quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Tiago Cavalcanti* - Em busca de um Brasil melhor

Valor Econômico

Dados do Banco Mundial mostram que o Brasil ocupa a décima quarta posição entre os de pior nível de desigualdade

A taxa de crescimento do produto per capita brasileiro foi basicamente zero entre 2011-2020.

Em relação à economia dos Estados Unidos, após alguns anos de maior crescimento, nosso PIB per capita caiu cerca de 7 pontos percentuais no mesmo período. Como vários países emergentes cresceram mais do que os EUA, perdemos posição relativa no mundo.

Parte importante dessa queda é explicada pela estagnação de nossa produtividade, que apresentou redução ainda mais acentuada em relação à produtividade total dos fatores (PTF) da economia americana. Sofremos uma diminuição de 12 pontos percentuais entre 2011-2020 e uma tendência praticamente negativa desde 2000, apenas com uma leve subida entre 2004-2008.

O atual cenário da economia aponta para um baixo potencial de desenvolvimento de longo prazo. Fato preocupante, dado o alto percentual de famílias na pobreza e a quantidade crescente de pessoas morando nas ruas.

Além de uma renda per capita estagnada e baixa produtividade, o Brasil é um país sobremaneira desigual.

Em um conjunto de 158 países, de acordo com dados do Banco Mundial, o Brasil ocupa a décima quarta posição de pior nível de desigualdade. A maioria daqueles com maior desigualdade que o Brasil são países africanos com baixo nível de desenvolvimento.

Níveis altos de desigualdade juntamente com falhas de mercado geram graves disparidades de oportunidades com efeitos negativos sobre a eficiência da economia e bem-estar das pessoas, levando as sociedades polarizadas com interesses antagônicos a se tornarem mais propensas a conflitos sociais e políticos.

Diante desse diagnóstico, há uma necessidade urgente da adoção de políticas econômicas que sejam capazes de criar um ambiente propício para um aumento sustentável da produtividade, combate à desigualdade e, consequentemente, com efeitos positivos sobre o desenvolvimento econômico e social do país.

Dentre as causas da nossa baixa tendência de crescimento, esteve presente o forte desequilíbrio fiscal em alguns anos, que introduziu incertezas significativas sobre a capacidade do Estado de cumprir deveres e contratos, reduzindo assim o investimento e a proteção social às pessoas necessitadas.

A nossa dívida bruta como proporção da renda subiu cerca de 35 pontos percentuais entre 2011 e 2020, sem melhorias na nossa infraestrutura pública e na nossa rede de seguridade social. Precisamos alcançar sinais positivos sustentáveis de tendência de queda do nosso endividamento.

Outro fator importante, foi a adoção de uma série de políticas malsucedidas, intervencionistas, subsidiando empresas e setores sem critérios bem definidos com base numa política de conteúdo nacional, que geraram distorções significativas na economia.

Além, claro, dos baixos níveis educacionais da população, da burocracia pesada, da proteção comercial excessiva e da tributação complexa, que só criam obstáculos e destruição de valor nas cadeias produtivas.

Na verdade, a economia, apesar de ser essencial, não é tudo. Há valores superiores em uma democracia que precisam ser respeitados. Alexis de Tocqueville, influência seminal no pensamento liberal americano, argumentou que a liberdade individual e a igualdade de condições na política são princípios básicos em uma democracia. Dentre esses princípios, está a liberdade de expressão.

É fundamental que as instituições sejam respeitadas, principalmente por aqueles que devem preservá-las. Alguns políticos atacam as instituições democráticas abertamente e acabam por considerá-las como um obstáculo à realização de seus objetivos privados e a imposição de seus valores. Defendem o autoritarismo e o não cumprimento das regras de forma explícita.

A vigilância contra essas ameaças tem que ser permanente, com o objetivo de respeitar a liberdade, as diferenças e os direitos humanos, valores fundamentais em uma sociedade democrática.

Do ponto de vista de política econômica, não deveríamos tentar reinventar a roda. Há várias experiências que deram certo. Além da responsabilidade fiscal, estabilidade de preços, o Estado deveria concentrar sua presença no que é essencial para a população, especificamente: educação, saúde, proteção ao meio ambiente, infraestrutura pública, regulação e segurança pública.

O papel do líder sempre será o de unir o país, dialogar com os diferentes setores da sociedade e aperfeiçoar a eficiência dos entes governamentais e do Estado em geral.

No Brasil, é preciso avançar e aprofundar a agenda das reformas microeconômicas, como, por exemplo, a reforma tributária, a abertura da economia e o fortalecimento das agências reguladoras, melhorando a governança (ex., critérios técnicos na nomeação de cargos e sem influência indevidas) para garantir a previsibilidade, a segurança jurídica e a concorrência em diversos setores chaves da economia.

Só assim vamos construir um Brasil justo e dinâmico, em que os cidadãos, independentemente do gênero, idade, origens étnicas, regionais e sociais, possam prosperar a partir da educação, do trabalho, do empreendedorismo, da geração de riquezas e da inovação.

*Tiago Cavalcanti é professor de Economia da Universidade de Cambridge e da FGV-SP

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