Ao negociar um alívio de R$ 50 bilhões aos Estados devedores do Tesouro Nacional, o presidente interino Michel Temer pode ter feito um bom investimento. Em troca da ajuda, governadores aceitaram dois compromissos. Desistirão de processos para mudar os juros cobrados sobre as dívidas estaduais. Além disso, aceitarão a fixação de um teto para o aumento de gastos. O acordo tira os governos do sufoco, elimina ou pelo menos atenua um foco de inquietação política e pode facilitar o conserto das finanças públicas. Se tudo correr segundo o planejado, haverá um bom retorno, medido pelos critérios políticos e pelos objetivos das finanças públicas.
Ao propor a revisão da meta fiscal, com espaço para déficit primário de até R$ 170,5 bilhões, a nova equipe econômica embutiu nas contas o custo provável, neste ano, da negociação com os governadores. A decretação do estado de calamidade pelo governo do Rio de Janeiro poderia ter complicado as discussões. Mas os demais governadores concordaram com o auxílio diferenciado para o Rio, sem cobrar atenções especiais.
Livres do custo da dívida até o fim do ano, os Tesouros estaduais só retomarão os pagamentos a partir de janeiro, com descontos decrescentes até julho de 2018. Depois disso as prestações voltam ao nível normal. O custo para a União ficará em R$ 20 bilhões em 2016 e em R$ 15 bilhões em cada um dos dois anos seguintes. Além disso, os prazos ficarão 20 anos mais longos. Mas os juros compostos – como aqueles pagos pela União quando toma um empréstimo – serão mantidos e com isso se evitará uma aberração financeira. Os Estados autorizados pelo Supremo Tribunal Federal a pagar juros simples terão um tempo para repor a diferença devida ao Tesouro Nacional.
O acordo possibilita a volta à disciplina fiscal negociada com os governos no fim dos anos 1990, quando a União refinanciou e assumiu as dívidas estaduais e se tornou credora desses valores. O limite planejado para a expansão dos gastos federais será estendido também às despesas dos Estados. O aumento nominal dessas despesas poderá corresponder no máximo à inflação do ano anterior. Para atender a essa restrição, e também para retornar aos padrões impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, os governos terão de restabelecer critérios de austeridade perdidos nos últimos anos. Uma das façanhas da política petista foi o relaxamento das normas fiscais dos Estados, com maior espaço para endividamento e para despesas.
O efeito mais visível do afrouxamento foi a expansão dos gastos com pessoal. Segundo nota divulgada pelo Ministério da Fazenda no fim de abril, entre 2009 e 2015 esses gastos cresceram de 4,95% do Produto Interno Bruto (PIB) para 5,3%. Nesse período as despesas com a dívida chegaram a diminuir, passando de 0,95% do PIB para 0,91%.
Ainda segundo a nota, o Rio de Janeiro foi o Estado campeão no aumento da folha de pessoal, com variação média anual de 16,2%. Santa Catarina ficou em segundo lugar, com expansão de 15,67% ao ano. Em anos recentes, vários Estados passaram o limite prudencial da relação entre a folha e a receita corrente líquida.
No caso do Rio de Janeiro, a crise fiscal tornou-se escancarada neste ano, quando faltou dinheiro para salários e para a manutenção de serviços básicos, como a medicina de emergência. Histórias de pessoas desesperadas em busca de assistência tornaram-se frequentes na televisão.
A explicação oficial – redução da receita derivada da exploração do petróleo – apenas confirmou a baixa qualidade da administração. Em qualquer Estado brasileiro, o governo só deveria usar a receita proporcionada pelo petróleo como complemento, jamais como fonte de cobertura de funções essenciais. A aberração fica mais evidente quando se pensa no esforço de governos do Oriente Médio para reduzir a dependência da atividade petrolífera. Calamidade, mesmo, é a soma de incompetência com irresponsabilidade, como prova ainda mais amplamente a recessão brasileira.
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