão de Educação, Cultura e Educação (CE), diz que não caberia à CAE chamar Mercadante, pois a discussão do mérito é prerrogativa de sua comissão. O PNE, para ele, tem que ter um "planejamento operacional" para a educação e não ter como meta principal a destinação de recursos.

"Esse percentual de 10% do PIB não é impositivo. Pode até ficar. É bandeira sindical. O PT está querendo empunhar a bandeira [de mais recursos para educação]. Estão fazendo uma comissão de educação paralela", diz. Ele até concorda com a hipótese de destinar todo o royalty para educação, desde que o projeto seja factível. Quando estiver em suas mãos, novo texto pode ser feito.

O STF pode até manter o direito dos produtores. Nada que impeça o Congresso de aprovar uma emenda constitucional mudando tudo. Pelas evidências que se acumulam, esse é um dos assuntos em torno dos quais o Congresso não está dividido: está majoritariamente decidido a mudar o quadro atual. De um jeito ou de outro.

Fonte: Valor Econômico

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