- Folha de S. Paulo
Presidente é o primeiro a assumir o cargo sem incluir entre suas prioridades o combate à pobreza e à iniquidade social
José Sarney não teve tempo de preparar um discurso de posse em 1985. Tancredo Neves fora internado às pressas na véspera e ficou impedido de assumir. Numa breve mensagem ao novo ministério, o vice reafirmou os compromissos do presidente eleito e prometeu governar como escravo da Constituição.
Em 1990, ao defender seu programa de modernização do Estado e da economia, Fernando Collor incluiu entre as prioridades do governo o “resgate de nossa gritante e vergonhosa dívida social” e criticou a maneira como seus antecessores haviam tratado do problema.
Collor classificou as políticas sociais do passado como paternalistas, populistas e irresponsáveis, mas descartou também a indiferença e a passividade. “Não deixarei o problema da pobreza à mercê do automatismo do mercado”, discursou.
Em 1995, Fernando Henrique Cardoso definiu a busca de “justiça social” como objetivo primordial de seu governo. Prometeu trabalhar para “diminuir as desigualdades até acabar com elas” e defendeu a solidariedade como um valor essencial da nação brasileira.
“Vamos fazer da solidariedade o fermento da nossa cidadania, em busca da igualdade”, afirmou, ao propor um “grande mutirão nacional” para “varrer do mapa” a fome e a miséria.
Luiz Inácio Lula da Silva fez o mesmo em 2003, quando convocou os brasileiros para um “grande mutirão cívico” contra a fome ao chegar ao poder. “Enquanto houver um irmão brasileiro ou uma irmã brasileira passando fome, teremos motivo de sobra para nos cobrirmos de vergonha”, disse.
Ao apontar as raízes históricas do problema, Lula ressaltou também a capacidade que o país tivera de se desenvolver apesar de “todas as crueldades e discriminações” e de “todas as desigualdades e dores que não devemos esquecer jamais”.
Em 2011, Dilma Rousseff definiu a proteção dos “mais frágeis” como “compromisso supremo” de seu mandato, fixou a erradicação da pobreza como meta e disse que os desvalidos contariam com a “ajuda do governo e de toda a sociedade”.
Nesta terça (1º), Jair Bolsonaro prometeu reerguer o Brasil e libertá-lo do socialismo e da corrupção. Após defender a construção de uma sociedade “sem discriminação ou divisão”, ele prometeu governar para todos que desejarem conquistar bons empregos “pelo mérito” e forem capazes de sustentar suas famílias sem precisar depender de favor de ninguém.
O novo presidente não dedicou nenhuma palavra aos que ficaram para trás e ignorou por completo as desigualdades que marcam a sociedade brasileira desde sempre. Ao fazer assim, rompeu um elo essencial da tradição construída pelos que o antecederam no cargo e mostrou com crueza o que pensa do país que irá governar.
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