É o terceiro ministro do STF que rechaça a tese de golpe do governo. Para o presidente da OAB, Claudio Lamachia, impeachment “é remédio da democracia’.’ O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, disse que o impeachment não é golpe e que o objetivo da LavaJato é “expurgar a corrupção que tomou conta do governo e de grandes
• O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) garante que a entidade não tem posição partidária e tomou uma decisão técnica, ao apoiar o afastamento de Dilma
“Nossa instituição defende e pratica a democracia e chegou a uma decisão quase unânime com relação a um tema (impeachment) extremamente delicado”
Eduardo Bresciani - O Globo
Como a OAB passou a apoiar o impeachment?
Esse processo de exame no âmbito da instituição foi absolutamente democrático. Em um primeiro momento, pedi que as OABs estaduais ouvissem suas bases e os conselheiros. Finalmente, no Conselho Federal, das 27 unidades da Federação, 26 votaram favoravelmente. É uma decisão democrática e que levou em consideração a posição da advocacia brasileira. Esses conselheiros foram eleitos de forma direta por praticamente um milhão de advogados. Nossa instituição defende e pratica a democracia e chegou a uma decisão quase unânime com relação a um tema extremamente delicado. Foi uma decisão absolutamente técnica. A Ordem não se movimenta de acordo com paixões partidárias ou ideológicas, mas com seu compromisso com a Constituição e as leis.
Uma comissão tinha dado parecer contrário, o que mudou?
Aquela comissão era prévia. Foi um grupo de cinco pessoas, e tomaram uma decisão por três votos a dois, numa linha de não consideração, porque se discutiam apenas as “pedaladas fiscais”. A partir de um determinado momento, entendemos por ampliar o debate e pedimos informações ao Supremo e à primeira instância sobre a Lava-Jato. Construímos então uma decisão mais ampla do que aquele parecer.
As escutas telefônicas do ex- presidente Lula foram levadas em conta?
Não foram consideradas na decisão. Tanto é que a Ordem está oficiando o juiz Sérgio Moro para que se possa tomar conhecimento dos fatos e verificar se houve interceptações de conversas entre advogados e clientes, o que é inadmissível. Se detectarmos esses fatos, vamos tomar as medidas judiciais cabíveis. Não levamos em conta como prova, mas claro que não posso dizer que desconsideramos o que ouvimos. Imagino que no sentimento de cada conselheiro ele pode até ter considerado o que ouviu, mas não foi objeto de fundamentação do voto, que levou em conta outras provas que nos deram convicção de que a nomeação do ex-presidente como ministro em um Diário Oficial extra no último momento do dia foi um fato real e grave.
A delação do senador Delcídio Amaral foi importante para a tomada de decisão?
A delação do senador é um dos elementos que trouxeram a convicção do relator no seu voto, que foi acompanhado pela quase unanimidade do Conselho Federal. Tanto a delação como outros elementos compõem um conjunto da obra, junto com outros elementos que estão no processo.
Defensores do governo comparam o impeachment a um golpe, qual sua opinião?
Acho a comparação totalmente descabida. Não vivemos nada semelhante a 1964 ou a 1954. Quando se busca questionar a própria lisura de um processo de impeachment, está se desconhecendo a Constituição. O impeachment consta na nossa Constituição como remédio jurídico da nossa democracia. É esse o caso em que estamos. Tanto não se está a falar em golpe que o próprio Supremo Tribunal Federal regulamentou o processo de impeachment. Não existe a mínima possibilidade de ter retrocesso, temos instituições consolidadas, nossa democracia é forte e saberá ultrapassar este momento.
Em 1992 a OAB liderou o processo. Agora só tomou a decisão com o impeachment em tramitação. Qual a diferença?
Na época do ex-presidente Fernando Collor de Mello, ele não tinha base política, partidária e ideológica tão firme quanto o atual governo tem hoje, e isso faz com que se tenha agora um enfrentamento e uma resistência maior. Mas entendo que a OAB ganha protagonismo por propor um exame mais abrangente que o processo que está correndo com um trabalho feito de forma técnica, célere e com a oportunidade de um debate amplo na classe e no aspecto jurídico. O partido da OAB é o Brasil, e sua ideologia, a Constituição. A Ordem não é governo, nem oposição, é do cidadão. Enquanto for presidente, quero deixar claro que partido não entra.
Além do novo pedido, vão apoiar o que está em andamento?
Vamos fazer as duas coisas. Vamos protocolar o novo processo na segunda-feira e também entregar um ofício formal da OAB com cópia da denúncia para o presidente da comissão em andamento. Caberá a ele aditar, juntar ou até desconsiderar. Nossa peça entende que as “pedaladas” são crime de responsabilidade, significa dizer que o principal argumento do que está lá em andamento, nós apoiamos.
O senhor vai entregar o novo pedido nas mãos de Eduardo Cunha?
Não vou entregar nas mãos dele. Vou entregar no protocolo, e o presidente da Câmara dará o trâmite que entender correto. Cabe à sociedade cobrar o que será feito. Também me traz desconforto ver que a denúncia por crime de responsabilidade feita pela OAB contra a presidente será despachada por um presidente da Câmara sobre quem já manifestamos a posição de que deveria ser afastado imediatamente. Entendemos que Eduardo Cunha deve sair porque sua permanência desrespeita o processo legal, uma vez que ele tem condição de interferir nos processos que correm contra si. Reitero a manifestação da OAB de que não achamos bom para a democracia que tenhamos um presidente da Câmara nas condições que está tendo a oportunidade de estar à frente de um momento como este.
O ex-presidente Lula chamou a Lava-Jato de “República de Curitiba”. Como vê a afirmação?
As manifestações divulgadas são bastantes ofensivas às instituições. Não posso aceitar que se veja de alguma forma o Poder Judiciário dessa maneira. Temos que acreditar nas nossas instituições. O que cabe ao Poder Judiciário, seja de Curitiba ou o STF, é dar respostas céleres e julgar de forma isenta esses processos e nos termos da Constituição. Há abusos na Lava-Jato? Não sou advogado especificamente desse caso e não tenho tanto conhecimento. O que estamos avaliando é a questão do respeito às prerrogativas dos advogados. Aqueles que por uma razão ou outra queiram enfraquecer o advogado amanhã ou depois podem precisar de um. É preciso registrar que, sempre que se desrespeita uma prerrogativa, está se enfraquecendo o cidadão, que são os representados. É um equívoco confundir a atuação do advogado com a do cliente. O advogado é indispensável para o estado democrático de direito e precisa ter seu papel respeitado.
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