Celebrada por cientistas, recebida em silêncio pelos partidos governistas aliados e vista com desconfiança queixosa no PT, a nomeação do físico Marco Antonio Raupp para o Ministério da Ciência e Tecnologia suscita dúvida sobre seu significado.
A chamada "indicação técnica", principalmente em pasta ocupada há nove anos por critério político-partidário, não deixa de ter sido uma surpresa. Em princípio alentadora.
Não porque o técnico represente garantia de lisura e eficiência ou a opção política seja necessariamente deletéria.
Há técnicos corruptos e ineficientes como há políticos de boa conduta e capacidade de fazer o que Fernando Henrique Cardoso em seu recente livro-depoimento, A soma e o resto, define como "a arte de reunir condições para tornar possível o necessário".
A razão do alento como pressuposto é que Raupp foi escolhido por mérito específico na área.
É presidente licenciado da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC), foi diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, criou o Centro de Previsão de Assuntos Climáticos e atualmente ocupa a presidência da Agência Espacial Brasileira.
Ou seja, não irá para o Ministério da Ciência e Tecnologia para acomodar conveniências partidárias.
E qual é a dúvida que suscita sua indicação?
Discute-se se ela pode ou não ser vista como um aviso da presidente Dilma Rousseff de que daqui em diante tudo poderá começar a ser diferente no estabelecimento de parâmetros para a escolha de pessoas encarregadas de comandar a execução das políticas públicas de cada setor.
A boa notícia é que Dilma fez o gesto. Mas a constatação realista é que não se sabe se o fez para dar início a uma mudança gradual e permanente no conceito da coalizão ou se buscou apenas resolver um problema político-partidário.
Como PT e PSB disputavam a vaga, com a indicação - vá lá - de um técnico, evitou o conflito, pois a opção por atender à demanda de qualquer um dos dois criaria uma área de contrariedade séria com o preterido.
Se nenhum deles é premiado, o atrito não se impõe e o prejuízo diluído.
Por isso é cedo para dizer se há ou não significado perene na solução dada para a pasta onde havia de fato uma complicação. Por enquanto, a nomeação de Marco Antonio Raupp com todos os méritos que a comunidade científica lhe confere, não é a regra. Ainda é o ponto fora da curva.
Luz no túnel. O vice-presidente Michel Temer e o deputado Miro Teixeira iniciam uma empreitada que pode realmente criar um horizonte de reforma política à vista.
Miro apresentou projeto propondo a realização de um plebiscito na eleição de 2014 sobre sistema eleitoral e financiamento público de campanha. Temer não só apoia como defende a proposta com argumentos consistentes.
Em artigo sobre o tema escrito em novembro de 2011, ele destrincha a raiz do problema: "As dificuldades da reforma se dão porque o assunto se relaciona à maneira como cada parlamentar avalia a própria experiência no processo eleitoral segundo as leis em vigor e os interesses pessoais se sobrepõem ao aperfeiçoamento das regras eleitorais".
Portanto, "se há dificuldade de a reforma política ser executada pelos representantes do povo a solução é caminhar para a democracia direta usando os instrumentos da Constituição de 1988". Ou seja, o plebiscito.
É o tipo da ação de política alta que vai pôr a teste a sinceridade de propósitos dos defensores da reforma política e a capacidade das forças engajadas no projeto, de esclarecer ao público significados e implicações de cada tema proposto para votação.
Imprescindível não repetir a experiência do plebiscito sobre sistema de governo, em 1993. Campanha malfeita, discussão rasteira, o Parlamentarismo não teve chance alguma porque, diante do desconhecido, a população preferiu não arriscar e preferiu permanecer no Presidencialismo.
Sem saber exatamente por quê. Se for para reproduzir o modelo, o povo estará sendo chamado a referendar uma embromação e justificar a persistência no imobilismo.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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