DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Tribunais ainda não sabem se a legislação que pune candidatos com alguma condenação será retroativa
Presidentes de diversos Tribunais Regionais Eleitorais ainda não sabem se a Ficha Limpa só vale para os candidatos após 7 de junho ou se inclui os sentenciados em segundo grau judicial antes dessa data. O próprio presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, admitiu que ainda não tem um entendimento formado.
Para Baia Borges, presidente do TRE de Minas Gerais, o ponto central da polêmica é a retroatividade da lei. “Uns vão dizer que a lei não retroage para prejudicar, e vai haver quem entenda que os que já estão condenados serão incluídos na lei. Mas isso faz parte do jogo democrático.” Lewandowski disse que a corte vai decidir sobre esse impasse provavelmente já na próxima semana.
TREs têm dúvida sobre data a partir da qual vale condenação para Ficha Limpa
Sucessão. Desembargadores que presidem tribunais em todo o País admitem que há um impasse com relação ao período abrangido pela lei e, sem conhecimento da íntegra do texto, divergem sobre a retroatividade e acreditam que a polêmica renderá muita discussão
Fausto Macedo
Um impasse sobre o período abrangido pela Lei da Ficha Limpa atormenta a magistratura. Presidentes de diversos Tribunais Regionais Eleitorais ainda não sabem se a sanção só vale para os condenados após 7 de junho ou se pega aqueles sentenciados em segundo grau judicial antes dessa data.
Ontem, eles aguardavam com ansiedade a chegada do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, ao encerramento do 49.º Encontro de Colégio de Presidentes de TREs, em São Paulo. Pretendiam tirar suas dúvidas com o ministro.
O próprio Lewandowski, contudo, admitiu que ainda não tem um entendimento formado. "Vou refletir sobre a questão do tempo verbal (do texto da lei), que precisa ser analisado, e a outra que diz respeito ao aumento do prazo de inelegibilidade daqueles que já foram condenados. Como o TSE é um colegiado, minha opinião pessoal nem importa. O resultado será aquele decidido pelo plenário."
"Há um impasse sim", reconheceu o desembargador Baia Borges, presidente do TRE de Minas. "Não vi exatamente o texto da lei, mas independentemente disso vai dar margem a muita discussão. Eu tenho dúvida se vai valer para o período anterior à publicação da lei ou se somente para depois ou se para qualquer tempo."
Borges avalia que o ponto central da polêmica é o princípio da retroatividade da lei. "Eu tenho praticamente certeza de que uns vão dizer que a lei não retroage para prejudicar, então só vai alcançar quem foi condenado a partir do dia 7 e, certamente, vai haver uma corrente que talvez entenda que os que já estão condenados serão incluídos na Lei da Ficha Limpa. Mas isso faz parte do jogo democrático."
O desembargador João José Maroja, presidente do TRE do Pará, é categórico. "Não vale para os que foram condenados antes de 7 de junho. Até porque a lei não retroage para prejudicar, só para beneficiar. A lei não vale para os sentenciados de antes. Vale a partir do dia da sanção."
A presidente do TRE do Amazonas, Graça Figueiredo, disse que "a lei mais severa não recua para prejudicar, sempre prevalece a aplicação da mais benéfica."
Nametala Jorge, presidente do TRE do Rio, alegou: "Quando a lei fala em condenados não importa o tempo do verbo. O que importa é a qualificação e o que qualifica a condição do candidato é ele ser condenado. Sendo condenado, tanto faz aquele que já era antes da lei como aquele que vier a ser condenado até requerimento do registro."
Walter de Almeida Guilherme, que preside o TRE de São Paulo, destacou: "Alguém fará essa consulta ou no próprio processo de registro o juiz é quem vai decidir." Ele não tem opinião formada. "Eu vou pensar a respeito, ainda não tenho uma convicção. Até do ponto de vista gramatical. Aparentemente, quando se fala "forem" quer dizer futuro."
Consultas. Lewandowski disse que a corte poderá decidir, na próxima semana, sobre o impasse. Ele informou que três consultas ao TSE foram feitas por parlamentares, todas nessa direção. "Essa questão é objeto de três consultas que provavelmente serão respondidas ou discutidas na semana que vem ou a partir da semana que vem. Foram distribuídas para relatores diferentes. Cada uma tem sua complexidade e cada relator tem seu ritmo em função do serviço."
O presidente do TSE anotou que na sessão de quinta-feira foi julgada apenas a consulta do senador Artur Virgílio (PSDB-AM). "A única questão era sobre o artigo 16 da Constituição, saber se essa lei vale para as eleições de 2010 ou para as próximas."
Lewandowski disse que era primordial que o TSE examinasse a consulta de Virgílio. "Era muito importante que o tribunal resolvesse a questão nessa sessão (de quinta) porque as convenções partidárias já se iniciaram."
PERGUNTAS & RESPOSTAS
Lei valerá este ano
1.
Quem a lei vai atingir?
Políticos que tenham sido condenados por decisão colegiada (no mínimo de segunda instância) por vários crimes previstos na lei, como improbidade administrativa, ou por crimes graves, como estupro e homicídio.
