"Se ninguém se banha duas vezes nas águas do mesmo rio, como na lição do aforismo de Heráclito de Éfeso, não há por que estranhar as mudanças entre o governo de Lula e o de Dilma, por mais que esta aferre, mesmo com sinceridade, a máscara do seu antecessor, uma vez que muitas águas já rolaram, e ameaçam, sob as novas circunstâncias do mundo, rolar mais ligeiras. Estamos em mais uma crise sistêmica do capitalismo, para a qual ainda não há remédio sabido, pois a farmacopeia com que se enfrentaram os idos de 2008 parece não ter impedido a recidiva que se faz anunciar. Décadas de neoliberalismo, com suas crenças ingênuas em mecanismos autocorretores da vida econômica, de devaneios político-filosóficos de que se estava no limiar do fim da História, cedem diante de nós, jogando por terra convicções e certezas como antes, com maior estrondo, veio abaixo o Muro de Berlim.
Nestas novas águas, a navegação de Dilma não tem como reiterar a do seu antecessor, assim como está visto que sua vocação para a gestão na administração pública e seu estilo político orientado para a racionalização se têm mostrado pouco aptos a assimilar as práticas nada republicanas vigentes no nosso arremedo de presidencialismo de coalizão, mais uma banca de negócios do que uma fórmula de compor partidos afins em torno de um programa comum. Não à toa, quatro ministérios já foram espanados no seu governo, notórias, a esta altura, suas dificuldades nas relações com a assim chamada base aliada, nostálgica de Lula e de suas artes de contornar problemas difíceis sem perder amigos."
Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador. O Rio do filósofo e a Dilma. O Estado de S. Paulo,13/9/2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário