quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Maria Clara R. M. do Prado - Uma armadilha conveniente

Valor Econômico

Sem rumo definido, o governo parece confinado às elocubrações do presidente da República e a atitudes descompensadas

Na escala que mede o nível da riqueza dos países, o Brasil está não apenas estagnado há anos, mas tende a chegar a 2100 ainda mais distante do líder mundial, os Estados Unidos. Ou seja, faça sol faça chuva, se mantiver os mesmos estímulos com vistas ao crescimento econômico adotados nas últimas décadas, a maioria dos países de renda média - em que se inclui a economia brasileira - passará muito provavelmente por processo de desaceleração nos próximos 75 anos.

O prognóstico é do Banco Mundial. A partir do modelo de crescimento no longo prazo baseado em Solow-Swan - que busca medir a expansão das economias em um largo horizonte de tempo considerando a acumulação de capital, o aumento da população e da produtividade com progresso tecnológico - a instituição avaliou 108 países atracados na armadilha da renda média (com renda per capita no intervalo extenso que vai de US$ 1.136 a US$ 13.845).

O paradigma não é novo. Foi criado pelo próprio Banco Mundial há anos. A ideia da armadilha tem a ver com uma espécie de acomodação à conquista de um nível de bem estar que permite avanços, embora insuficientes para o salto necessário à mudança de categoria de renda. Os 108 países analisados padecem de falta de investimento inovativo, de mão de obra especializada e de eficiência na redução das emissões de dióxido de carbono, um aspecto que ganha relevância ao lado de outros já “tradicionais”, como a má distribuição de renda e a extrema pobreza.

O diagnóstico mantém-se praticamente o mesmo, com o agravante de que fica cada vez mais difícil alcançar os mais ricos. Alguns fatores como o envelhecimento da população e o menor ingresso de mão de obra jovem no mercado de trabalho têm contribuído para dificultar a transposição em geral dos países de renda média para o nível mais alto. Desde 1970, diz o Banco Mundial, a renda per capita daqueles países em termos médios nunca ultrapassou um décimo da renda dos Estados Unidos. Tudo isso está no “World Development Report 2024: the Middle Income Trap” (Relatório do Desenvolvimento Mundial 2024: a Armadilha da Renda Média).

A grande novidade é a ênfase dada pelo Relatório à atuação dos chamados “incumbents” - dirigentes de empresas privadas e líderes do setor público - para a perpetuação do status quo, responsáveis que seriam por manter os países de renda média amarrados às suas armadilhas.

O documento dedica um capítulo inteiro ao que chamou de “Forces of Preservation” (Forças da Preservação). No fundo, trata-se de apontar a responsabilidade das elites pelo aprofundamento da “armadilha”. Em países do tipo da Belíndia, imaginada por Edmar Bacha, em que a parte associada à Índia abriga a grande maioria da população de baixa renda, o egoísmo e a visão de curto alcance da elite que se supõe “belga” contribuem para o retrocesso econômico.

Os exemplos são fartos. O “pacto” firmado entre as empresas e o Congresso Nacional pela manutenção da prática de desoneração da folha de pagamento é um deles. Ao abrigo do argumento de apoio aos empregos, os empresários brasileiros não querem perder os privilégios garantidos no governo Dilma Rousseff. Não importa que isso implique custos para a sociedade na forma de redução de verba pública em setores sensíveis ao desenvolvimento como a educação e a saúde.

Outro exemplo é a pressão que setores produtivos têm exercido sobre o Legislativo, com sucesso, quanto aos produtos a serem beneficiados com baixo IVA, caso dos remédios, ou até isenção, caso da carne, no bojo das discussões da reforma tributária. São medidas que atendem a interesses específicos.

Também a avidez dos parlamentares de se apoderarem cada vez mais das verbas do orçamento da União para programas e projetos em suas áreas de influência política, sem controle e sem transparência, encaixa-se na prática da absorção dos recursos públicos para benefício de caráter pessoal.

No Brasil de 2024, não há plano ou projeto, sequer há objetivos econômicos a serem perseguidos

São práticas disseminadas que minam o ideal da política de atuar pela prosperidade do país e reduzem o papel do empresariado à função de coletor de benesses do Estado. Alguém dirá que também os juros altos limitam a expansão do PIB. Sem dúvida. Da mesma forma aqui, no caso muito específico do Brasil, o raciocínio do benefício para poucos em detrimento da grande maioria deve ser considerado.

O Relatório do Banco Mundial faz menção às aspirações de alguns países de renda média, sedimentadas em planos com objetivos de médio e longo prazos. A China quer chegar a 2035 com PIB per capita de país rico. A Índia pretende tornar-se um país desenvolvido em 2047, no centenário da sua independência. O Vietnã persegue o status de alto nível de renda em 2045. O Plano Nacional de Desenvolvimento da África do Sul almeja atingir renda per capita de US$ 7 mil em 2030. Nenhum desses planos tem garantia de sucesso.

O Banco Mundial recomenda uma transição em duas etapas: primeiro, o investimento deve imitar e difundir as tecnologias modernas desenvolvidas em outros países de modo que a capacitação doméstica permita adicionar valor às tecnologias globais. Nessa etapa, os países entram na categoria de inovadores.

No Brasil de 2024, não há plano ou projeto, sequer há objetivos econômicos a serem perseguidos. Sem rumo definido, o governo parece confinado às elocubrações do presidente da República e a atitudes descompensadas, como a do Ministério das Comunicações, que apagou da foto da premiação a atleta Rebeca Andrade. Trocou-a pela imagem de um computador, como se isso denotasse algum tipo de avanço tecnológico (sic!). Não, representa apenas atraso e mediocridade.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse é o Lula e o PT sem maquiagem , vocês é que alimentaram ilusões em relação a esse partido que foi autora chamado de organização criminosa Pelo ex ministro do STF Marcos Aurélio Melo
E cada vez a imprensa caindo mais no descrédito pela sua Militância esquerdista