Folha de S. Paulo
Economia, criminalidade violenta e corrupção
afetam apoio à democracia?
Os resultados das eleições na Argentina e
na Polônia levaram
analistas a decretarem a morte do chamado voto econômico. Na Argentina, Massa logrou
sair da terceira posição nas primárias para a primeira em um quadro de inflação
de 140%, e expectativas de debacle financeira. Na Polônia, o PiS foi defenestrado, a despeito do PIB per
capita ter aumentado inacreditáveis 31% nos últimos 8 anos que governou.
A relação entre economia e voto é um tópico clássico da pesquisa empírica em
ciência política. O conhecimento acumulado é que a economia é o mais importante
preditor em qualquer modelo. Mas a questão é complexa. Não se trata apenas da
economia real, mas a percebida pelos eleitores, a qual expressa viés
partidário. A avaliação da economia por eleitores do governo e da
oposição pode variar em mais de 40%. Os eleitores não conseguem distinguir o
efeito de políticas de outros fatores (choques).
Pesquisas de séries temporais cobrindo
décadas mostram que os eleitores reagem ao desempenho da economia no semestre
anterior, e não ao mandato como um todo.
A escolha eleitoral tampouco é unidimensional: outros fatores importam. A
disputa política é também uma disputa de narrativas rivais. Na Argentina, uma
entre opção autoritária e semente do caos vs status quo. A arquitetura da
escolha também importa. A proposta de mudança estava dividida, a continuidade
unificada. O peronismo perdeu, embora Massa tenha ganho.
Na disputa de narrativas, Milei e
o PiS são apontados como ameaças à democracia. Parece ter funcionado. Mas a
demanda por líderes autoritários seria produto da crise econômica? A questão é
controversa. As evidências empíricas mais robustas sugerem que, como regra
geral, o apoio normativo ao sistema democrático não é afetado pelo
comportamento da economia, mas a satisfação com a democracia —que tem uma
dimensão instrumental, de como ela está funcionando—, sim.
Claaseen e
Guimarães examinaram a questão utilizando séries temporais
cobrindo 91 democracias, de 1988 a 2018. O achado mais instigante é que há dois
outros fatores que afetam o apoio à democracia: a criminalidade violenta e a
corrupção. O desempenho dos serviços de saúde, questão central para o bem-estar
dos eleitores, não se mostrou significativo.
Que a demanda eleitoral por "populistas
autoritários" está relacionada com a criminalidade violenta e corrupção
não é novidade para os brasileiros.
*Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).
Um comentário:
▪ " Claaseen e Guimarães examinaram a questão utilizando séries temporais cobrindo 91 democracias, de 1988 a 2018. O achado mais instigante é que há dois outros fatores que afetam o apoio à democracia: a criminalidade violenta e a corrupção. O desempenho dos serviços de saúde, questão central para o bem-estar dos eleitores, não se mostrou significativo. ".
....................Marcus André Melo
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