CartaCapital
As pesquisas de opinião calibrarão o jogo das
ambiguidades e das barganhas dos partidos de centro-direita
O governo Lula empilha crises
autofabricadas. Além de alimentar o fogo da oposição, essas crises deprimem a
avaliação tanto do governo quanto de Lula. Elas mantêm em evidência um
paradoxo: o bom desempenho geral da economia é sufocado pela desastrosa
condução política.
O problema da inflação, é certo, incide sobre o mau humor dos consumidores. Mas o governo não tem uma narrativa, nem para explicá-la nem para evidenciar que ela tende a ceder nos próximos meses. Os dados do emprego, da renda, do consumo das famílias e do crescimento evaporam, seja porque o governo mostra não ter rumo e direção, seja porque se comunica mal.
Nos últimos meses, o governo conseguiu
fabricar algumas crises que empurraram as avaliações para patamares perigosos.
No fim de 2024, surgiu a crise do ajuste fiscal. Optou-se por um ajuste
insuficiente. O pacote fiscal foi anunciado juntamente com o projeto de isenção
do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais. Um desastre de
comunicação, pois os efeitos positivos das duas medidas se autoanularam. No
início do ano veio a maior das crises, a do Pix. Antes de agir, o governo
permitiu que se produzisse o máximo de dano possível. Levou uma surra da
oposição e só então fez a retirada duvidosa da medida. Entre outras crises e
trapalhadas menores, seguiram-se as crises do INSS e do IOF. Elas
derrubaram um início de recuperação da popularidade.
Nesse ambiente de incapacidades, a pesquisa
Genial Quaest do início de junho mostra uma piora do cenário
político para o Planalto e para Lula. A pesquisa mostra que o governo tem uma
avaliação negativa de 43% e positiva de 26%, enquanto 28% o consideram regular.
O levantamento mostra ainda que 57% desaprovam o trabalho de Lula e 40%
aprovam. Já 61% julgam que o Brasil está no rumo errado. Se a avalição do
governo é ruim, a de Lula não tem melhor sorte. Para 66% dos brasileiros, Lula
não deveria concorrer à reeleição. Ele tem um empate técnico com Bolsonaro, que
aparece com 65%. Parece haver um cansaço com os dois líderes, uma fadiga
de material.
Na pesquisa Quaest de março, nos cenários de
segundo turno, Lula empatava com Bolsonaro e vencia todos os outros candidatos.
Agora está em empate técnico com os governadores Tarcísio de Freitas, Ratinho
Júnior, Eduardo Leite e com Michelle Bolsonaro. É improvável que o campo da
direita tenha apenas um candidato no primeiro turno. Mas é provável que a
direita se una num segundo turno em torno de um nome. A disputa será acirrada e
com enormes dificuldades para Lula vencer, se for o candidato.
Outro aspecto evidenciado pelos números é que
a direita não está na dependência de um único líder. Ela conseguiu projetar um
número significativo de nomes que podem representá-la. Já o centro-esquerda
parece estar numa perigosa “lulodependência”. Considerando a idade de Lula e as
contingências da vida e da realidade, essa restrição de alternativas não é nada
confortável.
A avaliação negativa do governo e de Lula
aumenta as dificuldades
no Congresso. A base de apoio tende a instabilizar-se ainda mais. Os
partidos de centro-direita que compõem o governo incrementarão o jogo de
ambiguidades, pois o Palácio do Planalto não oferece perspectivas suficientes
de que chegará com força nas eleições. Esses partidos se comportarão em relação
às pautas governamentais de acordo com suas conveniências, dificultando e
aumentando os custos da governabilidade.
Os projetos e agendas que poderão ter impacto
eleitoral sofrerão uma contestação mais acirrada da oposição e um jogo de
barganhas mais duro por parte dos partidos centristas que compõem a base
governista. Com tudo isso e com um governo que persiste em erros, que não faz o
que deveria ser feito para sanear o problema fiscal, que parece sem comando e
sem rumo, a perspectiva de promover uma virada no sentido de reposicionar-se
positivamente perante a opinião pública fica cada vez mais difícil.
O tempo do governo se encurta: estamos a um
ano e quatro meses das eleições. As pesquisas de opinião calibrarão o jogo das
ambiguidades e das barganhas dos partidos de centro-direita. Quanto mais
dificuldades de recuperação o governo apresentar, menos capacidade de atração
terá. A depender da evolução desse jogo, o governo poderá ver o estoque de
aliados se exaurir e rumar a alternativas de oposição.
O presidente Lula parece alheio aos problemas das dificuldades e do tempo. Talvez acredite na capacidade de virar o jogo pela intervenção de sua sagacidade política. É uma crença perigosa, pois os tempos são outros e o presidente parece não os compreender bem. Lula protela decisões e prolonga a agonia. A falta de prudência pode cobrar um alto preço.
Publicado na edição n° 1366 de CartaCapital, em 18 de junho de 2025.
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