2.
O que mais muda?
A lei atinge também políticos que renunciarem a cargo público para escapar de cassação e aumenta para 8 anos o período de inelegibilidade.
3.
A lei entra em vigor imediatamente?
Sim. De acordo com o TSE, a lei já vale para as eleições deste ano. Entretanto, alguns juristas defendem que ela não poderia ser aplicada agora porque não respeita o princípio da anualidade, previsto no artigo 16 da Constituição, segundo o qual qualquer modificação nas regras eleitorais precisa ser aprovada um ano antes do pleito.
4.
Quem foi condenado antes da sanção do projeto, no último dia 4, poderá se candidatar este ano?
Uma alteração no texto do projeto, feita no Senado, abriu, no entendimento de alguns especialistas, brecha para discussões. A redação final diz que políticos que "forem" condenados por tribunais não poderão se candidatar. Alguns juristas acreditam que a lei valerá para todos os candidatos condenados. Outros, só para condenações após a sanção.
5.
Qual o procedimento que os TREs vão usar para negar candidatura a políticos fichas-sujas?
Os candidatos é que deverão comprovar à Justiça Eleitoral que têm ficha limpa, ou seja, não foram condenados em segunda instância por órgão colegiado pelos crimes previstos na lei. O prazo final para o registro de candidaturas é dia 5 de julho.
6.
O que o candidato pode fazer se tiver o registro negado?
Pode solicitar à Justiça o efeito suspensivo, que permitirá sua candidatura até a decisão final. Também pode recorrer ao STF para questionar a constitucionalidade da lei.
7.
Políticos condenados que já cumpriram a pena determinada podem voltar a se candidatar?
O tema é controverso, mas em princípio sim. Ao fim do cumprimento da pena, a pessoa pede a sua reabilitação, já que também estará com os direitos políticos suspensos. Obtendo-a, voltará a ter ficha limpa. Entretanto, se for condenado por improbidade, por exemplo, pode ter dificuldades para obter a cidadania eleitoral de volta.
Tribunais ainda não sabem se a legislação que pune candidatos com alguma condenação será retroativa
Presidentes de diversos Tribunais Regionais Eleitorais ainda não sabem se a Ficha Limpa só vale para os candidatos após 7 de junho ou se inclui os sentenciados em segundo grau judicial antes dessa data. O próprio presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, admitiu que ainda não tem um entendimento formado.
Para Baia Borges, presidente do TRE de Minas Gerais, o ponto central da polêmica é a retroatividade da lei. “Uns vão dizer que a lei não retroage para prejudicar, e vai haver quem entenda que os que já estão condenados serão incluídos na lei. Mas isso faz parte do jogo democrático.” Lewandowski disse que a corte vai decidir sobre esse impasse provavelmente já na próxima semana.
TREs têm dúvida sobre data a partir da qual vale condenação para Ficha Limpa
Sucessão. Desembargadores que presidem tribunais em todo o País admitem que há um impasse com relação ao período abrangido pela lei e, sem conhecimento da íntegra do texto, divergem sobre a retroatividade e acreditam que a polêmica renderá muita discussão
Fausto Macedo
Um impasse sobre o período abrangido pela Lei da Ficha Limpa atormenta a magistratura. Presidentes de diversos Tribunais Regionais Eleitorais ainda não sabem se a sanção só vale para os condenados após 7 de junho ou se pega aqueles sentenciados em segundo grau judicial antes dessa data.
Ontem, eles aguardavam com ansiedade a chegada do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, ao encerramento do 49.º Encontro de Colégio de Presidentes de TREs, em São Paulo. Pretendiam tirar suas dúvidas com o ministro.
O próprio Lewandowski, contudo, admitiu que ainda não tem um entendimento formado. "Vou refletir sobre a questão do tempo verbal (do texto da lei), que precisa ser analisado, e a outra que diz respeito ao aumento do prazo de inelegibilidade daqueles que já foram condenados. Como o TSE é um colegiado, minha opinião pessoal nem importa. O resultado será aquele decidido pelo plenário."
"Há um impasse sim", reconheceu o desembargador Baia Borges, presidente do TRE de Minas. "Não vi exatamente o texto da lei, mas independentemente disso vai dar margem a muita discussão. Eu tenho dúvida se vai valer para o período anterior à publicação da lei ou se somente para depois ou se para qualquer tempo."
Borges avalia que o ponto central da polêmica é o princípio da retroatividade da lei. "Eu tenho praticamente certeza de que uns vão dizer que a lei não retroage para prejudicar, então só vai alcançar quem foi condenado a partir do dia 7 e, certamente, vai haver uma corrente que talvez entenda que os que já estão condenados serão incluídos na Lei da Ficha Limpa. Mas isso faz parte do jogo democrático."
O desembargador João José Maroja, presidente do TRE do Pará, é categórico. "Não vale para os que foram condenados antes de 7 de junho. Até porque a lei não retroage para prejudicar, só para beneficiar. A lei não vale para os sentenciados de antes. Vale a partir do dia da sanção."
