Costuma-se afirmar que o poder, como a natureza, abomina o vácuo. Em tese, qualquer espaço livre que venha a se constituir no mundo político tende a ser rápida e fatalmente ocupado.
Em certa medida, o ano de 2017 parece marcar uma exceção a essa regra. É como se todos os personagens do cenário, à esquerda e à direita, tivessem passado por um processo de enfraquecimento e desorientação, contando como ganhos, no máximo, as oportunidades que tiveram para sobreviver.
Dentre os sobreviventes, foi sem dúvida Michel Temer o capaz de maior proeza. Com índices inauditos de impopularidade e às voltas com uma aterradora série de escândalos, o presidente peemedebista esgueirou-se inacreditavelmente de crise em crise.
Um voto salvador —o do ministro Gilmar Mendes— impediu que fosse cassada, pelo Tribunal Superior Eleitoral, a chapa que o levou ao Palácio do Planalto.
Um punhado de votos mais, na Câmara dos Deputados, livrou-o de ser afastado para o julgamento de sua participação no caso da propina entregue ao ex-deputado Rodrigo Rocha Loures por um emissário do grupo JBS.
Ocorre que, do lado dos que o acusavam, o ano também foi de prejuízos. Procurador-geral da República durante a maior parte de 2017, Rodrigo Janot deixou o cargo sob intenso desprestígio, que se estendeu ao próprio mecanismo, antes visto como panaceia jurídico-policial, da delação premiada.
Entre os dois polos, o Supremo Tribunal Federal se vê menos respeitado que há um ano, esfacelando-se em conflitos internos e arranjos de ocasião.
No mundo partidário, o PSDB perdeu o capital político que poderia ter como fiador de luxo do cenário pós-impeachment.
A derrocada de Aécio Neves, o malogrado espasmo das ambições presidenciais do prefeito João Doria e o vaivém do partido em questões como a reforma da Previdência foram determinantes, sem dúvida, para que os tucanos vagassem, como fantasmas, pela soturna catacumba onde se decompõem PMDB, PTB, PP e tantos outros.
Também o PT se desfaz, no ridículo, no escândalo e na pura negação da realidade, fantoche desarticulado, preso ao único e frágil fio da candidatura presidencial de um condenado em primeira instância. Tanto quanto a centro-direita, a centro-esquerda não tem alternativas sólidas a apresentar para a disputa presidencial.
Se, com exceção de algumas figuras caricatas, o mundo político parece viver em descenso generalizado, não será deslocada a avaliação de que o próprio sistema entra em considerável disfunção.
Temporária, na melhor hipótese; estrutural, talvez. O inegável é que sociedade e política se dissociam, sem reforma à vista.
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