Folha de S. Paulo
Netanyahu age com um olho na geopolítica e
outro em vantagens eleitorais de que precisa para evitar a cadeia
Há décadas Israel fala em atacar o Irã para impedir o regime dos aiatolás de conseguir sua bomba atômica. Por que decidiu agir agora? A resposta tem algo de "Os Canhões de Agosto", obra em que Barbara Tuchman explica a 1ª Guerra Mundial como resultado de erros de cálculo cometidos por todas as partes. Eram decisões que até faziam sentido num contexto, mas que, no instante seguinte, se revelaram uma armadilha da qual era quase impossível recuar.
Durante muito tempo, Teerã, sem jamais
renunciar ao objetivo de desenvolver armas nucleares, projetava seu poder na
região através de milícias-clientes. Estamos falando do Hezbollah, no
Líbano, do Hamas,
na Faixa
de Gaza, e dos houthis,
no Iêmen.
Os ataques
terroristas do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023 implodiram
esse arranjo. A resposta de Tel Aviv foi
devastadora, uma carnificina que já cobrou a vida de mais de 50 mil palestinos
em Gaza e degradou significativamente a capacidade militar do grupo.
E o governo do premiê Binyamin
Netanyahu não se limitou ao Hamas. Israel também foi para cima do
Hezbollah, eliminando grande parte de suas lideranças. Tel Aviv e Teerã
chegaram mesmo a trocar alguns ataques diretos.
Com dois de seus três aliados seriamente
avariados, os aiatolás concluíram que sua melhor
saída seria correr com a bomba. Netanyahu viu aí um cronograma para atacar. Ou agia
agora ou teria de lidar com inimigo nuclearizado mais tarde.
Mais do que isso, o premiê israelense, que em
algum momento terá de acertar contas com a opinião pública interna pelos erros
e falhas de segurança que possibilitaram o 7 de outubro, viu também uma
oportunidade política. Se Israel fizesse eleições hoje, o partido de Netanyahu
perderia. Se tiver uma derrota do Irã para exibir na campanha, esse quadro pode
se reverter.
Para Netanyahu, permanecer no poder é questão
existencial. Fora do posto, ele voltaria a enfrentar processos judiciais que
podem pô-lo na cadeia.
É meio assustador constatar que a
estabilidade mundial dependa de cálculos assim comezinhos.
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