- O Globo
No dia em que vestiu a faixa, Bolsonaro confundiu o traje de presidente com o de candidato. Em vez de abrir espaço para diálogo, dobrou a aposta na divisão
Ao discursar no Congresso, Jair Bolsonaro falou em “unir o povo”, “preservar nossa democracia” e governar “sem discriminação ou divisão”. A promessa de moderação durou pouco. Duas horas depois, ele já retomava o tom agressivo que marcou a sua escalada até o Planalto.
Com a faixa no peito, o novo presidente voltou a se pintar para a guerra. Bradou contra o fantasma do socialismo e descreveu seus rivais políticos como inimigos da pátria, da ordem e da família. Em seguida, prometeu “acabar com a ideologia que defende bandidos”, sugerindo que fará vista grossa para a violência policial.
Finalmente, insinuou que recorreria às armas para impedir que a esquerda volte a disputar o poder. “Essa é a nossa bandeira, que jamais será vermelha. Só será vermelha se for preciso o nosso sangue para mantê-la verde e amarela”, radicalizou. Faltou pouco para repetir as ameaças de “fuzilar a petralhada” e mandar os adversários para a “ponta da praia”.
Num momento que pedia distensionamento, Bolsonaro insistiu na tática da divisão. Confundiu o parlatório, onde presidentes falam à nação, com o palanque, onde candidatos atiçam seus seguidores. Adotou um tom eficiente para manter a tropa mobilizada, mas impróprio para quem terá que governar para todos os brasileiros.
O discurso bélico sugere que a promessa de costurar um “pacto nacional”, recitada no Congresso, não passou de um palavrório sem substância. Só pode falar em pacto quem está disposto a negociar. E só pode negociar quem está disposto a fazer concessões.
Neste ponto, Bolsonaro parece ter companhia. Ao boicotar a cerimônia de posse, o PT reforçou os rótulos de intransigente e mau perdedor. O partido tem motivos para não gostar do novo presidente, mas precisa reconhecer que ele chegou lá porque recebeu mais votos.
Brigar com o resultado das urnas não parece ser uma estratégia inteligente. A não ser que os petistas já tenham se conformado com a ideia de que o capitão reinará por “muito tempo”, como já previu o ex-ministro José Dirceu.
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