Folha de S. Paulo
Argumento de Tel Aviv para bombardeio não
encontra justificativa na Carta da ONU, que regula uso da força entre
Estados-membros
O "ataque preventivo" que Israel realizou
na madrugada desta sexta-feira (13) contra o Irã é um crime
de agressão. A ideia de bombardear um país para debelar uma ameaça presumida
não está amparada pelo único documento do mundo que diz quando uma guerra é
legal ou ilegal: a Carta da ONU.
Esse documento, elaborado e subscrito por todos os países, após a Segunda Guerra Mundial, proíbe a guerra. Ele diz que a força não deve ser usada entre Estados-membros das Nações Unidas, salvo sob duas exceções muito estritas, contidas no artigo 51. A primeira delas é quando há aprovação do Conselho de Segurança. É preciso que essa instância analise os argumentos e determine coletivamente que o uso da força é o único recurso possível para que um Estado-membro responda a uma agressão sofrida.
O Conselho de Segurança não determinou o uso
da força militar contra o Irã. Ele vem ditando, ao contrário, uma série de
medidas, ao longo dos anos, para impor sanções ao regime e restringir o acesso
de Teerã a uma porção de itens que possam levar ao desenvolvimento de um
programa nuclear com fins militares e hostis.
A segunda exceção que a Carta da ONU abre
para o uso da força é no caso de um país responder a quente, no momento, a uma
agressão sofrida. Isso se aplica, por exemplo, a uma invasão territorial —se
tropas entram no território de um país, essa nação invadida tem o direito de
repelir imediatamente, enquanto o Conselho de Segurança se reúne para ditar
outras medidas apropriadas, que podem incluir o uso da força militar.
Israel não havia sido atacado pelo Irã nesta
sexta-feira, nem na véspera. A última vez que o Irã atacou Israel foi
em outubro de 2024. Oito meses é tempo demais para evocar o argumento de
legítima defesa a uma agressão imediata.
O caminho retórico escolhido pelo
primeiro-ministro de Israel, Binyamin
Netanyahu, para justificar sua ação foi o do "ataque preventivo"
—portanto, uma ação declaradamente dirigida contra uma intenção hostil futura e
apenas presumida.
Essa é uma doutrina criada pelo presidente
americano George W. Bush após os atentados de
11 de setembro de 2001. Foi evocada para embasar uma agressão ao Iraque, sob
justificativa de impedir que o então presidente Saddam Hussein atacasse os EUA
com armas de destruição em massa. Essas armas nunca existiram, mas o Iraque foi
atacado, e Saddam Hussein foi "enforcado
preventivamente".
Da mesma maneira, uma resposta iraniana só é
legítima se concebida para repelir imediatamente uma agressão. Se, ao contrário
disso, se estende indefinidamente no tempo, passa a ser retaliação, punição,
vingança; e nada disso está previsto numa normativa que foi criada em 1945 para
evitar a todo custo que o mundo caia de novo numa guerra mundial.
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