A presidente do TRE do Amazonas, Graça Figueiredo, disse que "a lei mais severa não recua para prejudicar, sempre prevalece a aplicação da mais benéfica."
Nametala Jorge, presidente do TRE do Rio, alegou: "Quando a lei fala em condenados não importa o tempo do verbo. O que importa é a qualificação e o que qualifica a condição do candidato é ele ser condenado. Sendo condenado, tanto faz aquele que já era antes da lei como aquele que vier a ser condenado até requerimento do registro."
Walter de Almeida Guilherme, que preside o TRE de São Paulo, destacou: "Alguém fará essa consulta ou no próprio processo de registro o juiz é quem vai decidir." Ele não tem opinião formada. "Eu vou pensar a respeito, ainda não tenho uma convicção. Até do ponto de vista gramatical. Aparentemente, quando se fala "forem" quer dizer futuro."
Consultas. Lewandowski disse que a corte poderá decidir, na próxima semana, sobre o impasse. Ele informou que três consultas ao TSE foram feitas por parlamentares, todas nessa direção. "Essa questão é objeto de três consultas que provavelmente serão respondidas ou discutidas na semana que vem ou a partir da semana que vem. Foram distribuídas para relatores diferentes. Cada uma tem sua complexidade e cada relator tem seu ritmo em função do serviço."
O presidente do TSE anotou que na sessão de quinta-feira foi julgada apenas a consulta do senador Artur Virgílio (PSDB-AM). "A única questão era sobre o artigo 16 da Constituição, saber se essa lei vale para as eleições de 2010 ou para as próximas."
Lewandowski disse que era primordial que o TSE examinasse a consulta de Virgílio. "Era muito importante que o tribunal resolvesse a questão nessa sessão (de quinta) porque as convenções partidárias já se iniciaram."
PERGUNTAS & RESPOSTAS
Lei valerá este ano
1.
Quem a lei vai atingir?
Políticos que tenham sido condenados por decisão colegiada (no mínimo de segunda instância) por vários crimes previstos na lei, como improbidade administrativa, ou por crimes graves, como estupro e homicídio.
2.
O que mais muda?
A lei atinge também políticos que renunciarem a cargo público para escapar de cassação e aumenta para 8 anos o período de inelegibilidade.
3.
A lei entra em vigor imediatamente?
Sim. De acordo com o TSE, a lei já vale para as eleições deste ano. Entretanto, alguns juristas defendem que ela não poderia ser aplicada agora porque não respeita o princípio da anualidade, previsto no artigo 16 da Constituição, segundo o qual qualquer modificação nas regras eleitorais precisa ser aprovada um ano antes do pleito.
4.
Quem foi condenado antes da sanção do projeto, no último dia 4, poderá se candidatar este ano?
Uma alteração no texto do projeto, feita no Senado, abriu, no entendimento de alguns especialistas, brecha para discussões. A redação final diz que políticos que "forem" condenados por tribunais não poderão se candidatar. Alguns juristas acreditam que a lei valerá para todos os candidatos condenados. Outros, só para condenações após a sanção.
5.
Qual o procedimento que os TREs vão usar para negar candidatura a políticos fichas-sujas?
Os candidatos é que deverão comprovar à Justiça Eleitoral que têm ficha limpa, ou seja, não foram condenados em segunda instância por órgão colegiado pelos crimes previstos na lei. O prazo final para o registro de candidaturas é dia 5 de julho.
6.
O que o candidato pode fazer se tiver o registro negado?
Pode solicitar à Justiça o efeito suspensivo, que permitirá sua candidatura até a decisão final. Também pode recorrer ao STF para questionar a constitucionalidade da lei.
7.
Políticos condenados que já cumpriram a pena determinada podem voltar a se candidatar?
O tema é controverso, mas em princípio sim. Ao fim do cumprimento da pena, a pessoa pede a sua reabilitação, já que também estará com os direitos políticos suspensos. Obtendo-a, voltará a ter ficha limpa. Entretanto, se for condenado por improbidade, por exemplo, pode ter dificuldades para obter a cidadania eleitoral de volta.
Um comentário:
A ficha é suja
Resisto a apoiar a tal Ficha Limpa e discretamente comemoro sua formatação definitiva, que a encaminha para o limbo jurídico. Ela proporcionaria um recrudescimento da já alarmante putrefação institucional do Judiciário.
Qualquer juiz obscuro, das menores e mais remotas comarcas, poderia destruir projetos políticos legítimos. Lideranças regionais seriam perseguidas e arruinadas. Basta contrariar os interesses do empresariado, da mídia, das boas famílias ou, afinal, dos próprios “doutores” togados, e sua vida virará um inferno.
Dêem-me cinqüenta mangos e lhes devolvo uma boa condenação por corrupção de menor, assédio moral, irregularidades trabalhistas diversas, etc. A exigência do colegiado apenas encarece o esquema; e, pior, o generaliza.
Uma reforma política de verdade suplantaria todos esses arremedos moralistas. Mas, sendo impossível aprová-la sem uma Assembléia exclusiva, os benfeitores do Congresso agradam o distinto eleitor com paliativos e indignações entorpecentes.
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